Nossa vida pode se transformar quando uma porta se abre. Pode ser a porta de um emprego, de um curso superior, de uma amizade...
Paulo, Barnabé, e toda a igreja se regozijaram porque o Senhor havia aberto a porta da fé aos gentios. Alegraram-se mais ainda porque Deus fez isso através deles, dando-lhes as chaves.
Podemos dizer que foram três as chaves usadas pelos apóstolos para abrirem a porta da fé aos gentios.
Chave da coragem (19-21)
Sobrevieram, porém, judeus de Antioquia e Icônio e, instigando as multidões e apedrejando a Paulo, arrastaram-no para fora da cidade, dando-o por morto. Rodeando-o, porém, os discípulos, levantou-se e entrou na cidade. No dia seguinte, partiu, com Barnabé, para Derbe. E, tendo anunciado o evangelho naquela cidade e feito muitos discípulos, voltaram para Listra, e Icônio, e Antioquia, [...]
Barnabé presenciou, impotente e atônito, seu companheiro de ministério ser apedrejado por uma multidão enfurecida, até que, dando-o por morto, o arrastaram para fora da cidade. Não sabemos se foi um erro de avaliação por parte dos executores, ou se Paulo, de fato, morreu, tendo ressuscitado quando os discípulos o rodearam. Há teorias que afirmam ser este o momento em que ele foi ao “terceiro céu” e “ouviu palavras inefáveis, as quais não é lícito ao homem referir” (2ª Coríntios 12.2,4).
Como é que Paulo e Barnabé tinham tanta coragem, a ponto de tornarem a entrar nas cidades onde sofreram tamanha violência? É verdade que, quanto mais próximos de Deus, tanto mais corajosos os homens costumam ser. Não é só uma questão de ter presenciado eventos milagrosos, porque nós somos muito rápidos em esquecê-los. Somos parecidos com os discípulos, que assistiram uns dos maiores milagres da história, como os narrados em Marcos 6. 44-52:
Os que comeram dos pães eram cinco mil homens. Logo a seguir, compeliu Jesus os seus discípulos a embarcar e passar adiante para o outro lado, a Betsaida, enquanto ele despedia a multidão. E, tendo-os despedido, subiu ao monte para orar. Ao cair da tarde, estava o barco no meio do mar, e ele, sozinho em terra. E, vendo-os em dificuldade a remar, porque o vento lhes era contrário, por volta da quarta vigília da noite, veio ter com eles, andando por sobre o mar; e queria tomar-lhes a dianteira. Eles, porém, vendo-o andar sobre o mar, pensaram tratar-se de um fantasma e gritaram. Pois todos ficaram aterrados à vista dele. Mas logo lhes falou e disse: Tende bom ânimo! Sou eu. Não temais! E subiu para o barco para estar com eles, e o vento cessou. Ficaram entre si atônitos, porque não haviam compreendido o milagre dos pães; antes, o seu coração estava endurecido.
Eles viram os milagres, mas não os compreenderam, e por isto lhes faltou a coragem, tantas vezes! Sabedor destas coisas, Jesus lhes falou palavras encorajadoras, na véspera de sua crucificação: “Estas coisas vos tenho dito para que tenhais paz em mim. No mundo, passais por aflições; mas tende bom ânimo; eu venci o mundo” (João 16.33). A coragem dos discípulos, embora não tenha se mostrado nos terríveis momentos que se seguiram, veio mais tarde, testemunhada pelas próprias autoridades que, “ao verem a intrepidez de Pedro e João, sabendo que eram homens iletrados e incultos, admiraram-se; e reconheceram que haviam eles estado com Jesus” (Atos 4.13).
