sábado, 19 de fevereiro de 2022

O Deus desconhecido (Atos 17.22-34)

 

Conta-se que um sábio chamado Epimênides, no ano de 600 a.C, ajudou a cidade de Atenas a se livrar de uma terrível praga. Eles tinham sacrificado a todos os deuses imagináveis para apaziguá-los, para que a praga cessasse, mas não obtiveram sucesso. Foi então que Epimênides lhes esclareceu que ainda faltava um Deus, cujo nome era desconhecido, que precisava ser honrado. Quando ofereceram o sacrifício ao Deus desconhecido, a praga cessou.

Existe um Deus que ainda é desconhecido pela maioria dos homens. Através do discurso de Paulo, podemos perceber que há pelo menos quatro razões para que isto esteja acontecendo.

Os homens pensam que Deus é uma invenção (22-26)

Então, Paulo, levantando-se no meio do Areópago, disse: Senhores atenienses! Em tudo vos vejo acentuadamente religiosos; porque, passando e observando os objetos de vosso culto, encontrei também um altar no qual está inscrito: AO DEUS DESCONHECIDO. Pois esse que adorais sem conhecer é precisamente aquele que eu vos anuncio. O Deus que fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo ele Senhor do céu e da terra, não habita em santuários feitos por mãos humanas. Nem é servido por mãos humanas, como se de alguma coisa precisasse; pois ele mesmo é quem a todos dá vida, respiração e tudo mais; de um só fez toda a raça humana para habitar sobre toda a face da terra, havendo fixado os tempos previamente estabelecidos e os limites da sua habitação;

O brasileiro inventa muitas superstições. Vejam alguns exemplos encontrados no Site Sua Pesquisa.com[1]:

- Quebrar um espelho provoca sete anos de azar na vida de quem quebrou;

- Se uma pessoa apontar uma estrela, nascerá uma verruga em seu dedo.

- Deixar um sapato ou chinelo de cabeça para baixo pode provocar a morte da mãe;

- Colocar uma vassoura de cabeça para baixo, atrás de uma porta, espanta uma visita.

- Deixar a bolsa no chão faz perder dinheiro.

- Se pular uma criança, que está sentada ou deitada no chão, a criança pulada não crescerá.

- Quem come o último pedaço de um bolo não casa.

- Abrir guarda-chuva dentro de casa dá azar.

Nos Estados Unidos, também, existem muitas pessoas supersticiosas, de acordo com um artigo publicado no site UOL[2]:

Menos de 10 por cento dos condomínios de Manhattan com 13 andares ou mais têm um andar com o número temido, disse Gabby Warshawer, diretora de pesquisa na empresa de dados e listagens CityRealty. A estimativa está baseada em 650 arranha-céus que apresentaram declarações de condomínios na cidade de Nova York desde 2003, entre eles edifícios de luxo que estão sendo erguidos agora, como a 53W53 e a 225 W. 57th Street. [...] Um porta-voz da Otis International, a fabricante de elevadores, estimou uma vez que 85 por cento dos prédios dos EUA com mais de 13 andares evitaram o número azarado. [...] Patrick Kwan, um americano de ascendência chinesa de 33 anos que mora em um novo complexo de apartamentos em Manhattan, achou engraçado que seu moderno prédio, cujos inquilinos podem pedir serviços de zelador por meio de um aplicativo de iPhone, não tenha um 13° andar. Mas ele não estava disposto a morar no quarto ou no 14°andar, já que esses números são azarados para a cultura chinesa. "Mesmo se eu não tivesse problemas com o quarto ou com o 14° andar, eu tenho certeza de que eu teria que escutar muitas coisas da minha mãe", disse

Temer a Deus não é como temer essas superstições inventadas.

Os homens gostam de inventar estátuas e chamá-las de deuses. Vejam, por exemplo, a informação da Wikipédia[3], de que

[...] em frente ao prédio do Supremo Tribunal Federal, em Brasília. Foi feita em 1961 pelo artista plástico mineiro Alfredo Ceschiatti, em um bloco monolítico de granito de Petrópolis, medindo 3,3 metros de altura e 1,48 metros de largura. A escultura representa o poder judiciário como uma mulher com os olhos vendados e espada; [...] A simbologia dessa escultura tem origem na deusa romana Justiça, que corresponde à grega Dice, filha de Zeus com Têmis, a guardiã dos juramentos dos homens.

Mas Deus não é uma invenção do homem. Pelo contrário, ele é o Criador. Quando Jó discutia teologia com seus amigos (Jó 40.15-41.9), em determinado momento, Deus interveio e mandou que eles contemplassem as suas grandes obras:

Contempla agora o hipopótamo, que eu criei contigo, que come a erva como o boi. Sua força está nos seus lombos, e o seu poder, nos músculos do seu ventre. Endurece a sua cauda como cedro; os tendões das suas coxas estão entretecidos. Os seus ossos são como tubos de bronze, o seu arcabouço, como barras de ferro. Ele é obra-prima dos feitos de Deus; quem o fez o proveu de espada. Em verdade, os montes lhe produzem pasto, onde todos os animais do campo folgam. Deita-se debaixo dos lotos, no esconderijo dos canaviais e da lama. Os lotos o cobrem com sua sombra; os salgueiros do ribeiro o cercam. Se um rio transborda, ele não se apressa; fica tranquilo ainda que o Jordão se levante até à sua boca. Acaso, pode alguém apanhá-lo quando ele está olhando? Ou lhe meter um laço pelo nariz? Podes tu, com anzol, apanhar o crocodilo ou lhe travar a língua com uma corda? Podes meter-lhe no nariz uma vara de junco? Ou furar-lhe as bochechas com um gancho? Acaso, te fará muitas súplicas? Ou te falará palavras brandas? Fará ele acordo contigo? Ou tomá-lo-ás por servo para sempre? Brincarás com ele, como se fora um passarinho? Ou tê-lo-ás preso à correia para as tuas meninas? Acaso, os teus sócios negociam com ele? Ou o repartirão entre os mercadores? Encher-lhe-ás a pele de arpões? Ou a cabeça, de farpas? Põe a mão sobre ele, lembra-te da peleja e nunca mais o intentarás. Eis que a gente se engana em sua esperança; acaso, não será o homem derribado só em vê-lo?

