quinta-feira, 22 de outubro de 2015
Autoridade
(Leia Mc 11.27-33)
Numa roda de amigos, é comum surgir de vez em quando, em tom de zombaria, o questionamento: quem é que manda em sua casa? O homem sente-se na obrigação de responder: "É claro que sou eu". Mas todos nós sabemos que não é bem assim. A questão de autoridade está sempre presente em nossas vidas. No texto deste parágrafo, podemos notar a presença de pelo menos três autoridades, concorrentes entre si.
I - Autoridade civil (27,28)
27 ¶ Então, regressaram para Jerusalém. E, andando ele pelo templo, vieram ao seu encontro os principais sacerdotes, os escribas e os anciãos 28 e lhe perguntaram: Com que autoridade fazes estas coisas? Ou quem te deu tal autoridade para as fazeres?
Os principais sacerdotes, escribas e anciãos, apesar de serem religiosos, acabavam exercendo, também, autoridade civil sobre o povo. Tinham poder de prender, julgar e condenar.
Obedecer às autoridades civis, como os governantes, os juízes, os legisladores e seus delegados, é compatível com a vontade de Deus. Em quase tudo devemos obedecer tais autoridades, a menos que seja uma questão em que se possa dizer: "Antes, importa obedecer a Deus do que aos homens." (At 5.29)
Anne van der Bijl (Sint Pancras, Países Baixos, 11 de maio de 1928), também conhecido como Irmão André, fundador da missão "Portas Aberbas", teve grande conflito com as autoridades civis, desafiando-as para poder levar Bíblias e mensagens evangelísticas ao povo dentro da antiga "cortina de ferro" comunista. Ele escreve, em conjunto com seus biógrafos, no seu livro O contrabandista de Deus (*), sobre as restrições impostas pelo Estado à realização de atividades religiosas. Numa de suas experiências, em uma pequena aldeia da Macedônia, que então pertencia à Iugoslávia, "Era proibido realizar cultos em casas particulares, por isso, Ana simplesmente separara um cômodo, e pendurara uma tabueta na frente, que dizia: Molitven Dom (Casa de Oração)" (pag. 143). Durante o culto, conforme seu relato, estavam "cantando outro hino, quando, de repente, ouviu-se uma batida forte na porta. Todos pararam de cantar. Ana abriu a porta, e ali estavam dois homens uniformizados. Foram até a frente da sala. Durante muito tempo, eles simplesmente ficaram ali de pé, correndo os olhos pela congregação. Então de dirigiram a um canto da sala, para dar uma olhada naqueles rostos assustados. Finalmente, sacaram cadernetas e começaram a anotar o nome dos presentes. Quando terminaram, fizeram algumas perguntas a respeito de Nikola e de mim, e depois saíram tão abruptamente como haviam chegado. (...) Porque o governo escolhera aquela igreja isolada para atacar enquanto deixava outras à vontade, nem Nikola nem eu jamais compreendemos." (pag. 144,145)
Os governos comunistas, porém, não usavam sempre a repressão e ameaças, mas "o esforço parecia ser centralizado nas crianças. Deixem os velhos, mas desmamem os jovens da igreja, parecia ser a ordem" (pag 140). Os jovens também eram vítimas de pressão psicológica. Num evento na Hungria André notou que "Cada jovem estava usando um lenço vermelho vivo que era (...) o símbolo da boa cidadania. Uma das requisições para poder usar aquele lenço, era uma atitude apropriada em relação às superstições religiosas dos seus pais (...). Milagres, a história da criação, o pecado original, a queda do homem, coisas desse tipo" (Pag. 162).
O trabalho do missionário irmão André e de outros crentes corajosos em fazer chegar a Bíblia a estes países, com certeza contribuiu para fazer com que o cristianismo prosperasse, apesar das restrições.
II - Autoridade do céu (eclesiástica) (29,30)
29 Jesus lhes respondeu: Eu vos farei uma pergunta; respondei-me, e eu vos direi com que autoridade faço estas coisas. 30 O batismo de João era do céu ou dos homens? Respondei!
Para muitos de nós, a autoridade dos céus acaba se traduzindo em autoridade eclesiástica, uma vez que confiamos na igreja para interpretar as Escrituras e nos orientar em matéria de fé e de bons costumes.
Dia 31 de outubro comemoramos o início da reforma protestante, quando mudanças estruturais importantes começaram a ser implantadas nas igrejas oficiais, até então monopolizadas pelo catolicismo romano. Os cristãos que aderiram ao movimento reafirmavam que a autoridade dos céus, para os homens, está determinada na Bíblia, a Palavra de Deus, e é comum dizer que a reforma tem como fundamento os "cinco solas": Sola fide (somente a fé); Sola scriptura (somente a Escritura); Solus Christus (somente Cristo); Sola gratia (somente a graça); Soli Deo gloria (glória somente a Deus).
