segunda-feira, 26 de setembro de 2016

A ascensão dos discípulos (Atos 1.12-14)

(*)

(Leia Atos 1.12-14)

A visão de Cristo ressuscitado finalmente transformou os discípulos. Agora eles estavam prontos para obedecer, esforçando-se para andarem juntos nos caminhos preparados pelo Senhor. Este texto nos apresenta, literal e espiritualmente, um movimento ascendente dos discípulos, em direção aos propósitos celestiais.

SUBIDA PARA JERUSALÉM (Primeiro degrau: Obediência) (12)

"Então, voltaram para Jerusalém, do monte chamado Olival, que dista daquela cidade tanto como a jornada de um sábado".

Num período de tempo, dentro dos 40 dias entre a ressurreição e a assunção, os discípulos voltaram para a Galiléia. O Senhor, porém, tinha um plano para que recebessem coletivamente o derramamento do Espírito Santo na cidade de Jerusalém. Apesar de tantas provas incontestáveis, a natureza humana e as tentações tinham um peso enorme no comportamento dos discípulos, que poderiam acabar se dispersando, sem dar continuidade à obra de proclamação do evangelho. Este, com certeza, foi um dos motivos de Jesus ter aparecido a Pedro e mais seis discípulos no mar da Galiéia, conforme a narrativa de João 21.1-3, 15-17:

"Depois disto, tornou Jesus a manifestar-se aos discípulos junto do mar de Tiberíades; e foi assim que ele se manifestou: estavam juntos Simão Pedro, Tomé, chamado Dídimo, Natanael, que era de Caná da Galiléia, os filhos de Zebedeu e mais dois dos seus discípulos. Disse-lhes Simão Pedro: Vou pescar. Disseram-lhe os outros: Também nós vamos contigo. Saíram, e entraram no barco, e, naquela noite, nada apanharam. (...) Depois de terem comido, perguntou Jesus a Simão Pedro: Simão, filho de João, amas-me mais do que estes outros? Ele respondeu: Sim, Senhor, tu sabes que te amo. Ele lhe disse: Apascenta os meus cordeiros. Tornou a perguntar-lhe pela segunda vez: Simão, filho de João, tu me amas? Ele lhe respondeu: Sim, Senhor, tu sabes que te amo. Disse-lhe Jesus: Pastoreia as minhas ovelhas. Pela terceira vez Jesus lhe perguntou: Simão, filho de João, tu me amas? Pedro entristeceu-se por ele lhe ter dito, pela terceira vez: Tu me amas? E respondeu-lhe: Senhor, tu sabes todas as coisas, tu sabes que eu te amo. Jesus lhe disse: Apascenta as minhas ovelhas".

Pedro obedeceu e, como pastor dos demais discípulos, levou-os ao encontro marcado com o Senhor no Monte das Oliveiras, uma escala em sua subida para Jerusalém. Do monte das oliveiras podiam contemplar a gloriosa cidade. Aquele monte era um lugar aprazível, um lugar de boas lembranças, pois frequentemente pousavam ali com o Mestre. Se fosse pela vontade deles, provavelmente ficariam ali mesmo, até que o Senhor voltasse nas nuvens.

Subir para Jerusalém não seria fácil. Entre outros incômodos, eles ainda corriam perigo de prisões e perseguições. Mas era preciso obedecer a Jesus.

SUBIDA PARA O CENÁCULO (Segundo degrau: Comunhão) (13)

"Quando ali entraram, subiram para o cenáculo onde se reuniam Pedro, João, Tiago, André, Filipe, Tomé, Bartolomeu, Mateus, Tiago, filho de Alfeu, Simão, o Zelote, e Judas, filho de Tiago".

Um cenáculo era um cômodo no andar de cima de uma casa, espaço comumente usado para refeições em família. Este cenáculo, em particular, devia ser bem sofisticado e espaçoso, para caber muitos discípulos. Provavelmente era parte da casa da mãe de João Marcos.

A subida para o cenáculo representava, literalmente e espiritualmente, estar em comunhão. Tantas pessoas, tão diferentes, precisavam de muito esforço para se manter em comunhão. Do pouco que sabemos dos discípulos, podemos afirmar que Pedro era impulsivo e às vezes grosseiro; João e Tiago, ambiciosos e sensacionalistas; Tomé era desconfiado. Mateus, por sua profissão rentável, devia ser acostumado a hábitos refinados. Simão Zelote, um ativista político. Estes discípulos, há muito pouco tempo atrás, estavam brigando entre si, para ver quem seria o maior. Havia também muitas mulheres, as quais, tradicionalmente, precisam de muita fé e boa vontade para “pensar concordemente”.

Aprendemos em 1João 1.7 que se “andarmos na luz, como ele está na luz, mantemos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado”.

Precisamos seguir este exemplo e também “subir ao cenáculo”, valorizando a comunhão com os irmãos. Se devemos valorizar as reuniões com nossa família de sangue, muito mais devemos valorizar as reuniões com nossos irmãos em Cristo. Devemos orar e trabalhar para que os membros nossa família de sangue também se tornem membros de nossa família em Cristo. Se nós cremos que somente aqueles que crêem em Cristo e recebem a salvação, irão para o céu, então temos que admitir que se os membros de nossa família de sangue não vierem estar conosco nas reuniões de adoração, então existe uma grande chance de que fiquemos separados deles por toda a eternidade. Eles precisam saber que nossa fé é coisa séria, e uma das mais eficazes maneiras de mostrar isto a eles é sendo assíduos aos cultos, mesmo que isto às vezes represente deixá-los por um momento de lado.

Nossos parentes precisam entender que temos encontros marcados com Deus e os irmãos periodicamente. Lá em casa, no começo, foi mais difícil e traumático, mas agora eles já se acostumaram. Se recebemos visitas, quando chega a hora de ir à Igreja, nós os convidamos. Se não quiserem nos acompanhar, pedimos licença, dizemos para ficarem à vontade, que assim que o culto terminar, estaremos de volta para continuarmos o “bate-papo”.


SUBIDA PARA O TRONO DE DEUS (Terceiro degrau: ORAÇÃO) (14)

"Todos estes perseveravam unânimes em oração, com as mulheres, com Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos dele".


A oração era o degrau mais alto que eles podiam subir, para estar pertos do Pai. O Pai é que podia acalmar seus corações, dar consolo e segurança. Aqueles que antes não podiam ficar nem uma hora vigiando, agora oravam intensamente.

A obediência leva à comunhão, que promove a oração, que por sua vez nos motiva e capacita à obediência.

Imagino como deveriam ser as reuniões no cenáculo, naqueles dez dias que antecediam o Pentecostes. Tomavam refeições, contavam histórias, formavam-se pequenos grupos conversando animadamente pelos cantos do salão. Num daqueles dias Pedro, de repente, numa pausa, fica pensativo, e começa a se lembrar dos acontecimentos, desde os mais remotos até os mais recentes. Lembra-se que, numa noite, estando no mar da Galiéia, com alguns amigos, aproveitando a brisa suave, tomou uma decisão e disse: “vou pescar”. Então desperta para o momento presente, olha para o grupo assentado ao redor, e diz, com aquele mesmo tom resoluto: “vou orar”, ao que recebe resposta semelhante à daquele dia à beira-mar: “também nós vamos contigo” (Jo 21.3).

A oração dos discípulos tinha duas características: Unanimidade e Perseverança. Sobre a importância da unanimidade, Jesus disse que “(...) se dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a respeito de qualquer coisa que, porventura, pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai, que está nos céus” (Mateus 18.19), e sobre a perseverança, Jesus muitas vezes ensinou “sobre o dever de orar sempre e nunca esmorecer“ (Lc 18.1).

Às vezes, eu chego a especular o motivo de algumas orações coletivas não serem respondidas em nossa congregação. Será que é porque não estamos perseverando, e será que não estamos sendo unânimes, ou seja, está faltando “um voto” na urna de apuração das orações que temos apresentado a Deus? Seu voto, meu irmão, pode ser muito mais importante do que você imagina.

CONCLUSÃO

A visão do Cristo ressuscitado transformou os discípulos. Eles obedeceram, andaram juntos e perseveraram na oração, num movimento ascendente rumo aos propósitos celestiais. Quanto a nós, discípulos tardios, não tivemos o privilégio de ver o Senhor, mas podemos subir os mesmos degraus de obediência, comunhão e oração, nos tornando bem-aventurados, porque Jesus disse: “Bem-aventurados os que não viram e creram” (Jo 20.29).

(*) (Foto: Arquivo Pessoal/ Rafael Defavari. Disponível em: http://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/2015/07/observatorio-de-campinas-tera-evento-de-food-truck-e-astronomia.html. Acesso em: 26/09/2016)

terça-feira, 16 de agosto de 2016

Por que estais olhando para as alturas? (Atos 1.1-11)

(Leia Atos 1.1-11)

A televisão tem descoberto que os Reality Shows fazem sucesso. As pessoas são colocadas num ambiente delimitado, muitas vezes hostil, e com recursos escassos, para testar sua capacidade de resistência e para que todos que tenham acesso às imagens observem as suas reações. Os participantes aceitam submeter-se a estas condições adversas em troca de dinheiro ou outros benefícios.

A vida dos discípulos, em certo sentido, pode ser comparada a um reality show. Jesus mostrou-se ressuscitado, para que ficasse documentada a ressurreição, e em seguida ausentou-se, deixando aos discípulos a responsabilidade de serem suas testemunhas. Começou nesse momento uma jornada que se estende até os nossos dias. Enquanto cumpriam a sua jornada, contavam com o auxílio do Senhor, mas não de forma completa.

O primeiro auxílio dado pelo Senhor aos discípulos foi o estabelecimento do reino de Deus, mas somente no coração dos crentes. Os versículos 6 e 7 dizem: “Então, os que estavam reunidos lhe perguntaram: Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel? Respondeu-lhes: Não vos compete conhecer tempos ou épocas que o Pai reservou pela sua exclusiva autoridade”.