Contudo, mesmo que Deus tenha dado esclarecimentos tão contundentes sobre a sua pessoa, a maioria dos homens ainda pensa que ele é uma invenção. Este é um dos motivos pelos quais, para esses homens, Deus continua desconhecido.

Os homens pensam que Deus é inacessível (27,28)

[...] para buscarem a Deus se, porventura, tateando, o possam achar, bem que não está longe de cada um de nós; pois nele vivemos, e nos movemos, e existimos, como alguns dos vossos poetas têm dito: Porque dele também somos geração.

Para reconhecer a grandeza de Deus, basta o homem olhar para a complexidade do seu próprio corpo, que, segundo o médico Felipe Saba[4]:

[...] pode ser tido como a mais bem construída usina do mundo ou, então, ser comparado a uma fábrica que funciona, automaticamente, sob o comando central e preciso do cérebro. Dele sai, por assim dizer, um cabo geral a perpassar toda a estrutura corpórea: é a espinha dorsal. [...] essa espinha parece uma inimaginável rede telefônica e por ela, os nervos vão de um extremo ao outro do corpo levando ordens cerebrais e trazendo, de forma extremamente rápida, informações do que ocorre em cada parte do organismo [...] no cérebro se centralizam todas as atividades do corpo [...] também grava e imprime na memória – como se ela fosse uma biblioteca – aquilo, de bom ou ruim, que a pessoa ouve, vê, toca e experimenta. Sua estrutura consta de um total que vai de 500 milhões a 1 bilhão de células. Elas, como pequenas pilhas ou aparelhos telefônicos, assumem os comandos e ligações ocorrentes no corpo humano de uma forma tão rápida e precisa que nenhum meio de telefonia do mundo consegue se igualar. [...] Há, ainda, no homem e na mulher dois importantes aparelhos receptores do mundo externo: os olhos (“fotografantes”) e os ouvidos (sons), além de um grande laboratório de química: o paladar, o tato, o olfato… e o estômago. Este órgão é uma das melhores usinas que há, pois produz entre doze e catorze substâncias complexas de modo muito ordenado a fim de transformar os alimentos, mediante a digestão, em sustento para o organismo. Cinco milhões de pequenas células trabalham no estômago para produzir os sucos digestivos, enquanto outras quarenta milhões atuam nos intestinos e mais trezentas e cinquenta milhões no fígado. É também o sistema digestório, qual uma bem montada lareira, o responsável pelo aquecimento do corpo mantido a 37º. Toda essa caldeira é sustentada por uma forte máquina de moagem, como os dentes e a língua, que fazem as vezes de serralheria, moinho ou massadouro ao mesmo tempo. Mais: os rins são filtros, ao passo que os pulmões, os poros, a bexiga e os intestinos funcionam como órgãos de limpeza e escoamento dessa complexa máquina. E os ossos? – São o arcabouço do corpo humano e nenhum mecanismo de ponte móvel pode causar cobiça ao esqueleto da pessoa, cujos músculos são muito parecidos com correias motrizes capazes de se esticar e encolher à vontade [...].

Quando você faz, acidentalmente, um corte na pele, percebe que as células começam imediatamente a restaurar o ferimento. Quando algum microrganismo indesejado invade o sistema do seu corpo, ele imediatamente reage para se defender, e é por isso que às vezes ficamos com febre ou reações alérgicas. Isso é maravilhoso!

Às vezes, tateando, alguns acabam achando Deus. Mas a maioria nem o procura, acha que Deus é inacessível. O homem não olha para dentro de si mesmo para constatar o milagre da vida, do pulso do sangue nas veias, do ciclo constante da respiração. Deus está tão perto, tão presente! Mas a maioria nasce, vive, morre, sem nunca conhecer Deus, porque não acreditam que ele nos criou, que nos conhece, que nos mantém vivos, que mandou o seu Filho para que, como humano, pudesse se aproximar de nós, e estender-nos a mão para nos dar salvação.

Deus não é inacessível, e o seu mandamento não é inatingível, como diz Deuteronômio 30.11-14:

Porque este mandamento que, hoje, te ordeno não é demasiado difícil, nem está longe de ti. Não está nos céus, para dizeres: Quem subirá por nós aos céus, que no-lo traga e no-lo faça ouvir, para que o cumpramos? Nem está além do mar, para dizeres: Quem passará por nós além do mar que no-lo traga e no-lo faça ouvir, para que o cumpramos? Pois esta palavra está mui perto de ti, na tua boca e no teu coração, para a cumprires.

Fazendo uma aplicação dessa passagem do Antigo Testamento, Paulo diz, em Romanos 10.5-10:

Ora, Moisés escreveu que o homem que praticar a justiça decorrente da lei viverá por ela. Mas a justiça decorrente da fé assim diz: Não perguntes em teu coração: Quem subirá ao céu? isto é, para trazer do alto a Cristo; ou: Quem descerá ao abismo? isto é, para levantar Cristo dentre os mortos. Porém que se diz? A palavra está perto de ti, na tua boca e no teu coração; isto é, a palavra da fé que pregamos. Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Porque com o coração se crê para justiça e com a boca se confessa a respeito da salvação.

Mesmo que Deus seja tão acessível, ainda é desconhecido pela maioria dos homens, e esta é a segunda razão: o fato de pensarem que Deus é inacessível.

