domingo, 20 de setembro de 2020

Um homem segundo o coração de Deus (Atos 13.17-22)


Este parágrafo de Atos 13.17-22 narra a primeira pregação de Paulo em sua viagem missionária. Com seu zelo, coragem e sabedoria, ele fala na sinagoga de Antioquia da Psídia, iniciando o discurso com uma contextualização histórica de Israel. 

Ao contar a história desde a saída do povo do Egito, alguns detalhes deixam transparecer aos ouvintes que Deus procura homens segundo o seu coração. Neste texto encontramos pelo menos três características de um homem segundo o coração de Deus.

Um homem que domina seus maus costumes (17-18)

“O Deus deste povo de Israel escolheu nossos pais e exaltou o povo durante sua peregrinação na terra do Egito, donde os tirou com braço poderoso; e suportou-lhes os maus costumes por cerca de quarenta anos no deserto”.

Hoje em dia, muitos hábitos saudáveis estão na moda: boa alimentação; atividades físicas; meditação antiestresse; boas amizades; descanso adequado; libertação dos vícios como cigarro e bebida; autoestima; bom relacionamento conjugal. Mas ainda predominam muitos maus costumes, os quais Deus, em sua misericórdia e amor, tem suportado. Como deve ser difícil para nosso Deus, que é Santo, suportar nossos maus costumes! Fofocas, invejas, contendas, ciúmes...

Paulo, inspirado por Deus, deixa transparecer um pouco do seu sentimento a este respeito em Romanos 13.11-14:

E digo isto a vós outros que conheceis o tempo: já é hora de vos despertardes do sono; porque a nossa salvação está, agora, mais perto do que quando no princípio cremos. Vai alta a noite, e vem chegando o dia. Deixemos, pois, as obras das trevas e revistamo-nos das armas da luz. Andemos dignamente, como em pleno dia, não em orgias e bebedices, não em impudicícias e dissoluções, não em contendas e ciúmes; mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e nada disponhais para a carne no tocante às suas concupiscências.

Assim como Deus libertou o povo da escravidão do Egito e lhes deu um lugar para morar, ele também nos tem guardado desde o nosso nascimento, e tem suprido todas as nossas necessidades. O mínimo que podemos fazer, então, para mostrar nossa gratidão, é controlar nossos maus costumes, e cultivar bons hábitos como ler a Bíblia e orar diariamente, ir à igreja, dividir os trabalhos domésticos; trabalhar honestamente; ajudar os colegas no trabalho e na escola;

Um homem que reconhece a fraqueza dos homens (19-21)

[...] e, havendo destruído sete nações na terra de Canaã, deu-lhes essa terra por herança, vencidos cerca de quatrocentos e cinquenta anos. Depois disto, lhes deu juízes, até o profeta Samuel. Então, eles pediram um rei, e Deus lhes deparou Saul, filho de Quis, da tribo de Benjamim, e isto pelo espaço de quarenta anos.

O povo que saiu do Egito, seguindo o grande profeta Moisés, continuou na conquista da Canaã sob a liderança do grande general Josué e, depois da morte deste, obteve muitas vitórias incitado pelos juízes, e um reposicionamento espiritual importante por meio de Samuel, que uniu toda a nação e a preparou para o reinado de Saul, o primeiro rei, que foi ungido meio a contragosto, de forma que o Senhor teve que consolar a Samuel com estas palavras: 

[...] Atende à voz do povo em tudo quanto te diz, pois não te rejeitou a ti, mas a mim, para eu não reinar sobre ele. Segundo todas as obras que fez desde o dia em que o tirei do Egito até hoje, pois a mim me deixou, e a outros deuses serviu, assim também o faz a ti.

O povo se iludia, pensando que um rei lhes seria como um “super-homem”, mas logo se decepcionaram, ao sofrerem na pele com as fraquezas espirituais e psicológicas do imponente, belo e atlético rei Saul.