Eu não posso dizer como alguns dizem: “O Brasil é do Senhor Jesus!”. Não é ainda. O Brasil, infelizmente, é do carnaval, é dos corruptos, da dengue, do Zica vírus. Os discípulos, naturalmente, estavam ansiosos pelo reino messiânico. Quem não anseia por um rei que é justo, bondoso, misericordioso, poderoso, que vai estabelecer um reino onde haja paz, segurança, saúde, justiça, e plena alegria? Mas os discípulos, e nós também, não podemos querer antecipar o estabelecimento desse reino. A data e a ocasião propícias são de exclusiva autoridade do Pai. Jesus nos dá vida abundante, proteção, saúde, prosperidade, mas “com perseguições” (Marcos 10.30). Não é o momento ainda de nos livrarmos de todas as tribulações da vida. Nós, os que cremos, somos do Senhor Jesus, mas o mundo inteiro “jaz no maligno” (1ª João 5.19).

O segundo auxílio dado pelo Senhor aos discípulos foi o poder do Espírito Santo, mas não para benefício próprio. O versículo 8 diz: “mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra”.

Eles não podiam fazer nada sem o Espírito Santo. Deviam aguardar que ele os enchesse de poder e sabedoria. O Espírito lhes deu tanto poder que falaram em outras línguas sem terem estudado idiomas, executaram juízo (como no caso de Ananias e Safira), curaram enfermos, ressuscitaram mortos. Mas este poder não podia ser usado em benefício próprio. Somente para o serviço necessário ao Reino. Não puderam ressuscitar Tiago, que foi decapitado. Não puderam executar juízo sobre os seus perseguidores, como fizeram com Ananias e Safira. Não podiam fazer o que desejava o seu coração, mas somente aquilo que era o propósito de Deus.
Quando Jesus lavou os pés dos apóstolos e lhes disse que deveriam fazer como ele deu exemplo, os apóstolos certamente não imaginavam a extensão do significado destas palavras. Os apóstolos se tornaram testemunhas de Jesus e, como ele deu exemplo, sofreram até à morte, perseguições e torturas, por amor do seu nome.

Nós recebemos o Espírito Santo no momento em que cremos. Mesmo assim, não está garantido que seremos sábios e poderosos em todos os nossos atos. A Bíblia diz que devemos procurar ser cheios do Espírito (Efésios 5.18-6.24).
O Espírito Santo nos batiza no lugar da água. A água lava o corpo, e com o corpo limpo sinalizamos que a alma também está limpa. Mas o Espírito Santo produz a própria limpeza da alma. Ele nos faz nascer de novo, faz com que as coisas antigas passem e tudo se faça novo. Mas acontece que nós, tendo recebido uma “casa limpa”, acabamos enchendo-a de entulhos novamente.

O terceiro auxílio dado pelo Senhor aos discípulos foi a sua própria presença, mas não fisicamente. Os versículos 9 a 11 dizem: “Ditas estas palavras, foi Jesus elevado às alturas, à vista deles, e uma nuvem o encobriu dos seus olhos. E, estando eles com os olhos fitos no céu, enquanto Jesus subia, eis que dois varões vestidos de branco se puseram ao lado deles e lhes disseram: Varões galileus, por que estais olhando para as alturas? Esse Jesus que dentre vós foi assunto ao céu virá do modo como o vistes subir.
Enquanto os discípulos olhavam para o céu, deviam estar com o sentimento de quem se despede de uma pessoa muito querida, desejando que ela ficasse. Depois de ouvirem os anjos, e de se conformarem com a partida do Senhor, aguardaram, por todo o restante de suas vidas, a sua volta.

Se Jesus estivesse presente fisicamente, falaríamos com ele sobre o que está nos perturbando, e ele resolveria o problema na mesma hora. Quando queremos convencer alguém da importância de ir à Igreja, nós dizemos: Jesus está presente lá. Mas é um argumento fraco. Se disséssemos: a Soraya Moraes vai estar lá! Eu garanto que as pessoas até pagariam ingresso para entrar na Igreja. E se fosse então o Paul Washer? Nos dias 17 a 21 de outubro de 2016 vai se realizar a 32ª conferência Fiel: “Edificando Igrejas Saudáveis”. No site de divulgação encontramos informações sobre a presença dos Preletores: Augustus Nicodemus Lopes; Greg Gilbert; Jonathan Leemann; Mark Dever; Mez McConnell; Miguel Núñez. Como estarão mais de dois reunidos em nome de Jesus, ele também vai estar lá, mas, é claro, nem precisa dizer isto. Centenas de pessoas pagarão até R$ 250,00 para estar lá. Porque? Pela presença de Jesus? Não. Acontece que pessoas como a Soraya Moraes e Paul Washer e preletores famosos, nós podemos ver com os olhos, ouvir com os ouvidos, e Jesus não. Jesus nós temos que ver com os olhos da fé, e ouvir com o coração. Nós temos que crer sem sentir. Nossa alma anseia pela presença física do Senhor Jesus, mas ainda não o temos.

Nós cantamos em nossa igreja um cântico chamado “As nuvens negras”. Um trecho dele diz: “As nuvens negras, e a dor em mim, eu não compreendo, não sei seu fim. Há muitas coisas a esclarecer, mas sei que um dia hei de saber. Nós falaremos, num porvir de amor. Conversaremos, eu e o Senhor. Pois mil perguntas vou lhe fazer, lindas respostas vai me conceder. Meu sofrimento encobrirei com um sorriso e o vencerei. Nas provas duras e até no fel, prossigo firme, Deus é fiel”. Glória a Deus por essa esperança!

Deus não nos dá o peixe pronto, pelo contrário, ele nos ensina a pescar. A pergunta dos anjos aos discípulos, que contemplavam a ascensão de Jesus, foi: Porque estais olhando para as alturas? Esta pergunta se parece com a que Jeremias fez a Baruque em Jeremias 45.1-5 “(...) Assim lhe dirás: Isto diz o Senhor: Eis que o que edifiquei eu derrubo, e o que plantei eu arranco, e isso em toda esta terra. E procuras tu grandezas para ti mesmo? Não as procures; porque eis que trarei mal sobre toda a carne, diz o SENHOR; porém te darei a tua alma por despojo, em todos os lugares para onde fores.”
Jesus ressuscitou, mas não estabeleceu ainda o seu reino terreno. Seus discípulos receberam poderes, mas não para salvarem a si mesmos (foram mártires). Não era a vontade de Deus, embora estivesse em seu poder, restaurar todas as coisas. O Pai reservou esse tempo para sua exclusiva autoridade.

Jesus concluiu a obra redentora. Agora somos salvos pelo seu sangue. Nós que cremos e recebemos a salvação, não precisamos fazer nada para pagar o preço, nossa dívida foi cancelada. Mas alguém dirá: é só isso? Um pecador faz o que quer, depois se arrepende, e não precisa pagar nada? E ainda tem a garantia da vida eterna? É claro que não é bem assim. Jesus nos salvou, e agora pertencemos a ele. Ele nos deu exemplo de como sofrer pela causa celestial. Ele tem uma tarefa para nós, até que chegue o momento do nosso resgate. Deixou para os seus discípulos a responsabilidade de testemunharem a respeito da salvação.

Porque ficamos olhando para as alturas? Olhemos ao redor. Somos testemunhas de Jesus. Vamos fazer o nosso trabalho direito. Há uma nuvem de testemunhas nos observando.

sábado, 11 de junho de 2016

Livro: Ensaios sobre Marcos

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Ensaios teológicos baseados no Evangelho de Marcos, da Bíblia Sagrada, contendo mais do que simples esboços de sermões ou textos devocionais. São apresentadas teses teológicas, ilustrações, aplicações, elementos essenciais em pregações numa Igreja Evangélica bíblica e tradicional.

terça-feira, 26 de abril de 2016

Vencendo a ansiedade


(Leia Mc 16.1-8)

A ansiedade não é boa para nós. Ela nos tira prazeres, nos tira a paz, nos paralisa. As mulheres que seguiam Jesus deviam estar muito ansiosas por causa da violência, da tragédia que presenciaram. A ansiedade tomou, no coração daquelas mulheres, o lugar reservado à fé. Podemos observar que o Senhor queria remover-lhes a ansiedade, conduzindo-as de volta à fé. Para ajudá-las em sua fraqueza, o Senhor lhes concedeu pelo menos três benefícios.

I - REMOVEU-LHES A PEDRA (1-4)

“Passado o sábado, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, e Salomé, compraram aromas para irem embalsamá-lo. E, muito cedo, no primeiro dia da semana, ao despontar do sol, foram ao túmulo. Diziam umas às outras: Quem nos removerá a pedra da entrada do túmulo? E, olhando, viram que a pedra já estava removida; pois era muito grande”.

Quem sabe a ansiedade das mulheres com relação à pedra era semelhante à dos israelitas diante do Mar Vermelho, antes de Deus abrir para o povo passar. Gosto de uma música que cantamos, que diz: “Se diante de mim não se abrir o mar, Deus vai me fazer andar por sobre as águas.”

Às vezes nós ficamos ansiosos diante de um grande obstáculo, e quando Deus nos “remove as pedras”, esquecemo-nos de dar graças. Somos, muitas vezes, como Jacó, que estava tão acostumado a sofrer, que custou aceitar o fato de que Deus lhe reservara uma grande bênção, ao revelar-lhe que José, seu filho predileto, não só estava vivo, como era muito rico e poderoso, a ponto de se tornar o salvador de sua família (Gn 45.26).

Nossa ansiedade, às vezes, nos dificulta crer que a “pedra” foi removida, e nos coloca em situações como a que li, num folheto evangelístico:

[Certo navio procedia do Oriente e singrava nas proximidades do litoral da América do Sul. A viagem fora longa. O suprimento de água fora insuficiente e, aquela altura, acabou-se. Ali estavam, em pleno oceano, sem água potável, com a terrível ameaça de morrer de sede. Felizmente, um navio de bandeira brasileira aproximou-se o bastante para que o barco em dificuldade pedisse por sinais: “Por favor, cedam-nos um pouco de água potável”. A resposta do navio brasileiro foi imediata: “Desçam os baldes onde estão”. O aflito capitão pensou em tratar-se de uma ordem descabida e repetiu o pedido. E, de novo, o sinal com as mesmas palavras: “Desçam os baldes onde estão”. Obedecendo ao sinal, um balde então foi baixado e mergulhou no oceano. Içado para bordo, o capitão tocou com eles a língua e constatou que a água era doce. O que não sabia é que estavam no centro da larga corrente de água doce, que a força das águas do rio Amazonas empurra para o Atlântico]. (1)

O Senhor não queria que as mulheres ficassem ansiosas, e por isso lhes concedeu o benefício de remover a pedra do sepulcro.

