Quando andar pelas ruas e encontrar um gari fazendo o seu serviço de varrição, cuidado para não se enganar. Você pode estar diante de um doutor. Numa reportagem da Folha Online de 2009 lemos o seguinte:
Com inscrições abertas desde o dia 7, o concurso público para a seleção de 1.400 garis para a cidade do Rio já atraiu 45 candidatos com doutorado, 22 com mestrado, 1.026 com nível superior completo e 3.180 com superior incompleto, segundo a Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana).
Concurso para garis atrai 22 mestres e 45 doutores. Folha de São Paulo/Cotidiano (online), 22/10/2009. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2210200915.htm Acesso em 06 maio 2018.
Parece que Estevão também estava na mesma situação desses doutores garis, porque era um dos sete diáconos escolhidos para serem servidores das mesas na igreja de Jerusalém, e certamente foi muito fiel nesta simples tarefa, mas não se limitou a isso, pois o Espírito Santo também o habilitou para fazer grandes coisas, inclusive sinais e prodígios diante do povo. Além disso, com grande sabedoria era capaz de debater e confundir doutores para convencê-los das verdades do evangelho de Jesus Cristo.
Aqueles que se dedicam a servir a Deus de todo o coração podem ser notados pelas virtudes que o Espírito Santo lhes confere. As pessoas que conviveram com Estevão podiam notar que ele trazia pelo menos três virtudes que comprovavam sua dedicação para servir a Deus.
Umas das virtudes que notamos na vida de Estevão é a Graça, conforme o versículo 8, que diz: “Estevão, cheio de graça e poder, fazia prodígios e grandes sinais entre o povo”.
Estevão era o que poderíamos chamar de um homem engraçado. Mas não é que ele fazia os outros rirem o tempo todo, e sim que era um homem que tinha graça, um homem que os outros queriam por perto, porque sempre trazia bênçãos às pessoas ao seu redor. Ele fazia milagres em nome de Cristo. A graça, como já vimos em outro parágrafo, é um dos frutos coletivos do Espírito Santo. É natural para o cristão ajudar a todos com prontidão e alegria, e isto promove uma boa fama do cristão para com a comunidade.
Talvez você, como eu, não tenha recebido o dom de Deus para fazer milagres, igual Estevão, mas pode ser que Deus lhe tenha dado, como também a mim, outros dons. Os tradutores da Bíblia “Almeida Revista e Atualizada” nos dão uma dica, ao traduzir a palavra grega Charis, em Atos 2.47, como “simpatia”. Veja como ficou o versículo: “[...] louvando a Deus e contando com a simpatia [Charis] de todo o povo. Enquanto isso, acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos”.
A graça é um grande instrumento de evangelização. Tradicional e eficaz. Quanto mais a Igreja for graciosa, mais chances haverá de que almas sejam incorporadas no reino de Deus. Num livreto chamado Evangelismo e Comunhão Cristã, de John Walker, lemos o seguinte:
Conta-se a história de um cristão zeloso que se aproximou de um rabino judeu e lhe perguntou: “Senhor Rabino, quando é que os judeus se tornarão cristãos?”. O rabino lhe respondeu: “Os judeus serão cristãos quando os cristãos se tornarem cristãos!”.Seja qual for a intenção do rabino ao dar esta resposta maravilhosa, a verdade é que os cristãos serão evangelistas quando os cristãos forem cristãos! O evangelismo acontecerá como Deus intentou quando os cristãos se relacionarem corretamente a Cristo e uns aos outros.
WALKER,John. Evangelismo E Comunhão Cristã. Disponível em: http://www.ruach.com.br/livretos/evangelismo.e.comunhao.crista.pdf Acesso em17 set. 2016.
Estevão tinha os dons de curar e fazer milagres, e os utilizava com os critérios da virtude da graça.