A humanidade não mudou muito quanto a isto, e através da história percebemos a importância dos “super-homens” no desenvolvimento dos povos. Muitos destes homens tornaram-se idolatrados. Uma publicação da revista Mundo Estranho em 2011[1] elegeu os dez maiores revolucionários da história, conforme abaixo:

Jean-Jacques Dessalines (1758-1806) - Um escravo nascido em Guiné venceu as tropas de Napoleão e transformou o Haiti em um país independente. Dessalines envolveu-se com grupos armados na adolescência e foi aclamado como imperador do novo país em 1804. Morreu dois anos depois, com fama de ditador, tentando conter um grupo de rebeldes;

Simon Bolívar (1783-1830) - Bolívar ajudou a libertar seis países (Bolívia, Colômbia, Equador, Panamá, Venezuela e Peru). Além de liderar os exércitos locais contra a Espanha, ele também idealizou um país democrático, a Grã-Colômbia, que reunia os atuais Panamá, Venezuela, Equador e Colômbia. A nação surgiu em 1819 e rachou após sua morte;

Maximilien de Robespierre (1758-1794) - Nenhum outro movimento foi tão influente quanto a Revolução Francesa, que teve este intelectual entre seus principais líderes. Curiosamente, na própria França, o movimento durou pouco, provocou milhares de mortes na guilhotina e acabou com Napoleão assumindo o poder. Mas os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade permaneceram;

Fidel Castro (1926-2016) - Começando com apenas 82 pessoas, ele atravessou Cuba, angariou apoio e chegou ao poder. O companheiro Che Guevara tentou repetir o exemplo no Congo e na Bolívia sem sucesso;

George Washington (1732-1799) - Após a guerra pela independência, o grande líder militar dos EUA foi também o primeiro presidente da nova nação. Para garantir que o país não fosse invadido, não se desmembrasse e também não se transformasse em uma federação, ele recorreu a toda a sua habilidade política;

Guilherme de Orange (1533-1584) - Orange iniciou o movimento para vencer o exército da Espanha, um dos mais poderosos da época. Ele morreu antes de ver os Países Baixos conseguirem a independência definitiva, que só viria em 1648. A bandeira de sua família inspirou a da Holanda;

Mao Tsé-Tung (1893-1976) - O líder começou a reunir simpatizantes na China em 1927, atravessou o país na década de 1930 e apenas em 1949 levou os comunistas ao controle da nação. Ficou no poder até o fim de sua vida e foi o responsável direto pela morte de estimados 50 milhões de pessoas;

Mahatma Gandhi (1869-1948) - Com a política de não-violência, que durou 20 anos e o levou a encarar a prisão várias vezes, ele mobilizou a opinião pública internacional e criou condições políticas que permitiram que a Índia se tornasse independente;

Vladimir Lênin (1870-1924) - Aos 16 anos, quando seu irmão foi preso por tentar matar o imperador Alexandre III, ele adotou o marxismo e liderou a revolução mais influente do século 20;

Júlio César (100-44 a.C.) - Após vencer uma longa guerra civil contra o senador Pompeu, ele transformou a República Romana num império que só iria acabar oficialmente no ano 476.

O povo de Israel pediu para si um rei, porque queria ser como as outras nações, que tinham rei. Muitas igrejas também querem ser como as outras igrejas, que têm um líder forte, empolgante, que “entra e sai” para vencer as batalhas. Seus líderes atuais, que os exortam a seguir no caminho da retidão, talvez não sejam empolgantes, não têm a pompa de um rei, mas são homens que sinceramente desejam que a igreja aprenda e pratique a vontade de Deus. O Senhor Jesus, em seu ministério terreno, era assim, e acabou sendo rejeitado pelos que esperavam um messias mais revolucionário.