II - MOSTROU-LHES EVIDÊNCIAS (5,6)

“Entrando no túmulo, viram um jovem assentado ao lado direito, vestido de branco, e ficaram surpreendidas e atemorizadas. Ele, porém, lhes disse: Não vos atemorizeis; buscais a Jesus, o Nazareno, que foi crucificado; ele ressuscitou, não está mais aqui; vede o lugar onde o tinham posto”.

O anjo foi muito gentil com as mulheres, recebeu-as como um verdadeiro anfitrião, querendo tranquiliza-las, mostrando-lhes o lugar onde Jesus havia sido posto, explicando que ele ressuscitara.

A Bíblia nos ensina a atentarmos para as evidências, como as que o anjo mostrou às mulheres. “Não desprezeis profecias”, diz 1Ts 5.20. Evidências da ressurreição estão espalhadas nos textos bíblicos e na história secular.

Um dos argumentos mais fortes em defesa da autenticidade e veracidade dos textos bíblicos, o que nos deixa também seguros quanto à narrativa da ressurreição, é a história e o futuro de Israel, que voltou a possuir uma parte do seu território, e foi reconhecido novamente como nação, depois de quase dois mil anos.

Os judeus foram perseguidos tantas vezes, e quase destruídos, mas Deus lhes tem preservado. No livro de Ester, foi relatado que o povo judeu escapou de um genocídio, pela provisão de Deus e a intervenção da rainha e de seu tio Mordecai. Em 70 d.C. houve outra tentativa de extinguir a população judaica, mas um remanescente escapou, fugindo no momento em que o exército romano fez uma pausa no cerco de Jerusalém. Lemos na Wikipedia que, “dos nove milhões de judeus que residiam na Europa antes do Holocausto, cerca de dois terços foram mortos; mais de um milhão de crianças, dois milhões de mulheres e três milhões de homens judeus morreram durante o período” (2). O que ameaça Israel hoje em dia é a “guerra santa” islâmica. Mas nós lemos em Romanos 11.25-29 que há pelo menos uma profecia pendente de cumprimento para esse povo, pelo que ele deve, ainda, ser preservado: “Porque não quero, irmãos, que ignoreis este mistério (para que não sejais presumidos em vós mesmos): que veio endurecimento em parte a Israel, até que haja entrado a plenitude dos gentios. E, assim, todo o Israel será salvo, como está escrito: Virá de Sião o Libertador e ele apartará de Jacó as impiedades. Esta é a minha aliança com eles, quando eu tirar os seus pecados. Quanto ao evangelho, são eles inimigos por vossa causa; quanto, porém, à eleição, amados por causa dos patriarcas; porque os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis”.

Quanto à história de Jesus como um todo, o mundo reconhece a sua existência, ainda que, para a maioria ele foi apenas um grande homem. Recorrendo de novo à Wikipédia, lemos que:

["Numa revisão em 2011 do estado da arte da investigação contemporânea, Bart Ehrman escreveu: "Com certeza existiu, já que praticamente qualquer investigador clássico competente concorda, seja ou não cristão". Richard A. Burridge afirma: "Há aqueles que argumentam que Jesus é produto da imaginação da Igreja e que nunca houve qualquer Jesus. Devo dizer que não conheço nenhum académico de renome que ainda afirme isso". Robert M. Price não acredita que Jesus tenha existido, mas reconhece que o seu ponto de vista é contrário à maioria dos académicos. James D.G. Dunn chama às teorias da inexistência de Jesus "uma tese completamente morta". Michael Grant (um classicista) escreveu em 1977: "em anos recentes, nenhum acadêmico sério se aventurou a postular a não historicidade de Jesus, e os poucos que o fazem não tiveram qualquer capacidade de contrariar as evidências no sentido contrário, muito mais abundantes e fortes. Robert E. Van Voorst declara que os acadêmicos bíblicos e historiadores clássicos encaram as teorias da inexistência de Jesus como completamente refutadas.

O Alcorão menciona o nome de Jesus vinte e cinco vezes, mais do que o próprio Maomé, e enfatiza que Jesus foi também um ser humano mortal que, tal como todos os outros profetas, foi escolhido de forma divina para divulgar a mensagem de Deus."] (3)

Ao ouvirem os argumentos do anjo, as mulheres pareciam desligadas da realidade, e não devem ter prestado muita atenção nas palavras que lhes foram dirigidas.

Quando estamos ansiosos, não conseguimos nos concentrar. Nosso tempo de oração não “rende”, nossa leitura bíblica não atinge o coração. Nestes momentos precisamos nos esforçar para manter a calma ou, como diriam os técnicos de futebol e os líderes empresariais, “manter o foco”. Devemos nos lembrar das evidentes intervenções milagrosas de Deus em nossas vidas, lembrar-nos de que ele nunca nos desamparou. Nossa atitude mais comum, porém, com relação às evidências pessoais da presença de Jesus conosco, é bem ilustrada no Poema “Pegadas na areia”:

[Sonhei que estava caminhando na praia juntamente com Deus. E revi, espelhado no céu, todos os dias da minha vida. E em cada dia vivido, apareciam na areia, duas pegadas : as minhas e as dele. No entanto, de quando em quando, vi que havia apenas as minhas pegadas, e isso precisamente nos dias mais difíceis da minha vida. Então perguntei a Deus: "Senhor, eu quis seguir-te, e tu prometeste ficar sempre comigo. Porque deixaste-me sozinho, logo nos momentos mais difíceis?” Ao que ele respondeu: "Meu filho, eu te amo e nunca te abandonei. Os dias em que viste só um par de pegadas na areia são precisamente aqueles em que eu te levei nos meus braços”.] (4)

As evidências indicadas pelo anjo foram, para as mulheres, um benefício para combater a ansiedade.

III - DEU-LHES INSTRUÇÃO (7,8)

“Mas ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que ele vai adiante de vós para a Galiléia; lá o vereis, como ele vos disse. E, saindo elas, fugiram do sepulcro, porque estavam possuídas de temor e de assombro; e, de medo, nada disseram a ninguém”.

As mulheres receberam instruções específicas do anjo, de forma que não havia mais motivo para ansiedade, bastando que se concentrassem, simplesmente, em seguir as referidas instruções.

Entre as maiores riquezas que podemos almejar, está a instrução, o conhecimento. Ao nos instruir sobre a maneira como devemos conduzir a nossa vida, a Bíblia mostra que entende o nosso modo de pensar. Vivemos ansiosos procurando meios de sermos supridos de coisas materiais, mas o Senhor quer que deixemos de lado essa ansiedade, e busquemos primeiro o seu reino e a sua justiça. Porque tudo o que necessitarmos, ele suprirá, conforme promete em Mateus 6.25-33:

[Por isso, vos digo: não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer ou beber; nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que as vestes? Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta. Porventura, não valeis vós muito mais do que as aves? Qual de vós, por ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua vida? E por que andais ansiosos quanto ao vestuário? Considerai como crescem os lírios do campo: eles não trabalham, nem fiam. Eu, contudo, vos afirmo que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles. Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós outros, homens de pequena fé? Portanto, não vos inquieteis, dizendo: Que comeremos? Que beberemos? Ou: Com que nos vestiremos? Porque os gentios é que procuram todas estas coisas; pois vosso Pai celeste sabe que necessitais de todas elas; buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas].

Salmos 119.105 diz que a Palavra de Deus é lâmpada para os nossos pés, e luz para os nossos caminhos. Em 2Pedro 1.19 lemos que a palavra profética é “como a uma candeia que brilha em lugar tenebroso, até que o dia clareie e a estrela da alva nasça em vosso coração”. Oséias (4.6) aponta o motivo para o povo de Deus estar sendo destruído. É que lhe faltava o conhecimento.

Assim como as mulheres, recebemos, também, junto com os tessalonicenses (1Ts 5.16-25) instruções bem específicas para vencer a ansiedade:

[Regozijai-vos sempre. Orai sem cessar. Em tudo, dai graças, porque esta é a vontade de Deus em Cristo Jesus para convosco. Não apagueis o Espírito. Não desprezeis as profecias; julgai todas as coisas, retende o que é bom; abstende-vos de toda forma de mal. O mesmo Deus da paz vos santifique em tudo; e o vosso espírito, alma e corpo sejam conservados íntegros e irrepreensíveis na vinda de nosso Senhor Jesus Cristo. Fiel é o que vos chama, o qual também o fará. Irmãos, orai por nós].

CONCLUSÃO

Não podemos ficar paralisados. Em vez disso, devemos “preparar nossos aromas” esperando que o Senhor nos remova as pedras, as quais são muito grandes para nós. Observemos as evidências (não desprezemos profecias), para que tenhamos confiança. Façamos o nosso trabalho, principalmente no que se refere a falar do evangelho, para que o maior número possível de pessoas possa encontrar-se com Jesus.

Referências:

(1) (Disponível em: http://www.recantodasletras.com.br/cronicas/4273841 - Acesso em: 07-02-2016)
(2) (https://pt.wikipedia.org/wiki/Holocausto - Acesso em: 07-02-2016);
(3) (disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Jesus acesso em: 08-08-2015)
(4) (Mary Stevenson. 1936. Disponível em: http://www.lindasmensagenseoracoes.com.br/2010/08/poema-pegadas-na-areia.html acesso em: 06/02/2016. Ou Margaret Fishback Powers. 1964. Disponível em: http://www.wook.pt/ficha/pegadas-na-areia/a/id/1553625 acesso em: 06/02/2016)

Este e outros artigos deste Blog fazem parte do livro "Ensaios sobre Marcos – Andando com Jesus", disponível em um dos links abaixo:

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segunda-feira, 11 de abril de 2016

Adoração ou idolatria?


