domingo, 8 de abril de 2018

Respeito e dignidade (Atos 5.34-42)


Os apóstolos estavam prestes a serem mortos pelos judeus, que não viam outro meio de fazê-los parar de anunciar a Cristo ressuscitado como o Messias prometido. Mas Deus, surpeendentemente, suscitou-lhes um defensor dentre os seus próprios inimigos, um respeitado mestre da lei, chamado Gamaliel. Este deu conselho aos seus pares para que refletissem, deixando os apóstolos seguirem para ver no que ia dar.


Será que Gamaliel convenceu-se de que tinham matado Jesus injustamente, e quis conter os judeus para que não cometessem o mesmo erro novamente? Afinal, eram honrados anciãos da nação de Israel, e tinham que agir de acordo com a sua dignidade. O discurso de Gamaliel e a narrativa deste episódio nos faz pensar em pelo menos três caminhos que as pessoas seguem para adquirir respeito e dignidade.


Um dos caminhos escolhidos pelas pessoas é a instrução. Os versículos 34  e 35 dizem que um fariseu chamado Gamaliel, mestre da lei, acatado por todo o povo, levantou-se no Sinédrio, “mandou retirar os homens, por um pouco, e lhes disse: Israelitas, atentai bem no que ides fazer a estes homens”.


Gamaliel, ao que parece, foi um homem bem decidido. Escolheu um caminho e o perseguiu com excelência. Chegou a um ponto em que era considerado digno de muita honra, tendo se tornado um mestre da lei. O povo todo o reconhecia e o acatava. Com certeza não foi fácil para Gamaliel conquistar essa posição. Para ser um doutor é preciso “ralar” muito. Quem atinge esse grau, como Gamaliel atingiu, merece ser chamado de doutor.


Há um grande perigo, porém, quando conquistamos títulos, porque temos a tendência de valorizar um título mais do que o bom senso exige. Um bom doutor precisa ter humildade como parte de suas virtudes. Esta questão é bastante explorada na cultura popular. Veja, por exemplo, um trecho da música chamada “A Enxada e a Caneta” (Teddy Vieira - Capitão Barduíno):


[...] A enxada respondeu: De fato, eu vivo no chão, pra poder dar o que comer e vestir o seu patrão. Eu vim no mundo primeiro, quase no tempo de Adão. Se não fosse o meu sustento, ninguém tinha instrução. Vai-te, caneta orgulhosa, vergonha da geração. A tua alta nobreza não passa de pretensão. Você diz que escreve tudo, tem uma coisa que não. É a palavra bonita que se chama educação


MARIGLIANI, Pedro Astenori, AZEVEDO, Teddy Vieira. A enxada e a caneta. Disponível em http://www.beakauffmann.com/mpb_a/a-enxada-e-a-caneta.html Acesso em 08 abr. 2018.


Outro caminho que, infelizmente, é muito usado para se adquirir respeito e dignidade é a usurpação. Gamaliel continua falando nos versículos 36 a 39 que, antes daqueles dias,


[...] se levantou Teudas, insinuando ser ele alguma coisa, ao qual se agregaram cerca de quatrocentos homens; mas ele foi morto, e todos quantos lhe prestavam obediência se dispersaram e deram em nada. Depois desse, levantou-se Judas, o galileu, nos dias do recenseamento, e levou muitos consigo; também este pereceu, e todos quantos lhe obedeciam foram dispersos. Agora, vos digo: dai de mão a estes homens, deixai-os; porque, se este conselho ou esta obra vem de homens, perecerá; mas, se é de Deus, não podereis destruí-los, para que não sejais, porventura, achados lutando contra Deus. E concordaram com ele.


Gamaliel mencionou, nessa fala, duas personagens históricas, as quais se encaixam bem na categoria de usurpadores. Eles não eram o que diziam ser, mas tinham muito poder de persuasão e atraíram multidões atrás de si. Uma dessas personagens era um homem chamado Teudas, do qual lemos, na Wikipédia, que:


Seu nome, se for composto em grego, pode significar "presente de Deus", apesar de outros estudiosos acreditarem que sua etimologia seja semítica e poderia significar "flui com a água". Provavelmente, atuou como um pregador messiânico (muito recorrente na Judeia do século I) que se propunha a liderar massas judaicas, para fins de renovação religiosa e social. Proclamando-se um profeta mandado por Deus para socorrer o povo judeu que sofria sob o "status quo" vigente  (inclusive a dominação romana), ele recorreu à tradição do herói nacional, Moisés, assegurando ser capaz de "abrir as águas" do rio Jordão.