Os homens pensam que Deus é inerte (29-31)

Sendo, pois, geração de Deus, não devemos pensar que a divindade é semelhante ao ouro, à prata ou à pedra, trabalhados pela arte e imaginação do homem. Ora, não levou Deus em conta os tempos da ignorância; agora, porém, notifica aos homens que todos, em toda parte, se arrependam; porquanto estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio de um varão que destinou e acreditou diante de todos, ressuscitando-o dentre os mortos.

Os homens pensam que Deus é inerte, que é como uma estátua de ouro, de pedra, de madeira. Acham que ele não enxerga as suas injustiças. Salmos 10.4 diz que “o perverso, na sua soberba, não investiga; que não há Deus são todas as suas cogitações”.

Em Juízes 6.28-32 nós vimos que o deus Baal, a quem os israelitas estavam adorando, era inerte, não podia se defender:

Levantando-se, pois, de madrugada, os homens daquela cidade, eis que estava o altar de Baal derribado, e o poste-ídolo que estava junto dele, cortado; e o referido segundo boi fora oferecido no altar edificado. E uns aos outros diziam: Quem fez isto? E, perguntando e inquirindo, disseram: Gideão, o filho de Joás, fez esta coisa. Então, os homens daquela cidade disseram a Joás: Leva para fora o teu filho, para que morra; pois derribou o altar de Baal e cortou o poste-ídolo que estava junto dele. Porém Joás disse a todos os que se puseram contra ele: Contendereis vós por Baal? Livrá-lo-eis vós? Qualquer que por ele contender, ainda esta manhã, será morto. Se é deus, que por si mesmo contenda; pois derribaram o seu altar. Naquele dia, Gideão passou a ser chamado Jerubaal, porque foi dito: Baal contenda contra ele, pois ele derribou o seu altar.

Mas o Deus verdadeiro, a quem os homens precisam conhecer, não é inerte. Num dia designado por ele, vai julgar todos os homens.

Você já ouviu ou já falou a frase: “A justiça tarda, mas não falha”? As pessoas costumam falar assim porque têm a esperança de que as injustiças do mundo, embora pareçam que vão ficar sem punição, um dia terão o castigo que merecem. A procuradora-geral da República, Raquel Dodge[5], disse numa sessão do Conselho Superior do Ministério Público, no começo de abril de 2018, que a execução de uma sentença após quatro instâncias judiciais é “um exagero que aniquila o sistema de justiça, exatamente porque uma justiça que tarda é uma justiça que falha”.

Existem muitas frases criadas a partir desse ditado, como os exemplos dados pelo Canal Justiça[6], abaixo:

A justiça tarda, mas tarda demais;

A justiça tardia é injustiça;

A justiça dos homens não tarda e nem falha ela não acontece;

A Justiça de Deus, tarda mas não falha e, a dos homens é tardia e injusta!;

No Brasil a justiça tarda e ainda falha;

A justiça tarda e na maioria das vezes falha, justamente porque tarda demais;

A justiça de Deus não tarda, ela virá no tempo por ele determinado, sem falha. Deus não está inerte como a maioria dos homens pode pensar, mas, o fato é que esta é a terceira razão pela qual ele ainda é desconhecido pela maioria dos homens, é que eles pensam que Deus é inerte.

Os homens pensam que Deus é inconcebível (32-34)

Quando ouviram falar de ressurreição de mortos, uns escarneceram, e outros disseram: A respeito disso te ouviremos noutra ocasião. A essa altura, Paulo se retirou do meio deles. Houve, porém, alguns homens que se agregaram a ele e creram; entre eles estava Dionísio, o areopagita, uma mulher chamada Dâmaris e, com eles, outros mais.

Quando Paulo tocou no assunto ressurreição, perdeu a sua audiência. Os homens não queriam ouvir falar disso, trataram-no com desdém. Achavam inconcebível que Deus tenha ressuscitado seu Filho, Jesus, dentre os mortos. Quem sabe até pensavam que não precisamos de ressurreição, que o nosso corpo é apenas uma prisão e que, na melhor das hipóteses, o nosso espírito é que irá vagar por aí, talvez ocupando um outro corpo num outro tempo ou mundo. Comparando o pensamento dos gregos com o dos judeus, Eduardo Rueda[7] nos dá uma ideia do que eles pensavam sobre a ressurreição:

Para os gregos, espiritualidade era algo místico. Ser espiritual significava desprezar totalmente a matéria e se conectar ao “outro mundo”. Esse desprezo das coisas materiais variava entre dois extremos. Alguns, por exemplo, renunciavam completamente os prazeres físicos, tais como a alimentação e o sexo, a ponto de mutilar seus órgãos genitais. Outros, por outro lado, se entregavam a todo tipo de sensualidade e orgia. Ambos os comportamentos tinham como base a ideia de que o corpo é mau, e que, no fim das contas, o que importa mesmo é a “alma”.

Mas para a cosmovisão hebraica,o corpo foi criado por Deus, e por isso é sagrado. A Bíblia diz que “do Senhor é a Terra” (Sl 24:1). E enquanto criava o mundo, Deus viu que este “era bom” (Gn 1:10, 12, 18, 21) – e não mau, como acreditavam os gregos. Deus fez o mundo (as coisas materiais), e deu ao ser humano a responsabilidade de cuidar dele.

Para os hebreus, portanto, espiritualidade tinha que ver, sim, com esta vida. Na cosmovisão bíblica, não é preciso se isolar em um monastério, recorrer à meditação transcendental ou entrar num estado de transe para atingir “o mundo superior”. É possível ser “santo” e desenvolver a espiritualidade no dia a dia, nas situações comuns da vida e no trato diário com as pessoas (Lv 20:7; 1Pe 1:16).