(Leia Mc 15.42-47)

O Breve Catecismo de Westminster, formulado por teólogos ingleses e escoceses da Assembleia de Westminster, no séc. XVII, começa com a pergunta: “Qual é o fim principal do homem?” E o texto mesmo responde: “O fim principal do homem é glorificar a Deus, e gozá-lo para sempre. Referências: Rm 11.36; 1Co 10.31; Sl 73.25-26; Is 43.7; Rm 14.7-8; Ef 1.5-6; Is 60.21; 61.3”.

Mas o homem desviou-se cedo do seu propósito, tendendo à idolatria, conforme Romanos 1.25: “pois eles mudaram a verdade de Deus em mentira, adorando e servindo a criatura em lugar do Criador (...)”.

Neste parágrafo do evangelho de Marcos, podemos perceber três costumes que podem sutilmente levar os homens à idolatria.

1 – Cerimonialismo (42,43)

“Ao cair da tarde, por ser o dia da preparação, isto é, a véspera do sábado, vindo José de Arimatéia, ilustre membro do Sinédrio, que também esperava o reino de Deus, dirigiu-se resolutamente a Pilatos e pediu o corpo de Jesus”.

José era ilustre membro do sinédrio, e não podia deixar que o sábado fosse profanado. Tinha que tomar uma atitude para com o corpo de Jesus, por isso tomou coragem e foi falar com Pilatos.

O sábado era sagrado, conforme mandamento de Deus, desde a antiguidade. Mas os filhos de Israel desprezaram os mandamentos, e se deram à idolatria. Em 2Cr 36.15-17 lemos uma sentença contra o povo, uma explicação do motivo pelo qual eles estavam sendo levados cativos para Babilônia. Logo em seguida, em 2Cr 36.21, Deus informa que o cativeiro duraria “até que a terra se agradasse dos seus sábados”. Passados os setenta anos de cativeiro, o povo aprendeu que tinha que extirpar os ídolos, mas seu coração ainda não era perfeito, e a idolatria tornou-se mais sofisticada. Agradou-se dos sábados, mas com o tempo, o sábado tornou-se tão importante que, obcecados, o colocaram num patamar acima do Senhor Jesus, a ponto de ter que lembrá-los, em Mateus 12.8, de que “o Filho do Homem é senhor do sábado”.

O sistema religioso judaico era tão atraente que encantou os gálatas, aos quais Paulo admoestou: “Ó gálatas insensatos! Quem vos fascinou a vós outros, ante cujos olhos foi Jesus Cristo exposto como crucificado? (...) Sois assim insensatos que, tendo começado no Espírito, estejais, agora, vos aperfeiçoando na carne?” (Gl 3.1,3).

Apesar de os ídolos tradicionais terem sido extirpados, tanto do judaísmo quanto do cristianismo, a Idolatria ainda era um problema no novo testamento, tanto que Paulo exorta os Coríntios: “Portanto, meus amados, fugi da idolatria” (1Co 10.14). E João, quase no final dos tempos bíblicos, adverte seus discípulos: “Filhinhos, guardai-vos dos ídolos” (1Jo 5.21).

O ato de José de Arimatéia, ao pedir o corpo de Jesus, e não deixá-lo passar o sábado na cruz, foi um ato nobre e corajoso, mas ele teria que ir além, encarar o sinédrio e proclamar abertamente sua fé. A Bíblia não diz, mas provavelmente ele o fez, mostrando que sua motivação era mais do que um simples cerimonialismo.

2 – Exaltação do trabalho (44,45)

“Mas Pilatos admirou-se de que ele já tivesse morrido. E, tendo chamado o centurião, perguntou-lhe se havia muito que morrera. Após certificar-se, pela informação do comandante, cedeu o corpo a José”.

Pilatos era um governador competente. Um administrador prudente. Certificou-se de que Jesus estava mesmo morto. O Centurião certificou-se da morte do Senhor traspassando-lhe o lado com uma lança (Jo 19.34). Nenhum erro podia ser cometido.

O trabalho foi criado por Deus, é uma bênção para o homem. Ele é que gera a riqueza das nações. Nós, paulistas, nos orgulhamos de sermos um povo trabalhador. Ser trabalhador é bom, mas existe problema quando alguém passa a considerar o trabalho como sua “religião”. O homem pode cobiçar, de tal forma, a riqueza gerada pelo trabalho, ou pode amar tanto o próprio trabalho, em si mesmo, que deixa de lado a família, prejudica sua saúde, e deixa de prestar culto a Deus. Não devemos nos esquecer de que, ao criar o trabalho, Deus também criou o descanso. Num ciclo de sete dias, um deles deve ser de descanso e adoração, conforme Êxodo 20.9,10: “Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do SENHOR, teu Deus; não farás nenhum trabalho, nem tu, nem o teu filho, nem a tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o forasteiro das tuas portas para dentro”.

Tanto Pilatos quanto o centurião demonstraram que eram exímios trabalhadores, mas estavam tão cegos na realização do seu trabalho, que nem se deram conta de que estavam sendo operadores da morte do Senhor Jesus, o autor da vida (At 3.15).

Sejamos bons trabalhadores, porque isto agrada o Senhor, mas não vamos nos exceder, a ponto de transformar o trabalho, sutilmente, numa idolatria.

3 – Veneração (46,47)

“Este, baixando o corpo da cruz, envolveu-o em um lençol que comprara e o depositou em um túmulo que tinha sido aberto numa rocha; e rolou uma pedra para a entrada do túmulo. Ora, Maria Madalena e Maria, mãe de José, observaram onde ele foi posto”.

Aqui nestes versículos vemos alguns ícones da religião cristã. A cruz, o lençol que, segundo a tradição se tornou em Santo Sudário, e o túmulo, que ainda hoje é venerado, na Igreja do “Santo Sepulcro”.

O que fizeram com estes ícones do cristianismo é similar à idolatria a que foi dedicada a Neustã, e que veio à tona no texto bíblico de 2Rs 18.4. Essa serpente de bronze fora manufaturada para ser um símbolo de fé no Senhor misericordioso, que os livraria das mordeduras das serpentes (Nm 21.9), mas transformou-se num objeto de idolatria.

Existem ícones seculares, hoje em dia, que também são idolatrados veladamente. Por exemplo: o que vem à sua mente quando perguntam qual a melhor marca de aparelho celular, de carro, moto, ou roupa? Não são os ícones que têm sido consagrados pelo mercado consumidor?

Tiveram bastante cuidado com o corpo de Jesus, e isto é louvável. Mas não é só isto que Deus espera de nós. Na verdade, precisamos tomar cuidado para que nossa adoração não se transforme numa idolatria.

Tomemos cuidado com os ícones, as marcas registradas, o time preferido, o herói, a igreja, o programa de evangelização (Oanse, Esquadrão, Reformados…). Qual a utilidade de campanhas como as que dizem: “Eu sou a Universal”; “Sou católico apostólico Romano, e amo a minha Igreja”? Há perigo de incentivo à idolatria até mesmo em corinhos de Escola Dominical, como o que diz: “Saudamos nossa Bíblia (...)”. Esse livro de Deus foi feito para nos instruir, mas, contra o seu próprio ensino, pode se tornar em objeto de idolatria.

O nome de nossa Igreja é bem pretencioso: “Igreja Bíblica”. Minha primeira impressão com esse nome não foi muito favorável. Antes de me converter, achei que esta igreja era uma seita que adorava a Bíblia. Graças a Deus acabei descobrindo que, na verdade, o Pai celestial e seu filho Jesus Cristo é que são honrados aqui, tendo a Bíblia como guia de fé e prática.

A idolatria pode ser praticada até mesmo sob o pretexto de adoração do próprio Deus verdadeiro, e por isso o povo foi advertido em Dt 4.12, e 15-19: “Então, o SENHOR vos falou do meio do fogo; a voz das palavras ouvistes; porém, além da voz, não vistes aparência nenhuma. (...) Guardai, pois, cuidadosamente, a vossa alma, pois aparência nenhuma vistes no dia em que o SENHOR, vosso Deus, vos falou em Horebe, no meio do fogo; para que não vos corrompais e vos façais alguma imagem esculpida na forma de ídolo, semelhança de homem ou de mulher, semelhança de algum animal que há na terra, semelhança de algum volátil que voa pelos céus, semelhança de algum animal que rasteja sobre a terra, semelhança de algum peixe que há nas águas debaixo da terra. Guarda-te não levantes os olhos para os céus e, vendo o sol, a lua e as estrelas, a saber, todo o exército dos céus, sejas seduzido a inclinar-te perante eles e dês culto àqueles, coisas que o SENHOR, teu Deus, repartiu a todos os povos debaixo de todos os céus”.

Examinemos nossos costumes e o nosso coração, para ver se não há em nós tendências idólatras como o cerimonialismo, a exaltação do trabalho ou veneração de coisas sagradas. Aprendamos a adorar o Deus verdadeiro, em Espírito e em verdade.

quinta-feira, 17 de março de 2016

Ao lado de Jesus


(Leia Mc 15.33-41)

Jesus não desceu da cruz, mas Deus, o Pai, resolveu intervir. As trevas que dominaram a terra eram como um luto pelo que estavam fazendo com o seu Filho. O clamor de Jesus era desesperador, pois era o clamor do Filho, eterno, desamparado pelo Pai, eterno. O pecado de toda a humanidade estava sendo castigado em Jesus. O véu do santuário rasgou-se, colocando à mostra o santo dos santos. Era como se Deus estivesse rasgando as suas vestes diante do terror, da angústia, da calamidade que tinha diante de si.

Mas a intervenção de Deus também tinha o propósito de mostrar que a morte de Jesus não tinha sido a morte de um homem qualquer. Nos outros evangelhos vemos que também houve um terremoto, e que sepulcros de santos se abriram, e alguns ressuscitados saíram, depois da ressurreição de Jesus, e apareceram a muitos. Era como se Deus estivesse dando mais uma chance àquele povo incrédulo para acreditar no Filho de Deus, por meio destes sinais.