Abrir a porta da fé, para que outros a conheçam, exige coragem. Este é um dos motivos pelos quais pouquíssimos crentes escolhem ser missionários. Não é o caso de se dizer que os missionários sejam isentos quanto aos temores que todos nós temos. A diferença entre os que decidem atender ou não ao chamado missionário é tão pequena quanto o alcance de um passo apenas. O pastor e missionário Cássio Silva[1] compartilha sua experiência de que
Nosso maior desafio no campo missionário não é aprender línguas complexas, compreender culturas exóticas, nos adaptar a ambientes para nós desconfortáveis, mudar hábitos e gostos alimentares, morar em palhoças ou casebres, embrenhar por florestas traiçoeiras, navegar por rios inóspitos ou peregrinar por desertos causticantes. Também não é encontrar espaço em sociedades pós-modernas, comunicar uma mensagem religiosa para mentes secularizadas, sermos rechaçados como retrógrados, tidos como inconvenientes e discriminados como supersticiosos. Nosso maior desafio no campo missionário é, sim, enfrentar as mazelas da nossa alma, encarar a feiura do nosso próprio coração, romper com as amarras que nos prendem, guardar o coração da vaidade frente aos elogios, do abatimento frente às críticas, do descontentamento frente às frustrações, amar o colega de equipe, amar o povo ao qual servimos, sermos mais servos e menos senhores, mais amigos e menos patrões, mais tolerantes e menos exigentes. Sem a graça, esse é um desafio inatingível e talvez por isso mesmo o Senhor nos chama para estar com Ele.
A coragem não costuma ser inflexível, mas oscilante. Até mesmo Paulo, o herói de nossa história, precisava de alguma exortação, de vez em quando, como a de Atos 23.11, em que “[...] o Senhor, pondo-se ao lado dele, disse: Coragem! Pois do modo por que deste testemunho a meu respeito em Jerusalém, assim importa que também o faças em Roma”.
Sem a chave da coragem, não é possível abrir aos outros porta da fé.
Chave do amor (22-25)
[...] fortalecendo a alma dos discípulos, exortando-os a permanecer firmes na fé; e mostrando que, através de muitas tribulações, nos importa entrar no reino de Deus. E, promovendo-lhes, em cada igreja, a eleição de presbíteros, depois de orar com jejuns, os encomendaram ao Senhor em quem haviam crido. Atravessando a Pisídia, dirigiram-se a Panfília. E, tendo anunciado a palavra em Perge, desceram a Atália [...]
Além da coragem, o que levou os apóstolos a voltarem àquelas cidades, expondo-se ao risco de serem novamente tratados com violência, foi o amor pela alma dos discípulos, que precisava ser fortalecida, ainda depois de assistirem o linchamento de Paulo, por estar propagando o evangelho. Não era tempo de se lamentar, mas de pôr em prática o amor paternal, deixando tudo em ordem antes da partida para a próxima missão.
O amor aqui exemplificado foi, certamente, uma das chaves que abriu a porta da fé aos gentios. Paulo revela, numa carta emocionada aos coríntios, o quanto um amor como este amor é capaz de suportar:
Cinco vezes recebi dos judeus uma quarentena de açoites menos um; fui três vezes fustigado com varas; uma vez, apedrejado; em naufrágio, três vezes; uma noite e um dia passei na voragem do mar; em jornadas, muitas vezes; em perigos de rios, em perigos de salteadores, em perigos entre patrícios, em perigos entre gentios, em perigos na cidade, em perigos no deserto, em perigos no mar, em perigos entre falsos irmãos; em trabalhos e fadigas, em vigílias, muitas vezes; em fome e sede, em jejuns, muitas vezes; em frio e nudez. Além das coisas exteriores, há o que pesa sobre mim diariamente, a preocupação com todas as igrejas. Quem enfraquece, que também eu não enfraqueça? Quem se escandaliza, que eu não me inflame? (2ª Coríntios 11.24-29).
Ele mesmo explica, em 2ª Coríntios 5.14, a motivação desse amor: “[...] Pois o amor de Cristo nos constrange, julgando nós isto: um morreu por todos; logo, todos morreram”. E não podia ser diferente, “porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (João 3.16). E, no final das contas, “nós amamos porque ele nos amou primeiro” (1ª João 4.19).
Deste modo, fica claro que o amor é uma das chaves que abriu a porta da fé aos gentios, e a tem mantida aberta para todo o que crê no Filho unigênito de Deus.
Chave da oração (26-28)
[...] e dali navegaram para Antioquia, onde tinham sido recomendados à graça de Deus para a obra que haviam já cumprido. Ali chegados, reunida a igreja, relataram quantas coisas fizera Deus com eles e como abrira aos gentios a porta da fé. E permaneceram não pouco tempo com os discípulos.