Existe um movimento crescente, hoje, que incentiva o indivíduo a ser o seu próprio líder; quando não, que os líderes saibam ser humildes e aproveitem o potencial dos seus liderados. Recomenda-se como sadio, até mesmo, a alternância de liderança – assim como os pássaros migrantes se revezam ao voarem em formação de “v”. Não sei se estes conceitos seriam aplicáveis também a uma igreja, mas uma coisa é certa: qualquer que seja escolhido como líder deve se reconhecer e ser reconhecido como um homem sujeito a fraquezas, dependente do Senhor.

Um homem que faz a vontade de Deus (22)

“E, tendo tirado a este, levantou-lhes o rei Davi, do qual também, dando testemunho, disse: Achei Davi, filho de Jessé, homem segundo o meu coração, que fará toda a minha vontade”.

Esta é a única passagem na Bíblia em que encontramos a afirmação de que um homem seja segundo o coração de Deus. Então, se isto é possível acontecer, seria bom dar uma revisada na história de Davi, para tentar entender o que faz um homem receber este tão honroso título. Vejamos:

  1. Descendente de Rute e Boaz, um exemplo de casal temente a Deus (Rute 4.17-22);
  2. O Espírito do Senhor se apossou dele (1Sm 16.13);
  3. Músico, dedilhava a harpa para Saul sentir-se melhor (1º Samuel 16.23);
  4. Trabalhador, fazia jornada dupla como músico do rei e pastor de ovelhas (1º Samuel 17.15);
  5. Inflamado pela causa do Senhor, quando ouviu que o gigante Golias desafiava o exército do Deus vivo (1º Samuel 17.26);
  6. Prudente (1º Samuel 18.5);
  7. Fiel, como testemunhou o sacerdote Aimeleque (1º Samuel 22.14);
  8. Humilde para aceitar o conselho de uma mulher humilde (1º Samuel 25.32-35);
  9. Justo ao determinar que os guerreiros dividissem os despojos com os que guardavam as bagagens (1º Samuel 30.21-25);
  10. Sensível, ao compor uma lamentação por Saul e Jônatas, quando recebeu a notícia de sua morte (2º Samuel 1.17,23,24);
  11. Temente a Deus ao interromper a cerimônia e o transporte quando Deus puniu Uzá com a morte, por ter tocado, inadvertidamente, na Arca da Aliança (2º Samuel 6.9);
  12. Alegre no Senhor, quando renovou suas forças para trazer a Arca, desta vez da maneira certa (2º Samuel 6.15);
  13. Crente na promessa de Deus, de que sua descendência reinaria para sempre (2º Samuel 7.26);
  14. Resignado para com a vontade do Senhor, quando foi amaldiçoado por Simei, reconhecendo que era por causa de seus próprios pecados (2º Samuel 16.11);
  15. Responsável no cumprimento dos seus deveres quando, mesmo em condições psicológicas abaladas, por causa da traição e morte de seu filho, foi ao povo e fez seu papel de líder (2º Samuel 19.7,8);
  16. Amoroso para com o povo ao qual liderava, pois, quando pecou por fazer recenseamento sem a ordem de Deus e o povo foi castigado, intercedeu pelo povo (2º Samuel 24.17);

Assim como é raro, mesmo na Bíblia, achar um homem segundo o coração de Deus, o mesmo se aplica a uma mulher virtuosa. Provérbios 31.10 questiona: “mulher virtuosa, quem a achará”? Parece que somente Boaz achou uma, conforme Rute 3.11: “Agora, pois, minha filha, não tenhas receio; tudo quanto disseste eu te farei, pois toda a cidade do meu povo sabe que és mulher virtuosa”. Uma das maiores virtudes de Rute era amar a sua sogra. Vocês, mulheres, o que acham disso?

Conclusão

Moisés liderou o povo que tinha maus costumes. Samuel liderou o povo que o rejeitou e pediu para si um rei. Sob a liderança dele, de Saul e, por último, de Davi, Israel consolidou o seu território, vencendo a última resistência: os Filisteus. O rei Davi ampliou o território, chegando ao auge territorial de Israel. Deus levantou estes líderes, todos com muitas virtudes, mas todos pecadores.