Chegaram a pensar que tudo aquilo era um teste para ver se Jesus era mesmo o filho de Deus, mas, se era um teste para ele, era também um teste para revelar o que estava no coração das pessoas. Os que testemunhavam a morte do Senhor Jesus reagiram, cada um à sua maneira, diante da evidência de que Jesus não era um homem qualquer. Podemos identificar neste texto três maneiras pelas quais as pessoas reagiram aos acontecimentos que envolviam a morte de Jesus:

1. Reagindo como alguém que quer testar a Deus (33-36)

“Chegada a hora sexta, houve trevas sobre toda a terra até a hora nona. À hora nona, clamou Jesus em alta voz: Eloí, Eloí, lamá sabactâni? Que quer dizer: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste? Alguns dos que ali estavam, ouvindo isto, diziam: Vede, chama por Elias! E um deles correu a embeber uma esponja em vinagre e, pondo-a na ponta de um caniço, deu-lhe de beber, dizendo: Deixai, vejamos se Elias vem tirá-lo!”

Alguns observavam atentamente, para ver no que ia dar o caso. Não entenderam direito o clamor de Jesus, e acharam que ele estava chamando o profeta Elias para vir ajudá-lo.

Podemos aplicar esta situação ao nosso contexto. Muitas pessoas vão à Igreja para fazer um teste, para dar uma chance para Deus. Querem ver se suas vidas vão mesmo melhorar se o servirem. Alguns dão um longo prazo, outros não têm muita paciência. Querem ver logo os milagres.

Jesus não iria mostrar nenhum milagre naquela cruz, os observadores que isto queriam, estavam perdendo o seu tempo. Jesus estava ocupado com a salvação da humanidade, não estava ali para satisfazer a curiosidade do povo.

Cientistas, naturalmente, fazem experiências. Há coisas, porém, que não podem ser submetidas a experiências. Testam-se medicamentos em cobaias (animais), primeiro, e só depois que têm segurança vão testá-los em seres humanos. Com as coisas eternas, sobretudo, não há possibilidade de experiências. A Teologia é uma ciência que admite a fé, porque nem tudo ela pode testar e explicar com os métodos científicos. Entretanto, Deus nos ensina a maneira certa de fazer experiência teológica em Salmos 34.8, dizendo: “Oh! Provai e vede que o SENHOR é bom; bem-aventurado o homem que nele se refugia”. Outra experiência é sugerida em Zc 3.10: “Trazei todos os dízimos à casa do Tesouro, para que haja mantimento na minha casa; e provai-me nisto, diz o SENHOR dos Exércitos, se eu não vos abrir as janelas do céu e não derramar sobre vós bênção sem medida”.

2. Reagindo como alguém que reconhece o seu erro, mas tarde demais (37-39)

“Mas Jesus, dando um grande brado, expirou. E o véu do santuário rasgou-se em duas partes, de alto a baixo. O centurião que estava em frente dele, vendo que assim expirara, disse: Verdadeiramente, este homem era o Filho de Deus.”

Alguns se tornaram como Judas, que reconheceu o seu grande erro, mas era tarde para arrependimento. O centurião, por exemplo, já havia feito tudo o que não se devia fazer com o Filho de Deus. Multidões, infelizmente, apesar de tantos avisos e evidências, só reconhecerão quem é Jesus depois que já estiverem irremediavelmente condenados.

A Bíblia fala que Israel um dia reconhecerá seu erro, e aparentemente lhe será dada uma oportunidade de arrependimento: “E sobre a casa de Davi e sobre os habitantes de Jerusalém derramarei o espírito da graça e de súplicas; olharão para aquele a quem traspassaram; pranteá-lo-ão como quem pranteia por um unigênito e chorarão por ele como se chora amargamente pelo primogênito” (Zacarias 12:10).

Pode ser cedo, ou pode ser tarde, mas todo joelho se dobrará um dia diante de Jesus, conforme diz Isaías 45.23 “Por mim mesmo tenho jurado; da minha boca saiu o que é justo, e a minha palavra não tornará atrás. Diante de mim se dobrará todo joelho, e jurará toda língua.” Esta profecia foi aplicada por Paulo em Romanos 14.10,11 “Tu, porém, por que julgas teu irmão? E tu, por que desprezas o teu? Pois todos compareceremos perante o tribunal de Deus. Como está escrito: Por minha vida, diz o Senhor, diante de mim se dobrará todo joelho, e toda língua dará louvores a Deus”.

Esta situação aplica-se também a muitos que não tiveram os devidos cuidados na criação de seus filhos, na relação conjugal, no cuidado da saúde, e agora colhem amargos frutos. Se não nos submetermos a Jesus agora, como Salvador, vamos ter que nos submeter a ele na ressurreição, como Juiz.

3. Reagindo como alguém que serve o Senhor, independente das circunstâncias (40-41)

“Estavam também ali algumas mulheres, observando de longe; entre elas, Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, o menor, e de José, e Salomé; as quais, quando Jesus estava na Galileia, o acompanhavam e serviam; e, além destas, muitas outras que haviam subido com ele para Jerusalém.”

As mulheres estavam o tempo todo com Jesus, mesmo observando de longe. Eram fracas, nada podiam fazer. As mulheres não tinham voto, não tinham força física, suas opiniões eram desprezadas. Observavam impotentes, submissas e entristecidas, os homens se enganando, se matando, bêbados e cegos caminhando rumo ao abismo. A mulher de Pilatos bem que tentou avisá-lo, mas ele tinha seu próprio código de honra. Quem sabe a mulher do centurião, e dos soldados, quiseram impedi-los de cometerem injustiças, mas foram repelidas, como quem diz: “fiquem caladas, vocês não sabem de nada”. Mas estas mulheres, desta vez, foram inocentes. No caso do jardim do Éden, a mulher incitou o homem a pecar; aqui elas estavam caladas. Quem sabe outras mulheres estavam tentando convencer os seus maridos, os seus irmãos, os seus filhos, que estavam cometendo loucuras, que deviam parar com aquilo e colocarem a cabeça no lugar. Mas eles estavam cegos, suas emoções os dominavam, seu orgulho não os deixava retroceder, estavam fadados, pelo seu impulso, a terminar o que haviam começado. A trajetória das mulheres encontra-se mais detalhada na narração de Lucas, em Lc 23.55-24.10.

E quanto a nós? Imaginemo-nos ao lado de Jesus crucificado, morrendo. Como reagiríamos diante disso? Não façamos testes com nossas vidas, pois ela é única e preciosa. Não deixemos até que seja tarde demais pra reconhecer que Jesus é o Filho de Deus, que precisamos aceitar a sua salvação. Sejamos humildes como foram as mulheres, que também não entendiam das leis, da teologia, dos códigos de honra que levaram os homens a crucificarem o Senhor da Glória. Elas só sabiam que deviam estar ao lado de Jesus, seja nas montanhas e praias da Galileia, seja na Cruz.

Temos feito imprudentes experiências? Estamos “deixando o barco rolar”, para ver no que vai dar? Estamos deixando para decidir quando virmos os milagres e as profecias apocalípticas se cumprindo? Ou estamos seguindo com fé todos os passos de Jesus, procurando conhecê-lo melhor através de sua palavra, oração e obediência? Esta é uma questão que envolve não somente os possíveis galardões celestes, mas uma questão de vida ou morte.

sexta-feira, 11 de março de 2016

O Leão e o Cordeiro


(Leia Mc 15.25-32)

Um escritor de ficção científica, chamado Aldous Huxley, certa vez sentenciou que “os homens criam seus deuses à sua imagem e semelhança”. Este também era o pensamento do filósofo grego Xenófanes, que já no século cinco antes de Cristo, criticava os que atribuíam aos deuses características humanas. Mas, é claro, Deus é Deus, independente de como suas criaturas o imaginem. O povo em Jerusalém estava diante do próprio Deus, feito homem, crucificado, e não admitiam. Seu conceito de quem seja Deus, e de quem seja o seu escolhido, não admitia o que estava acontecendo. Não podiam crer em Jesus, pois ele fugia do padrão de sua teologia.

NÃO PODIAM CRER QUE ALGUÉM CRUCIFICADO FOSSE UM REI (25,26)

"Era a hora terceira quando o crucificaram. E, por cima, estava, em epígrafe, a sua acusação: O REI DOS JUDEUS".

Na frente de nossa Igreja está em epígrafe: “Jesus é a verdade”. As letras estão desbotadas, a pintura está gasta. As lâmpadas estão queimando, as instalações estão se deteriorando. São 28 anos! Talvez quem passa em frente possa raciocinar: "Se as pessoas que ali se reúnem acreditassem mesmo que Jesus é a verdade, não deixariam isso acontecer com esse edifício que leva o seu nome. Deveriam trocar aquele letreiro por letras feitas de ouro".

Para o povo que passava em frente ao local da execução, eram incompatíveis as inscrições sobre a cruz. Como podia um rei estar naquelas condições? As pessoas queriam que Jesus descesse da cruz, mas eles é que deviam tirá-lo de lá. Eles é que crucificaram o Senhor da Glória. Em Atos 2.23 Pedro denuncia:"(...) vós o matastes, crucificando-o por mãos de iníquos"; e Salmos 69.26 profetizou: "(...) perseguem a quem tu feriste e acrescentam dores àquele a quem golpeaste".

Essa acusação se estende a nós, mesmo que estejamos tão distantes no tempo, porque Hebreus 6.6 fala dos que rejeitam a salvação que "(...) de novo, estão crucificando para si mesmos o Filho de Deus e expondo-o à ignomínia".

NÃO PODIAM CRER QUE ALGUÉM CRUCIFICADO FOSSE UM BENFEITOR (27,28)

"Com ele crucificaram dois ladrões, um à sua direita, e outro à sua esquerda. E cumpriu-se a Escritura que diz: Com malfeitores foi contado".

Quem são considerados “benfeitores” neste mundo? Há muitos poderosos que, apoiados pelo povo, andam bem vestidos e falam palavras bonitas, mas vivem “devorando” os pobres da terra. Pessoas como Pilatos, como Herodes, como César.

Em Atos 12.20-22 lemos que Herodes, ao se reconciliar com os habitantes de Tiro e de Sidom, apresentou-se ao povo, vestido de traje real, assentado no trono, enquanto o povo clamava: "É voz de um deus, e não de homem!". Mas a Jesus, um crucificado, nunca diriam que é um benfeitor.