Disponível em  https://pt.wikipedia.org/wiki/Teudas Acesso em 08 abr. 2018>. Acesso em 08 abr. 2018.


Existe, entretanto, um terceiro caminho, o qual foi escolhido pelos discípulos, para adquirir respeito e dignidade, que foi o caminho da resignação. Lemos nos versículos 40 a 42 que,


Chamando os apóstolos, açoitaram-nos e, ordenando-lhes que não falassem em o nome de Jesus, os soltaram. E eles se retiraram do Sinédrio regozijando-se por terem sido considerados dignos de sofrer afrontas por esse Nome. E todos os dias, no templo e de casa em casa, não cessavam de ensinar e de pregar Jesus, o Cristo.


Os discípulos foram açoitados por falar no nome de Jesus, mas não ficaram revoltados, antes eles se regozijaram por terem sido considerados dignos de sofrer afrontas por esse Nome. Resignaram-se à vontade de Deus, que é boa, agradável e perfeita. Se eles tinham que sofrer, sofreriam com alegria, porque assim poderiam retribuir um pouco do que Jesus fez pela salvação de homens pecadores.


A resignação dá dignidade porque mostra a nossa fé em Deus. Mesmo que o mundo não reconheça, seremos reconhecidos no céu. Segundo Hebreus 11.38, o mundo é que não é digno daqueles que crêem a ponto de se resignarem ao sofrimento, sabendo que, se ele nos afligir, é porque isto faz parte dos planos de Deus para nossas vidas.


Leiamos o texto (Hb 11.36-38):


[...] outros, por sua vez, passaram pela prova de escárnios e açoites, sim, até de algemas e prisões. Foram apedrejados, provados, serrados pelo meio, mortos a fio de espada; andaram peregrinos, vestidos de peles de ovelhas e de cabras, necessitados, afligidos, maltratados (homens dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, pelos montes, pelas covas, pelos antros da terra.


Paulo dá voz aos sentimentos dos apóstolos, que se resignaram diante de tantas aflições, para poderem cumprir sua nobre missão de evangelizar a todos quantos fosse possível. Em Primeira Coríntios 4.9-13 ele diz:


Porque a mim me parece que Deus nos pôs a nós, os apóstolos, em último lugar, como se fôssemos condenados à morte; porque nos tornamos espetáculo ao mundo, tanto a anjos, como a homens. Nós somos loucos por causa de Cristo, e vós, sábios em Cristo; nós, fracos, e vós, fortes; vós, nobres, e nós, desprezíveis. Até à presente hora, sofremos fome, e sede, e nudez; e somos esbofeteados, e não temos morada certa, e nos afadigamos, trabalhando com as nossas próprias mãos. Quando somos injuriados, bendizemos; quando perseguidos, suportamos; quando caluniados, procuramos conciliação; até agora, temos chegado a ser considerados lixo do mundo, escória de todos.


Paulo reivindica algumas vezes sua dignidade, adquirida em meio à sua resignação para com a vontade de Deus. Uma passagem em que ele faz isso de forma notável é Gálatas 6.12,14 e 17, quando desabafa:


Todos os que querem ostentar-se na carne, esses vos constrangem a vos circuncidardes, somente para não serem perseguidos por causa da cruz de Cristo. [...] Mas longe esteja de mim gloriar-me, senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim, e eu, para o mundo. [...] Quanto ao mais, ninguém me moleste; porque eu trago no corpo as marcas de Jesus. 


Concluindo, eu digo que podemos conquistar respeito e dignidade, dependendo de nossas escolhas. A instrução acadêmica é um meio legítimo, desde que não seja vista como uma finalidade em si, mas apenas um meio de servir melhor no Reino de Deus. Alguns vão por caminhos tortuosos, gabando-se de coisas que supostamente realizaram, usurpando posições que não merecem, tornando-se, não raro, extremamente populares e conquistando multidões de seguidores iludidos. Mas a melhor e mais nobre maneira de se conquistar dignidade é se resignando à vontade de Deus, ainda que isto represente muito sofrimento, e que o mundo não entenda e não nos considere dignos de respeito, porque, o que mais importa é o reconhecimento do Deus eterno.


Já aconteceu, alguma vez, de você passar por algum sofrimento injustamente? Quando isso acontecer, entregue essa situação como oferta diante do trono de Deus, e considere-se digno por ter a oportunidade de sofrer afrontas em nome de Cristo.


Foto do cabeçalho disponível em https://www.igrejaacores.pt/responsavel-diocesano-pela-pastoral-da-saude-defende-conforto-e-respeito-pela-dignidade-humana-no-fim-da-vida/  Acesso em 08 abr. 2018.

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