No tempo determinado, porém, Deus enviou o seu próprio Filho, Jesus, que foi morto por nós e ressuscitou, para reinar para sempre, para estar sempre presente. Ele é, de fato, o verdadeiro Homem que fez toda a vontade de Deus, o qual tem tolerado a rebeldia dos homens, desde a sua criação até aos dias de hoje. O alcance do amor de Deus se revela em passagens como a de Isaías 46.3-5:

Ouvi-me, ó casa de Jacó e todo o restante da casa de Israel; vós, a quem desde o nascimento carrego e levo nos braços desde o ventre materno. Até à vossa velhice, eu serei o mesmo e, ainda até às cãs, eu vos carregarei; já o tenho feito; levar-vos-ei, pois, carregar-vos-ei e vos salvarei. A quem me comparareis para que eu lhe seja igual? E que coisa semelhante confrontareis comigo?

Nós, como igreja e como indivíduos, precisamos reconhecer que o fato de sermos abençoados, e de termos os nossos pecados tolerados, não significa que Deus nos aprova, mas apenas que ele nos ama, e que tem sido paciente para conosco, desejando que nos esforcemos para nos tornarmos homens segundo o seu coração, dominando nossos maus costumes, reconhecendo a fraqueza dos homens, fazendo a vontade de Deus.

 


[1] CORDEIRO, Tiago. Os 10 maiores revolucionários da história. Mundo estranho, 2011. Disponível em: https://mundoestranho.abril.com.br/historia/os-10-maiores-revolucionarios-da-historia/# Acesso em 24 set. 2017.

(*) Foto do cabeçalho disponível em: https://www.espacopregador.com/2017/03/davi-um-homem-segundo-o-coracao-de-deus.html Acesso em. 21set. 2020.

(**) Citações da Bíblia extraídas de: A Bíblia Sagrada. Traduzida em Português por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada 2ªed. 1988, 1993. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2012. 1280p.

Artigo elaborado por: Arildo Louzano da Silveira. São José do Rio Preto, setembro de 2020.

 

 

sábado, 5 de setembro de 2020

Um missionário qualificado (Atos 13.14-16)

Andei fazendo muitas provas de concursos alguns anos atrás. A primeira coisa que fazia antes de me inscrever num concurso era ler o edital para ver se eu preenchia os pré-requisitos para o cargo pretendido.

Olhando para o início da primeira viagem missionária de Paulo e Barnabé, podemos notar um paralelo, numa jornada que estava apenas começando, e a maneira como eles faziam a obra que lhes fora confiada, nos serve de exemplo. Aprendemos nestes poucos versículos que, para ser um missionário, é preciso se qualificar, para não fazer a obra de Deus relaxadamente. Neste parágrafo encontramos três pré-requisitos para que um missionário seja usado por Deus em sua obra.

Primeiro pré requisito: Zelo (14)

“Mas eles, atravessando de Perge para a Antioquia da Pisídia, indo num sábado à sinagoga, assentaram-se”.

O fato de os missionários terem ido à sinagoga no sábado demonstra o seu zelo para com as coisas que se referem à sua religião. É claro que, se eles buscavam oportunidades para pregar o evangelho, não havia lugar melhor para ir do que a sinagoga, onde se reuniam todo sábado pessoas que buscavam a adoração, a comunhão e o aprendizado da Palavra de Deus. Mas não se trata somente disto, pois o hábito os levaria ao local de adoração independentemente de haver ali uma oportunidade de pregar.