Outra virtude evidente na vida de Estevão é a Sabedoria, conforme os versículos 9 e 10: “Levantaram-se, porém, alguns dos que eram da sinagoga chamada dos Libertos, dos cireneus, dos alexandrinos e dos da Cilícia e Ásia, e discutiam com Estevão; e não podiam resistir à sabedoria e ao Espírito, pelo qual ele falava”.
A virtude da sabedoria é também um dom do Espírito Santo. Deus não precisa, mas gosta de usar a cultura e o conhecimento adquiridos ao longo da vida por pessoas como Estevão, para que seu nome seja glorificado.
Estevão podia ser Paulo. Quero dizer, se ele não tivesse sido apedrejado até a morte, poderia ter sido um apóstolo zeloso e produtivo como foi Paulo. Tenho a impressão de que Estevão podia ter sido escolhido para ser o grande apóstolo, mas Paulo (por cumplicidade) o apedrejou, e por isso Deus o condenou a ficar no lugar dele, a tomar o seu encargo.
Mattew Henry comenta que os adversários de Estevão eram judeus helenistas da dispersão,
[...] que parecem ter sido mais zelosos da religião do que os judeus nativos; foi com dificuldade que eles mantiveram a prática e a profissão de fé no país onde viviam [...], e isso fez com que se tornassem mais ativos para o judaísmo. [...] Alguns pensam que estes Libertos eram judeus que tinham obtido a cidadania romana, como Paulo (Atos 22.27-28); e é provável que ele fosse o líder desta sinagoga dos Libertos que disputavam com Estevão, e engajado com outros na disputa, pois ele estava presente no apedrejamento de Estevão, e consentia na sua morte. [...] Eles não foram capazes de resistir à sabedoria e ao Espírito com que falava [...]. Estava cumprindo-se a promessa: “porque eu vos darei boca e sabedoria a que não poderão resistir, nem contradizer todos quantos se vos opuserem” (Lucas 21.15).
Mattew Henry’s Commentary on the Whole Bible. Domínio Público (tradução livre).
A virtude da sabedoria é dom do Espírito Santo, mas não devemos esperar que ela “caia do céu”. É nosso dever adquiri-la, conforme Provérbios 4.7: “O princípio da sabedoria é: Adquire a sabedoria; sim, com tudo o que possuis, adquire o entendimento”. E Deus vai nos dar então o que nos falta, vai nos dotar com habilidade de utilizar a sabedoria que adquirimos. É como acontece com os bancos de investimento, que costumam ter como regra não financiar 100% de nenhum empreendimento. Assim também é com aquele que pede a Deus sabedoria: precisa investir seus recursos próprios, estudando diligentemente a Palavra de Deus. Estevão tinha adquirido sabedoria, e Deus lhe deu a virtude de bem utilizá-la.
Uma terceira virtude que notamos em Estevão é a Serenidade. Nos versículos 11 a 15 nós lemos que os opositores subornaram homens para o acusarem falsamente, sublevaram o povo e as autoridades, que o arrebataram, levando-o ao Sinédrio. Em meio à enxurrada de acusações falsas, “todos os que estavam assentados no Sinédrio, fitando os olhos em Estevão, viram o seu rosto como se fosse rosto de anjo".
Parece que tudo aquilo não abalava a sua fé. Seu rosto foi notado, pelos juízes, como se fosse rosto de anjo. Ele tinha serenidade, porque confiava no Senhor, e seu estado de espírito transparecia em seu rosto. Voltando ao comentário de Mathew Henry, ele diz que
O Espírito de Deus enchia o coração de Estevão quando este foi trazido perante o conselho, e fez com que fosse visível sua presença com ele [...]. É usual que os juízes observem o rosto do prisioneiro, porque às vezes seu semblante é uma indicação de culpa ou de inocência. O rosto de Estevão era um rosto como de um anjo.