Um corpo morto pode ressuscitar? No começo de 2018, em fevereiro, aconteceu um fato estranho que chamou a atenção nos noticiários. De acordo com o site R7[8],

Um bebê recém-nascido foi dado como morto por profissionais do hospital Alpha Med, em Carapicuíba, na grande São Paulo, nesta segunda-feira (12). No entanto, durante o transporte do corpo ao Instituto Médico Legal de Osasco, o motorista da funerária percebeu que a criança ainda estava viva.

O motorista Claudio Silva, 37, atendeu o chamado para retirar o corpo de uma criança. Ele conta que quando pegou o bebê no hospital para colocar na urna de transporte, o corpo estava imóvel e com coloração roxa.

Durante o caminho, nada de diferente aconteceu. Foi só quando chegou no IML que Silva percebeu que o bebê estava vivo. "Quando tirei ela da urna para pôr na mesa [do IML], percebi que a cor tinha mudado e ela estava se mexendo. Ela tinha voltado a respirar"

[...] Segundo o pai da criança, Leonardo José Ferreira Lira, 19 anos, o parto parecia ter ocorrido normalmente. “Tudo estava bem, até que a bebê mal nasceu e a médica disse que ela não tinha mais chance, estava morta [...]

“A menina ia ser chamar Manuela, mas agora depois de tudo isso é preciso adicionar Vitória ao nome. Ela ter passado por tudo isso é uma vitória”, diz a bisavó da criança.

A ressurreição de Manuela Vitória pode ter sido um milagre nunca esperado por seu pai, Leonardo, mas a ressurreição de Jesus, devido às circunstâncias de sua morte, superava todas as expectativas. Por isto ele fez questão de apresentar provas incontestáveis a Tomé, em João 20.26-29:

Passados oito dias, estavam outra vez ali reunidos os seus discípulos, e Tomé, com eles. Estando as portas trancadas, veio Jesus, pôs-se no meio e disse-lhes: Paz seja convosco! E logo disse a Tomé: Põe aqui o dedo e vê as minhas mãos; chega também a mão e põe-na no meu lado; não sejas incrédulo, mas crente. Respondeu-lhe Tomé: Senhor meu e Deus meu! Disse-lhe Jesus: Porque me viste, creste? Bem-aventurados os que não viram e creram.

Se você também crê que Jesus ressuscitou, mesmo sem nunca o ter visto, você é bem-aventurado. Mas a maioria dos homens, infelizmente, ainda pensa que isso é inconcebível. Esta é, enfim, a quarta razão pela qual Deus é desconhecido pela maioria dos homens, pensar que Deus, como se apresenta nas Escrituras, é inconcebível.

Conclusão

Conta-se[9] que, muito tempo depois de Atenas ter se livrado daquela terrível praga, que contei no início, dois anciãos andavam pelas ruas de Atenas e, ao ver o altar que tinham feito ao Deus desconhecido, se lembraram, com gratidão, do ocorrido, e tiveram o seguinte diálogo:

“Demas, você se lembra?” – “Como poderia esquecer?” respondeu Demas. “Eu era o membro jovem do conselho que ficou acordado a noite inteira para certificar-me de que o rebanho, as pedras, a argamassa e os pedreiros estariam prontos ao nascer do sol!” – “E eu”, replicou o outro ancião, “era aquele outro membro jovem e ansioso que sugeriu que fosse gravado em cada altar o nome de algum deus! Que tolice”. Ele fez uma pausa, mergulhado em seus pensamentos, acrescentando a seguir: “Demas, você talvez me considere sacrílego, mas não posso deixar de sentir que se o Deus desconhecido de Epimênides se revelasse abertamente a nós, logo deixaríamos de lado todos os outros!”. O ancião barbudo balançou o bordão com certo desprezo na direção dos ídolos surdos e mudos que, em fileira após fileira, cobriam a crista da acrópole, em número maior do que nunca antes. – “Se ele jamais vier a revelar-se” [...].

Mas, glória a Deus! Ele se revelou através das Escrituras e pessoalmente, por meio de Jesus Cristo. Ainda assim, ele é um Deus desconhecido para a maioria dos homens, porque pensam que ele é uma invenção, que ele é inacessível, que ele é inerte, que ele é inconcebível.

Conheça a Deus, que se revelou em nosso Senhor Jesus Cristo. Ele disse: “quem me vê a mim, vê o Pai” (João 14.9). João 1.18 diz: “Ninguém jamais viu a Deus; o Deus unigênito, que está no seio do Pai, é quem o revelou”. Jesus disse que estaria onde dois ou três estivessem reunidos em nome dele (Mateus 18.20). Ele está presente nas reuniões da igreja! Então, venha à igreja e faça como diz Romanos 10.9,10: “Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor e, em teu coração, creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Porque com o coração se crê para justiça e com a boca se confessa a respeito da salvação”.

 

Artigo elaborado por: Arildo Louzano da Silveira. São José do Rio Preto, fevereiro de 2022.

(*) Foto do cabeçalho disponível em: https://corujateologica.files.wordpress.com/2014/03/ao-deus-desconhecido.jpg Acesso em 19 fev. 2022.

(**) Citações da Bíblia extraídas de: A Bíblia Sagrada. Traduzida em português por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada 2ªed. 1988, 1993. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2012. 1280p

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[1] Superstição. Site Sua Pesquisa.com. Disponível em: https://www.suapesquisa.com/religiaosociais/supersticao.htm Acesso em 28 abr. 2018

[2] CLARK, Patrick. Por que os EUA continuam construindo prédios sem o 13° andar? UOL/Bloomberg, 17/02/2015. Disponível em: https://economia.uol.com.br/noticias/bloomberg/2015/02/17/por-que-os-eua-continuam-construindo-predios-sem-o-13-andar.htm?cmpid=copiaecola Acesso em 28 abr. 2018.