Um missionário, em primeiro lugar, tem que ser zeloso, fazendo-se sempre presente na congregação, o que pode não ser tão fácil quanto parece, à primeira vista. São chuvas, sóis, intercorrências mil, que escusam a maioria dos “mortais” que costumam faltar aos cultos. Mas um missionário ou aspirante não se deixa levar pelas intempéries, e confia em seu Deus que proverá livramento, de sorte que poderá estar presente onde outros falhariam. Em situações difíceis, ele sempre se lembra de exortações como as de Hebreus 10.19-25:

Tendo, pois, irmãos, intrepidez para entrar no Santo dos Santos, pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou pelo véu, isto é, pela sua carne, e tendo grande sacerdote sobre a casa de Deus, aproximemo-nos, com sincero coração, em plena certeza de fé, tendo o coração purificado de má consciência e lavado o corpo com água pura. Guardemos firme a confissão da esperança, sem vacilar, pois quem fez a promessa é fiel. Consideremo-nos também uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras. Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia se aproxima.

Todos os cristãos deveriam ser zelosos quanto ao hábito de se congregarem, pelo menos no domingo, que tradicionalmente é o dia de descanso, conforme sinalizado nas Escrituras, em passagens como 1ª Coríntios. 16.1-2 e Atos. 20.7, e estabelecido oficialmente desde o império romano, conforme Codex Justinianus, lib. 13, it. 12, par. 2:

Que todos os juízes, e todos os habitantes da Cidade, e todos os mercadores e artífices descansem no venerável dia do Sol. Não obstante, atendam os lavradores com plena liberdade ao cultivo dos campos; visto acontecer a miúdo que nenhum outro dia é tão adequado à semeadura do grão ou ao plantio da vinha; daí o não se dever deixar passar o tempo favorável concedido pelo céu.

Conforme o catecismo da igreja católica, §2175:

O Domingo distingue-se expressamente do sábado, ao qual sucede cronologicamente, cada semana, e cuja prescrição ritual substitui, para os cristãos. Leva à plenitude, na Páscoa de Cristo, a verdade espiritual do Sábado judaico e anuncia o repouso eterno do homem em Deus. Com efeito, o culto da lei preparava o mistério de Cristo, e o que nele se praticava prefigurava, de alguma forma, algum aspecto de Cristo (1Cor 10,11).

E conforme a Confissão de Fé de Westminster, Capítulo XXI parágrafo VII

Como é lei da natureza que, em geral, uma devida proporção do tempo seja destinada ao culto de Deus, assim também em sua palavra, por um preceito positivo, moral e perpétuo, preceito que obriga a todos os homens em todos os séculos, Deus designou particularmente um dia em sete para ser um sábado (descanso) santificado por Ele; desde o princípio do mundo, até a ressurreição de Cristo, esse dia foi o último da semana; e desde a ressurreição de Cristo foi mudado para o primeiro dia da semana, dia que na Escritura é chamado Domingo, ou dia do Senhor, e que há de continuar até ao fim do mundo como o sábado cristão [Exo. 20:8-11; Gen. 2:3; I Cor. 16:1-2; At. 20:7; Apoc.1:10; Mat. 5: 17-18].

Há também igrejas que preferem se reunir principalmente aos sábados, e há outros cultos e programações ao longo da semana, às vezes seletivos, mas todos eles importantes. Um aspirante a missionário precisa ser zeloso e valorizar as reuniões dos irmãos.

Segundo pré requisito: Coragem (15)

“Depois da leitura da lei e dos profetas, os chefes da sinagoga mandaram dizer-lhes: Irmãos, se tendes alguma palavra de exortação para o povo, dizei-a”.

A pergunta feita pelos chefes da sinagoga era a deixa para eles evangelizarem a audiência. Não sei quanto a você, mas, se eu estivesse no lugar de Paulo e Barnabé, nesta hora, sentiria um frio na barriga, pois a responsabilidade era muito grande. Tornaram-se o centro das atenções, e todos deveriam estar fitando-os atentamente para ouvirem uma mensagem inteligente, empolgante, que valesse a pena o seu precioso tempo. Não podiam falhar.