NÃO PODIAM CRER QUE ALGUÉM CRUCIFICADO FOSSE UM SALVADOR (29-32)

“Os que iam passando, blasfemavam dele, meneando a cabeça e dizendo: Ah! Tu que destróis o santuário e, em três dias, o reedificas! Salva-te a ti mesmo, descendo da cruz! De igual modo, os principais sacerdotes com os escribas, escarnecendo, entre si diziam: Salvou os outros, a si mesmo não pode salvar-se; desça agora da cruz o Cristo, o rei de Israel, para que vejamos e creiamos. Também os que com ele foram crucificados o insultavam”.


O povo ainda hoje está querendo que Jesus desça da cruz. Graças a Deus que ele não aceitou a provocação! Querem ver um Jesus poderoso, que cure as doenças, que dê prosperidade. Aos que não pensam assim, perguntam: quem é o Deus que você serve? Não é um Deus poderoso? Qual Jesus você serve? Paulo responde em 1Coríntios 2.2: "Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo e este crucificado". Nós podemos nos envergonhar e nos esconder como fizeram os discípulos no começo, ou podemos levantar a cabeça e proclamar a nossa fé independente das circunstâncias.

Grande parte de nossa aflição é motivada por nos sentirmos diminuídos diante do mundo. Queríamos que nossas orações fossem respondidas imediatamente, que os ímpios fossem punidos imediatamente. Como isto não acontece, nos sentimos envergonhados. Alguns que saíram de entre nós cederam à tentação e foram procurar outras igrejas, onde se promove outro tipo de pensamento, e gritos de vitória. Parece que nós somos derrotados, e os outros são vitoriosos. Se quisermos ser poderosos como um leão, lembremo-nos de que Jesus, embora sendo um leão, se portou como um cordeiro. Deus é o que é. Jesus é o que é, independente do que suas criaturas possam querer que ele seja.

Jesus crucificado não deixou de ser um Rei; Jesus crucificado não deixou de ser um benfeitor; Jesus crucificado não deixou de ser o Salvador.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Pouco Caso


(Leia Mc 15.16-24)

Jesus estava indo para a cruz. Para a execução da pena, foi entregue aos cuidados dos soldados. Conforme profetizou Isaías (53.3), ele “era desprezado e o mais rejeitado entre os homens; homem de dores e que sabe o que é padecer; e, como um de quem os homens escondem o rosto, era desprezado, e dele não fizemos caso.”

Os soldados eram homens comuns, que não se davam conta de que tinham em suas mãos aquele que era o motivo de estarem vivos, o próprio Criador que se fez homem, e estava prestes a morrer em favor de todo o que nele crê. Através de Lucas (23.34) sabemos que Jesus disse, no final: “(...) Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem (...)”.

PARA OS SOLDADOS, JESUS ERA APENAS UM MOTIVO DE PIADAS (16-19)

“Então, os soldados o levaram para dentro do palácio, que é o pretório, e reuniram todo o destacamento. Vestiram-no de púrpura e, tecendo uma coroa de espinhos, lha puseram na cabeça. E o saudavam, dizendo: Salve, rei dos judeus! Davam-lhe na cabeça com um caniço, cuspiam nele e, pondo-se de joelhos, o adoravam.”

Os soldados queriam se divertir. Seu trabalho era pesado, e a diversão lhes fazia esquecer as amarguras da vida, era o seu "happy hour". Antes de condenar os soldados, precisamos olhar para nós mesmos, se não estamos agindo de maneira semelhante, vivendo a vida como se tudo fosse brincadeira. Abusamos da vida que Deus nos deu, aproveitamos as bênçãos que temos recebido, vivendo despreocupadamente, como fazem os chamados “bon vivant”.

Zombaram de Jesus levando-o para dentro de um palácio que não era dele. Um lugar dominado pelo “príncipe deste mundo”, cheio de abominações, a ponto de os próprios Judeus, que acusavam Jesus, terem se recusado a entrar nele, para manterem sua “santidade”, sem a qual não poderiam comer a Páscoa (Jo 18.28).

Há lugares neste mundo que representam o palácio celestial do Rei Jesus. Destes lugares nós devemos zelar, porque Deus escolheu honrá-los com a presença de seu Espírito de maneira singular. Por não reconhecer este fato, o povo de Israel foi repreendido em Ageu 1.4, por habitarem “em casas apaineladas”, enquanto o templo, também chamado de “casa de Deus”, permanecia em ruínas.

Devemos nos lembrar, também, de que o nosso próprio corpo se transforma em palácio para morada do Espírito do Senhor, desde o momento em que abrimos para ele a porta do nosso coração. Somos alertados para este fato, por exemplo, em 1Coríntios 3.16 e 6.19. Temos a obrigação de cuidar bem do nosso corpo, considerando que ele não nos pertence mais, pois foi dedicado em santidade ao Rei Jesus, para o seu serviço.

O crente é notório, tradicionalmente, como alguém que não bebe, não fuma, e não faz outras “extravagâncias”. O conceito moderno de cuidado do corpo e da mente, porém, envolve muito mais do que se abster destas coisas. Podemos aproveitar muito dos conselhos de especialistas em “dietas equilibradas” e “vida regrada”, sem, contudo, chegarmos ao extremo de idolatrarmos o próprio corpo.

O palácio de Jesus não era aquele pretório, que pertencia aos governadores romanos. A despeito da zombaria, haverão de reconhecer que o seu palácio é muito superior.

Outra forma de zombaria usada pelos soldados refere-se às vestimentas. O ânimo de escarnecer do ilustre prisioneiro era tão grande, que lhe arrumaram uma sofisticada capa de púrpura, e se deram ao trabalho de tecer-lhe uma coroa de espinhos.

Mas estas vestes não pertenciam a Jesus. Deus, o Pai, estava prestes a providenciar-lhe “vestes de salvação” e o “manto de justiça”, conforme a profecia de Is 61.10. O próprio Senhor “vestiu-se de justiça, como de uma couraça, e pôs o capacete da salvação na cabeça; pôs sobre si a vestidura da vingança e se cobriu de zelo, como de um manto” (Is 59.17).

Quando nós chamamos Jesus de Rei, mas não fazemos o que ele manda, não honramos o seu nome, é como se estivéssemos colocando em sua cabeça uma coroa de espinhos. Machuca. É como se estivéssemos vestindo-o de um manto de zombaria.

PARA OS SOLDADOS, JESUS ERA APENAS UM PESO TEDIANTE (20-23)

“Depois de o terem escarnecido, despiram-lhe a púrpura e o vestiram com as suas próprias vestes. Então, conduziram Jesus para fora, com o fim de o crucificarem. E obrigaram a Simão Cireneu, que passava, vindo do campo, pai de Alexandre e de Rufo, a carregar-lhe a cruz. E levaram Jesus para o Gólgota, que quer dizer Lugar da Caveira. Deram-lhe a beber vinho com mirra; ele, porém, não tomou.”

Os soldados não eram “bon vivants”. Tinham um trabalho para fazer, e chegara a hora de agir. Nem se divertiram muito com aquele prisioneiro, pois ele permanecia passivo, resignado, e não desesperado e assustado como os demais.

Ao sair do palácio, ironicamente, acompanhava o Rei uma forte escolta armada. Mas essa escolta não havia sido convocada por ele. Sua verdadeira escolta está prevista em Jd 1.14,15, que diz: “(...) Eis que veio o Senhor entre suas santas miríades, para exercer juízo contra todos e para fazer convictos todos os ímpios, acerca de todas as obras ímpias que impiamente praticaram e acerca de todas as palavras insolentes que ímpios pecadores proferiram contra ele.”

A “brincadeira” estava ficando sem graça. Jesus estava tão debilitado, fisicamente, que nem podia carregar a sua cruz. Os soldados forçaram, então, um dos curiosos dentre a multidão a carregar-lhe a cruz. Não sabemos muita coisa sobre esse Simão, mas penso que dificilmente faria esse serviço voluntariamente. Além do grande esforço físico, ainda tinha a questão da contaminação daquele objeto, provavelmente ensanguentado, símbolo de maldição, que inviabilizaria totalmente, para Simão, a comemoração da Páscoa, provável motivo de ele estar ali de passagem. O Rei, porém, não forçaria Simão a fazer esse serviço. Os súditos do Rei Jesus o servem voluntariamente, por gratidão. É para eles um privilégio sair “fora do arraial, levando o seu vitupério” (Hb 13.13), porque compreendem que dessa maneira é que Jesus conquistou a salvação do seu povo.

Deram-lhe a beber uma substância entorpecente, para facilitar-lhes o trabalho, mas ele não quis beber. Jesus precisava ficar bem sóbrio, pois estava “em serviço”. Quanto aos soldados, logo iriam voltar para casa, descansar de sua jornada, e talvez comentar com seus familiares sobre os acontecimentos de mais um dia tediante de trabalho.

Quando eu era adolescente, gostava de ouvir e cantar música popular brasileira. Não qualquer música. Eu era muito seletivo. Preferia os intelectuais. Uma das músicas que eu tentei cantar, mas não consegui, tinha um bordão muito bem elaborado, que eu admirei muito, mas não consegui cantar, pois apesar de eu não ser crente ainda, não podia concordar com a ideia chocante que trazia. O bordão dizia: “Eu quero crer na solução dos evangelhos; Obrigando os nossos moços ao poder dos nossos velhos” (Cordilheiras - Sueli Costa & Paulo César Pinheiro). Pensei: será que o evangelho é assim mesmo? Apenas um instrumento de limitar a liberdade dos jovens? Infelizmente muitos têm acreditado nessa mentira, achando que viver para Cristo é perder a liberdade.

Nós também podemos passar assim pela vida, sem considerar o sacrifício de nosso Senhor por nós, achando que a “religião” é apenas mais um fardo pesado que nos limita, e do qual, se pudéssemos, nos livraríamos para nos sentir mais leves e livres.

PARA OS SOLDADOS, JESUS ERA APENAS UMA FONTE DE GANHO (24)

“Então, o crucificaram e repartiram entre si as vestes dele, lançando-lhes sorte, para ver o que levaria cada um.”