Finalizando a primeira viagem, os apóstolos dos gentios voltaram à sua base, que era Antioquia da Síria, “onde tinham sido recomendados à graça de Deus para a obra que haviam já cumprido”, e onde, com toda a certeza, oravam insistentemente pelo seu ministério. Paulo sabia que a oração era uma das chaves que abriria a porta da fé aos gentios, e por isto pedia frequentemente que orassem, como em Efésios 6.18-22:
[...] com toda oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando com toda perseverança e súplica por todos os santos e também por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra, para, com intrepidez, fazer conhecido o mistério do evangelho, pelo qual sou embaixador em cadeias, para que, em Cristo, eu seja ousado para falar, como me cumpre fazê-lo. E, para que saibais também a meu respeito e o que faço, de tudo vos informará Tíquico, o irmão amado e fiel ministro do Senhor. Foi para isso que eu vo-lo enviei, para que saibais a nosso respeito, e ele console o vosso coração.
Quando um missionário volta para sua base, tem a oportunidade de renovar as suas forças, receber encorajamento e atualizar pessoalmente as informações para que os intercessores possam orar com maior entendimento.
O missionário e professor Thiago Ishy, num artigo publicado no site do Instituto Bíblico Peniel[2], situa a questão da oração da seguinte forma:
[...] Frequentemente me deparo com pessoas que gostariam de investir mais em Missões. A maioria destas associa seu investimento apenas com o suporte financeiro por meio de ofertas missionárias. É claro que este tipo de investimento também faz parte da obra de evangelização dos povos. Entretanto, quando estudamos a Palavra de Deus percebemos que além dos recursos financeiros a obra missionária depende primordialmente da oração. [...] Ore, preferencialmente, de maneira específica, ou seja, lembre-se dos missionários por seus nomes pessoais e de toda a sua família. Sei que é uma tarefa árdua lembrar-se de tantos missionários conhecidos, mas não se esqueça de que a oração exige compromisso. Alguns anos atrás eu notei na mesa de refeição de um casal uma pequena caixa com vários cartões de oração dos vários missionários que eles conheciam. Toda refeição eles retiravam um desses cartões e oravam por aquele missionário ou família. Essa pode ser uma boa ideia. [...] Orar por Missões é também orar por nossa igreja local. Orar acima de tudo por um reavivamento na Palavra. Que as Escrituras possam ensinar, exortar e educar cada membro para a glória de Deus!
Conclusão
A coragem, o amor e a oração foram as chaves que abriram a porta da fé aos gentios. Estas chaves foram utilizadas por Paulo, Barnabé e ainda têm sido utilizadas por toda a igreja, que tem se multiplicado no decorrer de milênios, no poder do Espírito Santo.
A porta da fé ainda está aberta para quem quiser entrar. A fé no Senhor Jesus Cristo nos dá a certeza da vida eterna, e de uma vida melhor ainda neste mundo, na medida em que nos dá sabedoria e fortalecimento no meio das aflições do presente, comuns a todos os homens. Quando entramos pela porta da fé, entendemos que também precisamos abrir uma porta em nosso próprio coração, para que Jesus, por intermédio do Espírito Santo, esteja conosco todos os dias, em todos os momentos.
Ele diz em Apocalipse 3.20: “Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele, comigo”.
Artigo elaborado por: Arildo Louzano da Silveira. São José do Rio Preto, dezembro de 2020.
(*) Foto do cabeçalho: Dominic Walter. disponível em: https://www.idealista.pt/news/imobiliario/internacional/2018/05/23/36321-as-20-portas-mais-impressionantes-do-mundo Acesso em. 13 dez. 2020.
(**) Citações da Bíblia extraídas de: A Bíblia Sagrada. Traduzida em português por João Ferreira de Almeida. Revista e Atualizada 2ªed. 1988, 1993. Barueri: Sociedade Bíblica do Brasil, 2012. 1280p.
[1] SILVA, Cácio. O chamado missionário. Grupo Povos e Línguas (originalmente publicado na Revista Alcance, da APMT). Disponível em: https://portal.povoselinguas.com.br/artigos/vida-missionaria/o-chamado-missionario/ Acesso em 08 dez. 2020.
[2] ISHY, Thiago. Como orar por missões. Site do Instituto Bíblico Peniel, 07/03/2016. Disponível em: http://institutobiblicopeniel.org.br/como-orar-por-missoes/ Acesso em 29 nov. 2017.
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