O que falar, como falar, cada detalhe era importante, para que a oportunidade recebida fosse bem aproveitada. A coragem para falar vinha, em parte, pelo fato de estarem preparados de antemão, de conhecerem muito bem as escrituras, e como aplica-las a cada situação, mas vinha, sobretudo, da fé em Deus, que os enviara e que não iria, de modo algum, os abandonar, chegando, inclusive, a colocar as palavras certas em suas bocas, conforme a necessidade.

Há pessoas que são conhecidas por sua coragem, mas outras, por sua covardia. Seria possível alguém que é covarde praticar atos de bravura? Sim, Deus pode escolher e capacitar os tímidos para atos grandiosos. Exemplo disto é o Gideão, valente pelos seus feitos, mas sempre hesitante no seu coração, pelo que pedia constantemente sinais de aprovação da parte de Deus, e ficou conhecido como o inventor da famosa “prova da lã”. Lemos em Juízes 6.11-14, 27, 32, 39 e 7.10,11 que:

Então, veio o Anjo do SENHOR, e assentou-se debaixo do carvalho que está em Ofra, que pertencia a Joás, abiezrita; e Gideão, seu filho, estava malhando o trigo no lagar, para o pôr a salvo dos midianitas. Então, o Anjo do SENHOR lhe apareceu e lhe disse: O SENHOR é contigo, homem valente. Respondeu-lhe Gideão: Ai, senhor meu! Se o SENHOR é conosco, por que nos sobreveio tudo isto? E que é feito de todas as suas maravilhas que nossos pais nos contaram, dizendo: Não nos fez o SENHOR subir do Egito? Porém, agora, o SENHOR nos desamparou e nos entregou nas mãos dos midianitas. Então, se virou o SENHOR para ele e disse: Vai nessa tua força e livra Israel da mão dos midianitas; porventura, não te enviei eu? [...] Então, Gideão tomou dez homens dentre os seus servos e fez como o SENHOR lhe dissera; temendo ele, porém, a casa de seu pai e os homens daquela cidade, não o fez de dia, mas de noite. [...] Naquele dia, Gideão passou a ser chamado Jerubaal, porque foi dito: Baal contenda contra ele, pois ele derribou o seu altar. [...] Disse mais Gideão: Não se acenda contra mim a tua ira, se ainda falar só esta vez; rogo-te que mais esta vez faça eu a prova com a lã; que só a lã esteja seca, e na terra ao redor haja orvalho. [...] Se ainda temes atacar, desce tu com teu moço Pura ao arraial; e ouvirás o que dizem; depois, fortalecidas as tuas mãos, descerás contra o arraial [...].

Ser corajoso não é necessariamente ser isento do medo, mas é ir adiante, com fé, apesar do medo. Este pré-requisito é desejável naquele que aspira a ser um missionário.

Terceiro pré requisito: Sabedoria (16)

“Paulo, levantando-se e fazendo com a mão sinal de silêncio, disse: Varões israelitas e vós outros que também temeis a Deus, ouvi”.

Um missionário evangelista se destaca, frequentemente, por sua ousadia no falar. O seu zelo e a sua coragem o levam a falar, sem rodeios, a realidade da situação do homem, miserável pecador, condenado ao inferno, cuja única esperança é crer em Jesus para remissão dos pecados, evitando, assim, o juízo. E é preciso, mesmo, ser muito incisivo na pregação do evangelho, e não deixar lugar para dúvidas quanto à urgência do arrependimento e da conversão, antes que seja tarde.

Há, porém, um dilema a ser considerado. Ninguém gosta de ouvir certas verdades, e se o missionário não tiver sabedoria no falar, e habilidade para atrair, vai acabar assustando, criando resistências, e fracassando em sua missão. Como conciliar uma mensagem contundente e ao mesmo tempo atraente? É o que Paulo sabia fazer de melhor, usando a sabedoria que Deus lhe deu, e que ele cultivou, desde a sua mocidade.