Porque será que eles tinham interesse nas vestes de Jesus? Não deviam ser muito valiosas, mas eles queriam aproveitar tudo o que pudessem tirar de vantagem da situação.

Ainda hoje isso acontece entre cristãos, de várias maneiras. Paulo já alertava Timóteo a respeito de falsos mestres, os quais supunham que a “piedade é fonte de lucro” (1Tm 6.5), e observava que “o amor do dinheiro é raiz de todos os males” (1Tm 6.10).

Por outro lado, muitos descartam a possibilidade de viver para Cristo, e apenas se aproveitam do que ele nos deixou de herança. Muitos que se consideram sábios, se beneficiam da paz e liberdade de pensamento e expressão que possuem. Essa liberdade se deve ao efeito do cristianismo, que promoveu a estabilização dos povos, de modo que o evangelho pudesse chegar aos confins da terra. O evangelho pavimentou as estradas por onde caminham hoje muitos incrédulos, que vêm na vida apenas uma oportunidade de ganho, de lazer, como quem adora a criatura no lugar do Criador. Quando alguém se recusa a viver para Jesus, o verdadeiro responsável por sua atual liberdade de escolha, é como se o considerasse apenas uma fonte de ganho.

No entanto, os maiores prazeres deste mundo, são apenas mesquinharia, comparados com a glória eterna que Jesus preparou para aqueles que o amam. Um servidor de Cristo não precisa de mesquinharias. O seu Rei lhes dá tudo em abundância. Em João 10.10 lemos que “o ladrão vem somente para roubar, matar e destruir”. Jesus veio para que tenhamos vida em abundância.

Será que nós temos considerado Jesus como os soldados o consideraram? Será que ele é para nós apenas um motivo de piadas? Um peso tediante, uma fonte de ganho? Jesus, mesmo estando em terrível sofrimento, crucificado, pediu ao Pai que perdoasse os soldados, porque não sabiam o que faziam. E quanto a nós, sabemos o que estamos fazendo?

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

O que fazer com Jesus?


(Leia Mc 15.1-15)

Pilatos acordara cedo para mais um dia de expediente, talvez achando que seria mais um dia normal. Mas quando chegam os judeus com o preso Jesus, percebe que estava com uma situação muito “delicada” para resolver. O que faria com Jesus? Neste texto podemos notar pelo menos três fases de seu relacionamento com a causa de Jesus, o escolhido de Deus.

1ª fase: ADMIRAÇÃO (1-5)

“Logo pela manhã, entraram em conselho os principais sacerdotes com os anciãos, os escribas e todo o Sinédrio; e, amarrando a Jesus, levaram-no e o entregaram a Pilatos. Pilatos o interrogou: És tu o rei dos judeus? Respondeu Jesus: Tu o dizes. Então, os principais sacerdotes o acusavam de muitas coisas. Tornou Pilatos a interrogá-lo: Nada respondes? Vê quantas acusações te fazem! Jesus, porém, não respondeu palavra, a ponto de Pilatos muito se admirar.”

Pilatos nunca tinha interrogado um preso como aquele. Normalmente os acusados se defendiam, negavam as acusações e apresentavam suas versões, mas Jesus nada respondia. Se ele se considerava rei dos judeus, conforme afirmavam, então porque era tão humilde? Certamente não era um preso qualquer. Alguma coisa havia de diferente e admirável naquele homem que tinha diante de si.

Assim como foi admirado por Pilatos, Jesus é admirado no mundo inteiro, mesmo pelos que não creem que ele seja o Filho de Deus.

Gandhi, por exemplo, “se referia a Jesus e à sua mensagem com respeito e mesmo devoção (…)”; afirmou também que “o evangelho que Jesus pregava é mais sutil e aromático do que o da rosa (citação de Ghandi - Gandhi, 1996, I.3, p. 123);” Gandhi “concordava profundamente” com a passagem do Evangelho de Jesus Cristo de que “nem todo aquele que me diz ‘Senhor, Senhor’ entrará no Reino dos Céus, mas sim aquele que pratica a vontade de meu Pai que está nos céus”, pois as obras “sem a fé e sem a prece, são como flores artificiais e sem perfume” (Gandhi, 1991, I.19, p.45) (…)”; Chegou à conclusão de que “talvez o mais nítido de todos os testemunhos em favor da resposta afirmativa à questão que temos pela frente sejam as vidas dos maiores mestres do mundo: Jesus, Maomé, Buda, (…) estes homens exerceram uma influência imensa sobre o caráter de milhares de homens; pode-se dizer que moldaram-no. O mundo é mais rico porque eles viveram entre nós (Gandhi, 1996, I.2, p. 58)”; Acrescentou ainda que “porque a vida de Jesus tem a significância e a transcendência à qual aludi, acredito que ele pertença não só ao cristianismo mas ao mundo inteiro, a todas as raças e povos, pouco importando sob que bandeira, denominação (Gandhi, 1996, I.2, pp. 74.75-76) (...);” (1).

Muita gente encontra-se nesta fase de relacionamento com Jesus: Admiração, pois Jesus é mesmo uma personagem histórica singular.


2ª fase: TOLERÂNCIA (6-11)

“Ora, por ocasião da festa, era costume soltar ao povo um dos presos, qualquer que eles pedissem. Havia um, chamado Barrabás, preso com amotinadores, os quais em um tumulto haviam cometido homicídio. Vindo a multidão, começou a pedir que lhes fizesse como de costume. E Pilatos lhes respondeu, dizendo: Quereis que eu vos solte o rei dos judeus? Pois ele bem percebia que por inveja os principais sacerdotes lho haviam entregado. Mas estes incitaram a multidão no sentido de que lhes soltasse, de preferência, Barrabás.”

Nesta fase, Pilatos vê Jesus como uma vítima, e quer evitar que sejam feitas injustiças. Posiciona-se com uma atitude condescendente de quem, tendo algum poder em suas mãos, procura ajudar outro, mesmo não concordando plenamente com suas ideias, sabendo que não faria mal a ninguém.

Muita gente “importante” assume esta atitude “condescendente” para com Jesus. Não é totalmente a favor, mas também não é contra. Incentiva quem quer seguir Jesus, embora não esteja disposta, ela mesma, a andar por este caminho.

Numa sessão de psicoterapia, por exemplo, o terapeuta pode ouvir com atenção o testemunho de um crente, mas em nome da ética profissional, deve manter-se a certa distância emocional. Num artigo sobre o assunto, chamado “Religião e Psicologia”, lemos o seguinte:

“Desta forma, em concordância com a opinião expressa em um dos artigos encontrados sobre a influência da religiosidade na Psicologia Clínica (CAMBUY et alii 2006), pensa-se que os profissionais devem possibilitar a emergência da religiosidade/espiritualidade de seus clientes no setting terapêutico, considerando a temática como parte de sua realidade e, por meio do discurso religioso (mas sem ater-se a ele), ajudá-los a chegar ao cerne da questão. Isto pode ser considerado como uma forma de se utilizar a religiosidade a serviço da psicoterapia, partindo da ideia de que ambas são potencialmente capazes de promover saúde e bem estar, desde que sabiamente utilizadas, e sem sobreposição de saberes” (2)

Muita gente, por conta de sua posição profissional ou social, ou até mesmo pessoal, encontra-se nesta fase de relacionamento com Jesus: a tolerância.


3ª fase: DECISÃO – ENGAJAMENTO OU ABANDONO (12-15)

“Mas Pilatos lhes perguntou: Que farei, então, deste a quem chamais o rei dos judeus? Eles, porém, clamavam: Crucifica-o! Mas Pilatos lhes disse: Que mal fez ele? E eles gritavam cada vez mais: Crucifica-o! Então, Pilatos, querendo contentar a multidão, soltou-lhes Barrabás; e, após mandar açoitar a Jesus, entregou-o para ser crucificado.”

A situação de Pilatos foi se complicando, por mais que ele quisesse se esquivar. Chegou o momento em que ele tinha que decidir: Ou fazia o que era certo, o que seria equivalente a engajar-se à causa de Jesus, designado o escolhido de Deus para reinar sobre a humanidade, ou continuava a seguir o seu caminho, virando as costas para a oportunidade que se apresentava. Oportunidade, por sinal, que tinha um peso eterno.

Um método muito usado para evangelização é chamado “o abismo ligado”. Nele, nós explicamos resumidamente a história da redenção. Normalmente as pessoas ouvem de bom grado toda a explanação, e só começam a ficar incomodados a partir do momento em que esclarecemos a necessidade de atravessar a ponte, como um ato de fé, para receber a salvação.

A fase da decisão é mesmo muito estressante. Um artigo a respeito de administração educacional observa que uma “grande razão para muitas decisões mal concebidas e implementadas está relacionada com as consequências motivacionais dos conflitos – em particular, as tentativas para superar o estresse gerado por escolhas extremamente difíceis sobre decisões vitais. Assim, as pessoas ignoram a informação sobre riscos e vão em frente (aderência não conflituosa). Outras simplesmente aceitam o curso de ação mais popular (mudança não conflituosa) e outros ainda procrastinam e evitam a ação (evitação defensiva). No outro extremo, alguns tomadores de decisão entram em pânico e tornam-se hipervigilantes enquanto buscam freneticamente uma solução”. (3)

Como tem sido nosso comportamento diante de Deus a respeito de decisões importantes? Uma decisão que não podemos adiar, é sobre o que vamos fazer a respeito da salvação que Jesus nos oferece. Se você ainda não “atravessou a ponte”, faça isto agora mesmo. Depois, andemos pelo caminho com Cristo, submetendo toda decisão importante à orientação de nosso Senhor.

Pilatos finalmente decidiu, mas decidiu errado. O maior peso na sua ponderação foi colocado sobre as coisas imediatas, com prejuízo das coisas eternas. Se ele tivesse decidido soltar Jesus, poderia perder sua posição, seu prestígio, talvez até a própria vida. Mas tudo o que viermos a sofrer por amor de Cristo, por mais doloroso que seja, a Bíblia chama de “leve e momentânea tribulação”, enquanto o resultado de atos de fé são chamados de “eterno peso de glória” (2Co 4.17).

Em que fase está o seu relacionamento com Jesus? ADMIRAÇÃO, TOLERÂNCIA, ou DECISÃO?