[3] A Justiça (escultura). Wikipédia, citando o Correio Braziliense, 22 de fevereiro de 2011, Caderno CIDADES, página 36. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/A_Justi%C3%A7a_(escultura) Acesso em 28 abr. 2018.

[4] LIMA, Vanderlei de; SABA, Felipe.  O maravilhoso corpo humano. Site Aleteia, 02/08/2017. Disponível em: https://pt.aleteia.org/2017/08/02/o-maravilhoso-corpo-humano/ Acesso em 28 abr. 2018.

[5] CURY, Teo; PUPO, Amanda; TEIXEIRA, Luiz Fernando. Justiça que tarda é uma justiça que falha, diz Raquel. Site do Estadão – Política, 03 abr. 2018. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/justica-que-tarda-e-uma-justica-que-falha-diz-raquel/ Acesso em 28 abr. 2018.

[6] A Justiça Tarda Mas Não Falha. Site Canal Justiça, 17/05/2017. Disponível em: <https://canaljustica.jor.br/justica-tarda-mas-nao-falha/>. Acesso em 28 abr. 2018.

[7] RUEDA Eduardo. O pensamento hebraico comparado ao grego. Site Criacionismo/Perguntas, 11/06/2013. Disponível em: http://www.perguntas.criacionismo.com.br/2013/06/o-pensamento-hebraico-comparado-ao-grego.html Acesso em 28 abr. 2018.

[8] ALFAYA, Ingrid. Dado como morto, bebê é salvo por motorista a caminho do IML. Site do R7, 13/02/2018 Colaboraram Karla Dunder, Stéphanie Nascimento e Rafael Custódio. Disponível em: https://noticias.r7.com/sao-paulo/dado-como-morto-bebe-e-salvo-por-motorista-a-caminho-do-iml-13022018 Acesso em 28 abr. 2018.

[9] RICHARDSON, Don. O fator Melquisedeque: o testemunho de Deus nas culturas através do mundo. Tradução de Neyd Siqueira. São Paulo: Vida Nova, 1995, p. 14,15. Baseado em uma tradição registrada como história por Diógenes Laércio, do século III A.D. no livro “As vidas de filósofos eminentes”.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022

Pobres atenienses (Atos 17.16-21)

Atenas era um dos mais importantes centros culturais do mundo antigo. Uma cidade muito rica. Ainda hoje se pode visitar em Atenas as ruínas de construções imensas e belas como o Erectheion e o Partenon e o templo do Zeus Olímpico, que tinha 104 colunas de 17 metros de altura e 2 metros de diâmetro.

Mas toda essa riqueza de Atenas não tinha nenhum valor para o apóstolo Paulo, que viu nos atenienses uma profunda pobreza espiritual. Ele ficou revoltado ao ver a situação em que os atenienses se encontravam. Seu coração não se conformava em vê-los assim.

Por isso, além de pregar na sinagoga, pregava também na praça, onde a maioria se reunia, para tentar fazê-los entender que estavam num caminho que os levaria à perdição. É possível afirmar que Paulo fez pelo menos três constatações sobre a pobre situação dos atenienses que o motivaram a pregar numa praça de Atenas.

Os atenienses se perdiam em meio à idolatria (16)

“Enquanto Paulo os esperava em Atenas, o seu espírito se revoltava em face da idolatria dominante na cidade”.

A idolatria reinava. Fazia parte do seu cotidiano, era normal. Os deuses gregos não eram muito diferentes dos homens quanto aos seus sentimentos e atos pecaminosos. Na verdade, como observa Roriz (2017)[1] em uma revista educacional,

[...] a mitologia serviu para justificar atos falhos dos homens. Donos de terra e monarcas possuíam sua própria versão das antigas lendas e as impunham às pessoas de acordo com seus interesses mesquinhos. Um homem rico poderia ser infiel à esposa, pois seguia os exemplos de Zeus. Mesmo o vício pela bebida era visto como uma virtude pelos homens que acreditavam que o álcool o aproximava dos deuses. Segundo as leis dionisíacas, o homem que alcançasse um estado de euforia por meio da bebida, poderia se transformar em um herói, o primeiro estágio para conquistar a imortalidade. Por outro lado, a embriaguez também poderia ser explicada pela mitologia. De acordo com os gregos antigos, aquele que tentasse ser imortal por meio da bebida seria amaldiçoado pelos deuses, tornando-se desequilibrado e socialmente inábil.

A idolatria tem muitas definições que até evoluem com o tempo. Nós, os evangélicos, temos sérias divergências com os católicos no que diz respeito à utilização de imagens em seu culto, o que os evangélicos consideram como idolatria, mas os católicos fazem distinção entre veneração e adoração.

Precisamos admitir, porém, que o catecismo da Igreja Católica tem em seu texto uma excelente definição de idolatria, e alerta sobre várias práticas idólatras que vão muito além da adoração de imagens. Vejamos alguns trechos de um comentário do Catecismo[2]:

§2112 O primeiro mandamento condena o politeísmo. Exige que o homem não acredite em outros deuses afora Deus, que não venere outras divindades afora a única. A escritura lembra constantemente esta rejeição de "ídolos, ouro e prata, obras das mãos dos homens", os quais "têm boca e não falam, têm olhos e não vêem..." Esses ídolos vãos tornam as pessoas vãs: [...].

§2113 A idolatria não diz respeito somente aos falsos cultos do paganismo. Ela é uma tentação constante da fé. Consiste em divinizar o que não é Deus. Existe idolatria quando o homem presta honra e veneração a uma criatura em lugar de Deus, quer se trate de deuses ou de demônios (por exemplo, o satanismo), do poder, do prazer, da raça, dos antepassados, do Estado, do dinheiro etc.[...].