Note que ele começa o seu discurso na sinagoga reconhecendo a presença de varões israelitas e dos demais que temem a Deus, ou seja, os prosélitos dentre os gentios. Paulo adaptava o seu discurso conforme os seus ouvintes, como ele diz em 1ª Coríntios 9.22: “Fiz-me fraco para com os fracos, com o fim de ganhar os fracos. Fiz-me tudo para com todos, com o fim de, por todos os modos, salvar alguns”.

O amor pelos seus ouvintes o levava a aperfeiçoar a sua sabedoria, pois, se o temor do Senhor é o princípio da sabedoria, o amor é o vínculo da perfeição, conforme Colossenses 3.12-17 12:

Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de ternos afetos de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade. Suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós; acima de tudo isto, porém, esteja o amor, que é o vínculo da perfeição. Seja a paz de Cristo o árbitro em vosso coração, à qual, também, fostes chamados em um só corpo; e sede agradecidos. Habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria, louvando a Deus, com salmos, e hinos, e cânticos espirituais, com gratidão, em vosso coração. E tudo o que fizerdes, seja em palavra, seja em ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando por ele graças a Deus Pai.

Com temor do Senhor, e amor pelas almas perdidas, que nos leva a nos dedicarmos ao aperfeiçoamento de nosso procedimento e discurso, se cultiva a sabedoria, pré-requisito daquele que aspira a ser um missionário.

Conclusão:

Se você é jovem, e aspira a ser um missionário, é uma excelente obra que almeja, e oro para que o Senhor lhe capacite com zelo, coragem e sabedoria.

Mas se você, como eu, já não é tão jovem, e pensa: “por que razão deveria me preocupar com esses pré-requisitos, visto que já sou velho, e já passou o tempo de me dedicar a missões”? Ouça meus argumentos.

Em primeiro lugar, não podemos dizer que somos velhos para iniciar um novo ciclo em nossas vidas, pois há exemplos na Bíblia de homens que iniciaram novas fases em idade muito avançada. Cito como exemplos Abraão e Moisés. Abrão se considerava velho com cerca de 85 anos de idade (Genesis 15.2; 17.24,25), mas Deus mudou a sua vida a partir dos 100 anos, com o nascimento de Isaque, e lhe deu uma sobrevida de 75 anos (Gênesis 25.7); Moisés também se considerava velho e incapaz aos 80 anos quando seu verdadeiro ministério começou, e Deus lhe deu sobrevida de mais 40 anos.

Em segundo lugar, e isto agora se aplica tanto a velhos como a jovens, para ser um missionário não é preciso viajar ao outro lado do mundo. Podemos ser missionários em nosso lar, em nossa escola, em nosso trabalho. Somos forasteiros, estamos em terra estranha, somos embaixadores de Cristo. Para finalizar, quero compartilhar com você um corinho infantil que tem tudo a ver com o tema deste artigo:

Posso ser um missionariozinho, se falar de Cristo ao companheirinho; Posso trabalhar em minha terra. Manda-me, pois, Senhor! Não preciso atravessar os mares para dar aos outros novas salutares; posso fornecer sustento aos outros que meu Senhor mandou. Hei de orar e trabalhar fielmente; caso Deus me chame seguirei contente. para os campos que vão branquejando dispõe de mim, Senhor.

DEAL, Harold; BARTELLS, Henry Dekoven. Posso Ser um Missionariozinho.

(*) Foto do cabeçalho disponível em: http://geografiageralebiblica.blogspot.com/2011/01/israel-na-epoca-do-novo-testamento.html  Acesso em. 05 set. 2020.

(**) Citações da Bíblia extraídas de: A Bíblia Sagrada. Traduzida em Português por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada 2ªed. 1988, 1993. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2012. 1280p.

Artigo elaborado por: Arildo Louzano da Silveira. São José do Rio Preto, setembro de 2020.