1. Talvez a expressão signifique não mais do que um semblante extraordinariamente agradável, uma fisionomia alegre, e não havia nele o menor sinal de medo ou de raiva de seus perseguidores [...]. Tal serenidade imperturbável, uma coragem tão destemida, e uma mistura tão inexplicável de brandura e majestade, que havia em seu rosto, era como ver um rosto de anjo; [...].
2. Pode também ter havido um esplendor milagroso, um brilho em seu semblante, como o de nosso Salvador, quando ele foi transfigurado, ou, pelo menos, como o rosto de Moisés quando ele desceu de sua audiência com Deus [...].
Mattew Henry’s Commentary on the Whole Bible. Domínio Público (tradução livre).
O rosto de uma pessoa pode dizer muito sobre sua personalidade ou sobre o seu estado de espírito. O rosto de Caim demonstrou sua inconformidade para com a vontade de Deus, em Gênesis 4.3-6:
Aconteceu que no fim de uns tempos trouxe Caim do fruto da terra uma oferta ao SENHOR. Abel, por sua vez, trouxe das primícias do seu rebanho e da gordura deste. Agradou-se o SENHOR de Abel e de sua oferta; ao passo que de Caim e de sua oferta não se agradou. Irou-se, pois, sobremaneira, Caim, e descaiu-lhe o semblante Então, lhe disse o SENHOR: Por que andas irado, e por que descaiu o teu semblante?
Jacó notou no rosto de seu sogro, Labão, que ele não estava muito contente com a sua presença, e viu que havia perigo em permanecer com ele, em Gênesis 31.2. Ana, mãe de Samuel, quando creu que o Senhor lhe atenderia a oração, não ficou mais com o semblante triste (1Samuel 1.18). Provérbios 15.13 diz que “O coração alegre aformoseia o rosto, mas com a tristeza do coração o espírito se abate”.
Eu gostaria de poder ser como Estevão, quando me acusam falsamente. Se não conseguir ficar passivo, e se descair o meu semblante, é porque não estou no Espírito, e preciso buscar mais do Senhor. Às vezes, porém, necessitamos nos entristecer por causa de nosso próprio pecado, porque a “a tristeza segundo Deus” (2Coríntios 7.10) pode fazer descair o nosso semblante, mas fará bem ao nosso coração, conforme Eclesiastes 7.3: “Melhor é a mágoa do que o riso, porque com a tristeza do rosto se faz melhor o coração”.
Estevão tinha o rosto como de um anjo, em uma situação que haveria muitos motivos para que tivesse o semblante descaído.
Assim, um serviçal, cuja atribuição era servir às mesas, por sua dedicação e fé, revelou possuir virtudes, as quais lhe foram dadas pelo Espírito Santo. Virtudes como a Graça, a Sabedoria e a Serenidade. Há muitos dons que Deus tem concedido à Igreja para usarmos com o critério da graça. Sejamos graciosos e utilizemos esses dons para o bem dos outros e para a glória de Deus. Possamos nós também adquirir sabedoria, conhecimento de Deus, através da Bíblia, utilizando toda a diligência que pudermos. Não percamos tempo com o que é passageiro, vamos investir no que é eterno. Estevão tinha um semblante de anjo, mesmo estando em situação nada agradável, sendo acusado injustamente, julgado por um sinédrio furioso. Como tem sido o nosso semblante diante das dificuldades da vida cotidiana? Às vezes precisamos nos esforçar para abrir um sorriso, mas esse esforço vale a pena, porque temos o alvo de glorificar a Deus e ganhar pessoas para Cristo.
Imagem no cabeçalho disponínel em: http://www.infocristiana.it/galleria-the-last-supper-the-passion-of-the-christ-jpg-jpg.html Acesso em: 12 maio 2018.
Este e outros artigos deste Blog fazem parte do livro "A
Igreja em Expansão (Atos 6-14)", disponível em um dos links abaixo:
https://amzn.to/3mNu7vL
(Livro impresso)
https://amzn.to/3sJCOej
(e-book)
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Gostou do serviço? Não!!!? Poste seu comentário, queremos melhorar.