§1723 [...] a verdadeira felicidade não está nas riquezas ou no bem-estar, nem na glória humana ou no poder, nem em qualquer obra humana, por mais útil que seja, como as ciências, a técnica e as artes, nem em outra criatura qualquer, mas apenas em Deus, fonte de todo bem e de todo amor.

A riqueza é o grande deus atual; a ela prestam homenagem instintiva a multidão e toda a massa dos homens. [...].

§2289 Se a moral apela para o respeito à vida corporal, não faz desta um valor absoluto, insurgindo-se contra uma concepção neopagã que tende a promover o culto do corpo, a tudo sacrificar-lhe, a idolatrar a perfeição física e o êxito esportivo. [...].

§2138 A superstição é um desvio do culto que rendemos ao verdadeiro Deus. Ela se mostra particularmente na idolatria, assim como nas diferentes formas de adivinhação e de magia.

§2097 [...] A adoração do Deus único liberta o homem de se fechar em si mesmo, da escravidão do pecado e da idolatria do mundo. [...].

§2129 "Não farás para ti imagem esculpida de nada..." O mandamento divino incluía a proibição de toda representação de Deus por mão do homem. O Deuteronômio explica: "Uma vez que nenhuma forma vistes no dia em que Senhor vos falou no Horeb, do meio do fogo, não vos pervertais, fazendo para vós uma imagem esculpida em forma d ídolo..." (Dt 4,15-16). Eis aí o Deus absolutamente transcendente que se revelou a Israel. [...].

A idolatria está ligada ao coração do homem. Ele busca uma entidade superior, transcendente, para aplacar seus medos, seus sofrimentos. Os evangélicos não estão isentos de idolatria, quando supervalorizam símbolos ou experiências sobrenaturais, na maioria das vezes sem fazer um exame cuidadoso para saber em que está fundamentada a sua fé. Você já se pegou pensando que a oração do pastor é mais forte, que a oração feita em determinado local é mais poderosa? Tomemos cuidado, porque essas coisas podem ser sintomas de idolatria.

Os atenienses estavam afundados em diversos tipos de idolatria, e precisavam se converter ao Deus Desconhecido, que Paulo mais tarde apresentou como o Deus Verdadeiro, que criou os céus e a terra, e que vai julgar todos os homens de acordo com o evangelho. Que o Senhor nos dê sabedoria, e nos livre de nos entregarmos a qualquer tipo de idolatria.

Os atenienses se perdiam em meio à filosofia (17,18)

Por isso, dissertava na sinagoga entre os judeus e os gentios piedosos; também na praça, todos os dias, entre os que se encontravam ali. E alguns dos filósofos epicureus e estóicos contendiam com ele, havendo quem perguntasse: Que quer dizer esse tagarela? E outros: Parece pregador de estranhos deuses; pois pregava a Jesus e a ressurreição.

Segundo a Wikipédia[3], Epicurismo é um sistema filosófico originado por

Epicuro de Samos, filósofo ateniense do século IV a.C., [...] Sua filosofia é de cunho materialista, não havendo espaço para a imortalidade. O filósofo acreditava que o maior bem era a procura de prazeres moderados de forma a atingir um estado de tranquilidade [...]”. E o “estoicismo foi uma escola de filosofia helenística fundada em Atenas por Zenão de Cítio no início do século III a.C [...] os estoicos apresentaram sua filosofia como um modo de vida e pensavam que a melhor indicação da filosofia de um indivíduo não era o que uma pessoa diz, mas como essa pessoa se comporta.

A filosofia busca o conhecimento da verdade, mas se ela não considerar o que diz a Palavra de Deus, pode fazer com que as pessoas se percam em seus próprios pensamentos. Numa apostila de introdução à filosofia do site Administra Brasil[4], nós lemos o seguinte:

[...] em filosofia nenhuma verdade é definitiva, nenhuma posição é a última a ter, tiranicamente, pregnância sobre as demais. Não, quando pensamos em filosofia, há um universo de problemas ainda não respondidos que atravessam os tempos [...].

Se uma determinada linha filosófica afirma que nenhuma verdade é definitiva, ela não pode ser adotada por um cristão, pois Jesus disse: “Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida” (João 14.6). Portanto existe, sim, uma verdade definitiva, e essa verdade é encarnada no próprio filho de Deus.

A história mostra que é possível ser filósofo e ao mesmo tempo cristão, como o foram, por exemplo, Agostinho e Tomás de Aquino. O cristão não deve temer o conhecimento, apenas deve entender que o conhecimento deve ter um propósito, como tudo o que ele faz na vida, e que deve ser colocado diante do altar, como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, como um culto racional.

O conhecimento somente pelo conhecimento não é produtivo, pode inclusive tornar-se nocivo. Pessoas com grande conhecimento que, porém, não adotam princípios cristãos, tendem a ser muito arrogantes. A Bíblia alerta quanto a isso, e diz para evitarmos discussões inúteis. Podemos encontrar esse tipo de advertência em pelo menos cinco lugares na Bíblia:

1ª Timóteo 1.4 nem se ocupem com fábulas e genealogias sem fim, que, antes, promovem discussões do que o serviço de Deus, na fé.

1ª Timóteo 4.7 Mas rejeita as fábulas profanas e de velhas caducas. Exercita-te, pessoalmente, na piedade.

2ª Timóteo 4.4 e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas.

Tito 1.14 e não se ocupem com fábulas judaicas, nem com mandamentos de homens desviados da verdade.

2ª Pedro 1.16 Porque não vos demos a conhecer o poder e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo seguindo fábulas engenhosamente inventadas, mas nós mesmos fomos testemunhas oculares da sua majestade.