Com a liberdade de pensamento, porém, surgiram conflitos entre os próprios protestantes, pois alguns intérpretes importantes divergiram entre si a respeito de algumas doutrinas, mesmo tendo como base a mesma fonte de autoridade, as Escrituras.
Algumas doutrinas calvinistas foram contestadas por arminianos, e por isto os calvinistas as reiteraram no Sínodo de Dort, em 1619, através dos famosos 5 pontos do calvinismo, que são: T - Total Depravity; Depravação Total; U - Unconditional Election; Eleição Incondicional; L - Limited Atonement; Expiação Limitada I - Irresistible Grace; Graça Irresistível; P - Perseverance of the Saints; Perseverança dos Santos.
Uma vez um pastor me perguntou se eu sou calvinista ou arminiano. Foi difícil eu responder, principalmente porque eu não sabia quem era Armínio. Não pretendo entrar no meio deste duelo de gigantes, mas de uma coisa eu tenho certeza: Armínio, Calvino e eu (e provavelmente você) concordamos que a Bíblia é a única autoridade confiável dada a nós, homens, em matéria de fé e prática.
III - Autoridade social (31-33)
31 E eles discorriam entre si: Se dissermos: Do céu, dirá: Então, por que não acreditastes nele? 32 Se, porém, dissermos: dos homens, é de temer o povo. Porque todos consideravam a João como profeta. 33 Então, responderam a Jesus: Não sabemos. E Jesus, por sua vez, lhes disse: Nem eu tampouco vos digo com que autoridade faço estas coisas.
O povo, ou, em linguagem mais moderna, a sociedade, exerce sobre nós influência tão grande que acaba sendo uma verdadeira autoridade.
O rei Saul temia mais o povo do que a Deus. Em pelo menos três ocasiões na história de Saul, vemos que ele era muito sensível à vontade do povo, o que pode ser bom em alguns momentos, mas ruim em outros. Ele usurpou a posição de sacerdote, oferecendo sacrifícios, para impedir que o povo se dispersasse (1Sm 13.8,11,12); desistiu de executar sua precipitada sentença contra o próprio filho, Jônatas, pela intervenção do povo (1Sm 14.45); desobedeceu ordens expressas de Deus para agradar o povo, e mostrou exagerado interesse em ser honrado diante do povo, quando já havia sido reprovado por Deus (1Sm 15.9,15,21,24,30).
Uma famosa música antiga diz os seguintes versos: "Vivo condenado a fazer o que eu não quero; então bem comportado às vezes eu me desespero. Se faço alguma coisa sempre alguém vem me dizer que isso ou aquilo não se deve fazer. Restam meus botões... já não sei mais o que é certo. E como vou saber o que eu devo fazer? Que culpa tenho eu, me diga amigo meu. Será que tudo o que eu gosto é imoral, é ilegal ou engorda? (...)" (Roberto e Erasmo Carlos). É uma situação engraçada, mas mostra o quanto sofremos a influência das pessoas ao nosso redor, para o bem ou para o mal.
O médico Dráuzio Varela, falando sobre o problema do alcoolismo entre os adolescentes, diz que "Para essa reviravolta em relação ao uso de álcool entre os adolescentes, que ocorreu bruscamente de uma geração para outra, concorreram diversos fatores de risco. O primeiro é que o consumo de bebida alcoólica é aceito e até estimulado pela sociedade. Pais que entram em pânico quando descobrem que o filho ou a filha fumou maconha ou tomou um comprimido de ecstasy numa festa, acham normal que eles bebam porque, afinal, todos bebem. (...) Não é raro o problema começar em casa, com a hesitação paterna na hora de permitir ou não que o adolescente faça uso do álcool ou com o mau exemplo que alguns pais dão vangloriando-se de serem capazes de beber uma garrafa de uísque ou dez cervejas num final de semana." (http://drauziovarella.com.br/dependencia-quimica/alcoolismo-na-adolescencia/ - Acesso em: 17/10/2015)
A Bíblia nos adverte que a pessoa realmente feliz é a que "não anda no conselho dos ímpios, não se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores" (Sl 1.1), e nos aconselha: "Entrai pela porta estreita (larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz para a perdição, e são muitos os que entram por ela)" (Mt 7.13). Portanto, aceitemos a autoridade social somente naquilo em que ela está concordando com os bons princípios da Palavra de Deus.
Quantas autoridades mais podemos citar como decisivas em nossas vidas? Podem ser nossos desejos, nosso orgulho, nossos prazeres, que estão "mandando" em nós e definindo nossos passos. Como temos reagido às autoridades que estão sobre nós? Autoridades civis, eclesiásticas e sociais têm o seu papel, mas não podem sobrepor-se à autoridade das Escrituras, e muito menos do Senhor das Escrituras, em nossa busca de fazer o que agrada a Deus.
(*) O contrabandista de Deus / Irmão André, John e Elizabeth Sherrili; tradução de Adiel Almeida de Oliveira - 3ª ed. - Belo Horizonte: Betânia, 2008
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