Paulo era um homem muito culto, e estava à altura dos filósofos para poder argumentar. Pedro achava Paulo meio complicado, como podemos perceber na sua exortação de 2ª Pedro 3.15,16:

[...] e tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor, como igualmente o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada, ao falar acerca destes assuntos, como, de fato, costuma fazer em todas as suas epístolas, nas quais há certas coisas difíceis de entender, que os ignorantes e instáveis deturpam, como também deturpam as demais Escrituras, para a própria destruição deles.

Mas, se um dia Paulo foi como aqueles filósofos que amavam o conhecimento só pelo conhecimento, ele chegou um dia a uma conclusão diferente, segundo seu testemunho em Filipenses 3.7,8:

Mas o que, para mim, era lucro, isto considerei perda por causa de Cristo. Sim, deveras considero tudo como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; por amor do qual perdi todas as coisas e as considero como refugo, para ganhar a Cristo.

Falando mais ao povo convertido na cidade vizinha de Atenas (1ª Coríntios 1.20-31), Paulo relembra:

Onde está o sábio? Onde, o escriba? Onde, o inquiridor deste século? Porventura, não tornou Deus louca a sabedoria do mundo? Visto como, na sabedoria de Deus, o mundo não o conheceu por sua própria sabedoria, aprouve a Deus salvar os que creem pela loucura da pregação. Porque tanto os judeus pedem sinais, como os gregos buscam sabedoria; mas nós pregamos a Cristo crucificado, escândalo para os judeus, loucura para os gentios; mas para os que foram chamados, tanto judeus como gregos, pregamos a Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus.  Porque a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens.  Irmãos, reparai, pois, na vossa vocação; visto que não foram chamados muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de nobre nascimento; pelo contrário, Deus escolheu as coisas loucas do mundo para envergonhar os sábios e escolheu as coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes; e Deus escolheu as coisas humildes do mundo, e as desprezadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são; a fim de que ninguém se vanglorie na presença de Deus. Mas vós sois dele, em Cristo Jesus, o qual se nos tornou, da parte de Deus, sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção, para que, como está escrito: Aquele que se gloria, glorie-se no Senhor.

Mas não se deve pensar que o cristão tem que ser simplório, que deve evitar a filosofia, como se a busca do conhecimento fosse pecado, como se fosse comer do fruto proibido. Pelo contrário, a falta de uma análise profunda de nossa maneira de agir é que tem produzido grandes pecados. Em 1961, a filósofa Hannah Arendt participou do julgamento do nazista Adolf Eichmann, um burocrata que autorizava e controlava a deportação dos judeus para os campos de extermínio. Em sua fala[5], Hanna adverte que uma pessoa comum, que tem esposa e filhos, que cumpre fielmente sua rotina de trabalho com qualquer cidadão, é capaz de fazer atrocidades se não parar para pensar profundamente no que está fazendo:

[...] a atividade do pensamento é um guia constante para nossas ações e condutas. Pensar, dirá Arendt, não é simplesmente uma faculdade entre outras. Mas, pelo pensamento, somos capazes de compreender a necessidade de ponderação e constante vigilância sobre nossas atividades. Nesse sentido, a barbárie produzida pelo aparato burocrático de Hitler tem estreita vinculação a uma incapacidade de pensamento; experiência do isolamento e da fria distância do espaço comum, os homens que não pensam seriamente sobre sua realidade e sobre as potencialidades de suas ações podem mandar milhares de pessoas à morte com a mesma simplicidade que um funcionário “executa ordens”.

Será que os cristãos também podem ser assim? Sem pensar profundamente no que estão dizendo ou fazendo, será que eles podem ser instrumentos do diabo para afastar pessoas da igreja ou até mesmo da fé? Por outro lado, os cristãos também podem ser excessivamente racionais e intelectuais a ponto de perderem a sensibilidade do amor cristão. Essa falta de equilíbrio entre o saber e o não saber é um problema tão grande que todos devem estar em constante vigilância diante da advertência de Jesus em Marcos 9.42: “E quem fizer tropeçar a um destes pequeninos crentes, melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma grande pedra de moinho, e fosse lançado no mar”.

Os atenienses amavam o conhecimento, e isso não era ruim, porque as escolas de filosofia os faziam questionar a ética, a moral, e até mesmo a questão da idolatria. Mas estavam perdidos em meio à sua filosofia, e estava na hora de darem espaço para o sublime conhecimento do Deus Verdadeiro.

Os atenienses se perdiam em meio à ociosidade (19-21)

Então, tomando-o consigo, o levaram ao Areópago, dizendo: Poderemos saber que nova doutrina é essa que ensinas? Posto que nos trazes aos ouvidos coisas estranhas, queremos saber o que vem a ser isso. Pois todos os de Atenas e os estrangeiros residentes de outra coisa não cuidavam senão dizer ou ouvir as últimas novidades.

A arqueologia nos revela uma curiosidade sobre as casas dos gregos, em geral. No livro de Brandini e Lorenzetti (2017)[6] chamado “A casa fala”, as autoras nos contam que os gregos:

[...] pouco valorizavam o luxo e a ostentação. Eram incapazes de considerar essas coisas como as mais importantes. Almejavam viver de maneira interessante e satisfatória, sem passar os dias trabalhando arduamente para obter mais conforto para a família, nem tinham interesse em acumular riquezas. Desejavam mesmo ter mais tempo livre para a política, as conversas nos mercados, as atividades intelectuais e artísticas. Essa forma de viver sem dúvida influenciou na arquitetura das cidades que valorizavam muito os espaços públicos, templos, mercados, teatros, banhos públicos, ginásios, estádios. Os espaços privados, como as residências, eram menos privilegiados, contando com espaços menores e muito simples. Comparadas com as de hoje, as casas eram pequenas e sem conforto.

Embora se possa argumentar que o conforto material não é tão importante quanto o enriquecimento espiritual, a Bíblia não nos incentiva a negligenciarmos o trabalho em prol, por exemplo, da melhoria de nossas moradias. Pelo contrário, Eclesiastes 10.18 critica uma atitude de relaxamento para com a nossa casa, dizendo que “Pela muita preguiça desaba o teto, e pela frouxidão das mãos goteja a casa”. Se as casas dos gregos estavam enfraquecidas e tinham pouco conforto, eles bem que podiam dedicar mais tempo para fazê-las melhor habitáveis, pensando nas mulheres e crianças que ficavam em casa, enquanto eles só se ocupavam de dizer e ouvir as últimas novidades.

Hoje também é muito fácil passarmos o dia inteiro nas redes sociais, perdendo um tempo precioso que deveria ser dedicado à produtividade. O tédio leva as pessoas de hoje a se tornarem viciadas em internet. Se você não tiver um propósito pelo qual se dedicar, cairá mais facilmente nessas armadilhas do diabo.

Devemos procurar ser úteis. Os poucos atenienses que se converteram com a pregação de Paulo certamente mudaram de vida. É bem provável que não ficavam mais apenas cuidando de dizer ou ouvir as últimas novidades, porque a vida de um cristão tem que ser diferente, pelo fato de ele ter um propósito maior para buscar. Quando falamos do propósito maior do cristão, não queremos dizer necessariamente evangelizar ou ser um missionário. Se o cristão cumpre bem o seu papel como cidadão, se ele é trabalhador e tem uma vida respeitável, também faz isso para Cristo. É uma parte importantíssima do seu propósito maior como cristão. Veja por exemplo a instrução que Paulo dá a Timóteo a respeito da assistência social às viúvas da igreja em 1ª Timóteo 5.11-15:

Mas rejeita viúvas mais novas, porque, quando se tornam levianas contra Cristo, querem casar-se, tornando-se condenáveis por anularem o seu primeiro compromisso. Além do mais, aprendem também a viver ociosas, andando de casa em casa; e não somente ociosas, mas ainda tagarelas e intrigantes, falando o que não devem. Quero, portanto, que as viúvas mais novas se casem, criem filhos, sejam boas donas de casa e não deem ao adversário ocasião favorável de maledicência. Pois, com efeito, já algumas se desviaram, seguindo a Satanás.

E não pensem que essa instrução vale apenas para as mulheres. Em 2ª Tessalonicenses 3.10,11 Paulo ordena: “se alguém não quer trabalhar, também não coma”. Porque tinha ouvido que alguns dentre eles estavam andando “desordenadamente, não trabalhando, antes fazendo coisas vãs”. E em Colossenses 3.22-24 ele exorta:

Servos, obedecei em tudo ao vosso senhor segundo a carne, não servindo apenas sob vigilância, visando tão-somente agradar homens, mas em singeleza de coração, temendo ao Senhor. Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens, cientes de que recebereis do Senhor a recompensa da herança. A Cristo, o Senhor, é que estais servindo”.

Mas os atenienses não tinham esse conhecimento, estavam perdidos em meio à ociosidade, e caminhavam para a morte eterna, sem Cristo.

Conclusão

Atenas era uma cidade muito rica, e tinha um valioso patrimônio cultural, mas ainda assim era pobre no sentido espiritual, porque ignorava o conhecimento de Cristo. Paulo fez pelo menos três constatações sobre a pobre situação dos atenienses que o motivaram a pregar numa praça de Atenas.

Primeira constatação: Os atenienses se perdiam em meio à idolatria

Segunda constatação: Os atenienses se perdiam em meio à filosofia

Terceira constatação: Os atenienses se perdiam em meio à ociosidade

Tomemos cuidado para não seguirmos o exemplo dos pobres atenienses. Fujamos da idolatria, sejamos equilibrados quanto à nossa filosofia, como diz 2ª Coríntios 10.5: “[...] levando cativo todo pensamento à obediência de Cristo”, e não fiquemos ociosos, mas sejamos “sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que, no Senhor, o vosso trabalho não é vão” (1ª Coríntios 15.58).

Artigo elaborado por: Arildo Louzano da Silveira. São José do Rio Preto, fevereiro de 2022.

(*) Foto do cabeçalho disponível em: Acesso em https://www.infoescola.com/historia/grecia-antiga/exercicios/ Acesso em 11 fev. 2022.

(**) Citações da Bíblia extraídas de: A Bíblia Sagrada. Traduzida em português por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada 2ªed. 1988, 1993. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2012. 1280p

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[1] RORIZ, João Pedro. A mitologia grega no dia a dia das crianças. Site Educação Infantil, 30/01/2017. Disponível em: http://revistaeducacaoinfantil.com.br/a-mitologia-grega-no-dia-a-dia-das-criancas/ Acesso em 22 abr. 2018.

[2] Catecismo da igreja Católica – Índice analítico – 1.5 Idolatria/Ídolo. Disponível em: http://catecismo-az.tripod.com/conteudo/a-z/h/idolatria.html Acesso em 23 abr. 2018.

 [3] Disponível em: e em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Estoicismo Acesso em 23 abr. 2018.

[4] Introdução à filosofia. Administra Brasil Cursos. P.29. Disponível  em: https://administrabrasil.com.br/wp-content/uploads/2018/01/Introduc%CC%A7a%CC%83o-a%CC%80-Filosofia.pdf Acesso em 23 abr. 2018.

[5] Introdução à filosofia. Administra Brasil Cursos. P.33. Disponível em: https://administrabrasil.com.br/wp-content/uploads/2018/01/Introduc%CC%A7a%CC%83o-a%CC%80-Filosofia.pdf Acesso em 23 abr. 2018.

 [6] BRANDINI, Maria do Carmo; LORENZETTI, Yara. A casa fala: Uma relação de vida e amor. São Paulo: Scortecci, 2017.