Não dá para ficarmos adiando certas decisões importantes. Não dá para ficarmos somente nas fases de admiração e tolerância. Cedo ou tarde precisamos decidir: Engajamento na causa de Cristo ou abandono, pois Jesus deixou claro: “Quem não é por mim é contra mim; e quem comigo não ajunta espalha” (Mateus 12.30). Pilatos tomou sua decisão. E você? O que vai fazer com Jesus?

Citações:

(1) (Gláucia Siqueira Marcondes; Humberto Araújo Quaglio de Souza; Josélia Henriques Pio Gouvêa; Matheus Landau de Carvalho - Mahatma Gandhi e seu diálogo inter-religioso com o cristianismo na busca pela Verdade - Disponível em: http://www.ufjf.br/sacrilegens/files/2013/03/9-2-9.pdf – Acesso em: 06/01/2016)

(GANDHI, Mahatma A roca e o calmo pensar. São Paulo: Palas Athena, 1991.
_________. Gandhi e o Cristianismo. São Paulo: Paulus, 1996.)

(2) (Religião e Psicologia: análise das interfaces temáticas - Martha Caroline Henning - Carmen L. O. O. Moré - Disponível em: http://www.pucsp.br/rever/rv4_2009/t_henning.pdf Acesso em: 06/01/2015).

(CAMBUY, A.; AMATUZZI, M.M.; ANTUNES, A. 2006 “Psicologia clínica e Experiência Religiosa”. Revista de Estudos da Religião, São Paulo, Nº 3: 77-93.)

(3) (Wayne K. Hoy, Cecil G. Miskel, C. John Tarter. Administração Educacional: Teoria, Pesquisa e Prática. 9ª edição. Tradução Henrique de Oliveira Guerra. Pag. 315. AMGH. Porto Alegre. 2015. Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=WIYTBwAAQBAJ&pg=PA315&lpg=PA315&dq=estresse+da+decis%C3%A3o&source=bl&ots=XAmqqzA1ss&sig=yI2UwyVe8pvrBm23JcY7Ds1u2yw&hl=pt-BR&sa=X&ved=0ahUKEwib26fg2Z3KAhWEjJAKHfyKBdgQ6AEIPDAG#v=onepage&q=estresse%20da%20decis%C3%A3o&f=false – Acesso em: 09/01/2016).

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Perdendo a autoconfiança


(Leia Mc 14.66-72)

Pedro ainda respirava teimosia, ainda não lhe saíra da cabeça a sensação de que podia evitar a morte do mestre. Não aceitava a ideia de sofrer tamanha afronta sem ao menos lutar. Precisava bolar um plano para sair daquela situação. Só precisava resistir firme, até que achasse uma solução. Teve que mentir a respeito de si mesmo e de Jesus, mas isto era apenas uma estratégia. Se fosse nos dias de hoje, eu diria que Pedro andou assistindo muitos filmes americanos de ação, daqueles em que o herói enfrenta sozinho trezentos opositores e sai vitorioso. Mas como não tinha cinema naquele tempo, não sei onde ele buscou inspiração. Talvez na história de Davi, que enfrentou o gigante Golias e o exército dos filisteus, usando apenas uma funda e um cajado. Jesus estava atento ao que acontecia com o seu discípulo. Devia estar mais preocupado com Pedro do que consigo mesmo. Avisou-o daquela hora, para que, no seu desespero, ao chorar amargamente, se firmasse na compaixão daquele que sabia antecipadamente do seu comportamento vergonhoso, e mesmo assim o amava. Orava por ele, para que sua fé não desfalecesse diante da turbulência daquele momento (Lc 22.32). O desastre que ocorreu na vida de Pedro aquela noite realça ainda mais a certeza da necessidade da morte de nosso Salvador em nosso lugar. O melhor dos discípulos, Pedro, chegou ao limite do poder humano de ser fiel a Deus, amando-o de todo o coração e com todas as suas forças. Este quadro ilustra muito bem onde termina a força do homem e começa o poder de Deus. Pedro não podia ir além dos seus limites. Quais eram os limites de Pedro?

Limitação física (66-68)

“Estando Pedro embaixo no pátio, veio uma das criadas do sumo sacerdote e, vendo a Pedro, que se aquentava, fixou-o e disse: Tu também estavas com Jesus, o Nazareno. Mas ele o negou, dizendo: Não o conheço, nem compreendo o que dizes. E saiu para o alpendre. E o galo cantou.”

Pedro tinha que se aquecer. Não queria ficar ali, no meio dos inimigos, mas estava muito frio, e sentiu a necessidade de se aquecer naquela abençoada fogueira, enquanto colocava os pensamentos em ordem. Se Pedro não tivesse limitações físicas, talvez não precisasse se expor tanto, e seria mais fácil cumprir sua missão, a qual ele tinha em mente. Muitas vezes nos esquecemos de que somos mortais e precisamos descansar, nos alimentar corretamente, cuidar da saúde.

Muitos missionários modernos acabam abandonando o campo por problemas de saúde, limitando suas atividades a ambientes menos hostis. Até mesmo o abnegado apóstolo Paulo não podia se esquecer de suas limitações físicas, e teve que dedicar um espaço, em meio a uma carta repleta de instruções espirituais, extremamente importantes, para que Timóteo não se esquecesse de levar para ele a capa que deixou na casa de Carpo (2Tm 4.13); antes de começar as saudações finais, Paulo ainda insiste: “apressa-te a vir antes do inverno” (2Tm 4.21).

Nossas limitações físicas atrapalham o cumprimento de nossa missão. Não precisava ser assim, pois Jesus também limitou-se a um corpo humano, e mesmo assim cumpriu sua missão. Mas nós somos pecadores. Nossas necessidades básicas acabam se tornando nossas inimigas. Não podemos ficar sem nos alimentar, mas acabamos tomando alimento além do que é necessário. Não podemos ficar sem dormir, mas acabamos dormindo além do que é necessário. Podemos ir também para o outro extremo, e por excesso de zelo ou por vaidade não nos alimentamos o suficiente, ou não dormimos o suficiente, acarretando doenças que vão nos limitar ainda mais no futuro.

Por isso foi necessário Jesus sofrer tudo aquilo, e pagar na cruz os nossos pecados, para que, pelo seu sangue purificador nos tornássemos aceitáveis ao Pai.

Limitação emocional (69-71)

“E a criada, vendo-o, tornou a dizer aos circunstantes: Este é um deles. Mas ele outra vez o negou. E, pouco depois, os que ali estavam disseram a Pedro: Verdadeiramente, és um deles, porque também tu és galileu. Ele, porém, começou a praguejar e a jurar: Não conheço esse homem de quem falais!”

As emoções de Pedro estavam à flor da pele. Ele tomou para si uma responsabilidade muito pesada, como se quisesse carregar o mundo nas costas, e estava perdendo suas forças. Seus pensamentos eram como um delírio. Não estava entendendo, não podia aceitar o que estava acontecendo com aquele de quem dissera: “só tu tens as palavras da vida eterna” (Jo 6.68); “tu és o Cristo, o filho do Deus vivo” (Mt 16.16). Jesus estava ali, bem ao lado, sendo caluniado, humilhado, espancado. A insistência dos serventuários, que não tinham nada que especular, que deveriam deixa-lo em paz, era como alfinetadas que desestabilizavam seu controle emocional. Pedro não estava sob o controle do Espírito Santo.

Assim como Pedro, precisamos do Espírito Santo atuando em nossas vidas, para termos sucesso no controle de nossas emoções. Muitas decisões erradas, que tomamos na vida, são consequências de descontrole emocional. Muitos deixam a Igreja por se sentirem desprezados, por terem sido insultados, ou até por coisas menores.

Dirigir veículos, hoje em dia, é uma grande provação. No trânsito as pessoas se transformam. Qualquer deslize é motivo de “buzinaços” ou xingamentos. Há muitas brigas, há muitas imprudências. Quando nos deixamos guiar pelas emoções, corremos o grande risco de tomarmos decisões das quais nos arrependeremos no futuro. É uma boa prática contar até dez, adiar a decisão para o dia seguinte, orar a respeito do assunto. Mas quem poderia perfeitamente controlar suas emoções? Somente pela misericórdia de Deus é que nos livramos de algumas consequências de nossas decisões precipitadas. Precisamos, em primeiro lugar, nascer de novo, nascer do espírito, pelo arrependimento e pela fé em Jesus, e entregarmos cada dia as “rédeas” nas mãos de nosso Senhor, por meio do seu Espírito que em nós habita. Desconfiemos sempre de nossas emoções. Se elas vierem de Deus, então não o envergonharemos com as ações por elas impulsionadas.

Limitação do tempo - O cantar do galo (68,72)

“Mas ele o negou, dizendo: Não o conheço, nem compreendo o que dizes. E saiu para o alpendre. E o galo cantou. E logo cantou o galo pela segunda vez. Então, Pedro se lembrou da palavra que Jesus lhe dissera: Antes que duas vezes cante o galo, tu me negarás três vezes. E, caindo em si, desatou a chorar.”

Algumas doutrinas ensinam o aperfeiçoamento do homem através de várias tentativas, em várias vidas, mas a Bíblia nos diz em 9.27 que “aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo, depois disto, o juízo”; e em Rm 3.20 nos poupa de ilusões, afirmando que “ninguém será justificado diante dele por obras da lei, em razão de que pela lei vem o pleno conhecimento do pecado”.

O cantar do galo, para Pedro, naquela madrugada, parecia o ressoar de um ringue, que marcava o final da luta, para o anúncio do vencedor e do perdedor. O cantar do galo podia ser, na verdade, o ressoar de uma trombeta. Nós temos um tempo curto para provarmos nossa fidelidade a Deus e depois enfrentaremos o juízo. Se não for a trombeta do arcanjo, que anuncia a volta de Jesus, será o dia de nossa morte, que pode vir antes do que esperamos. Nós envelhecemos, e muitas coisas que deixamos de fazer na juventude já não podem ser resgatadas. Algumas oportunidades são como ônibus que têm hora marcada, os quais, se não quisermos perder, precisamos ser rápidos e decididos. Algumas janelas de oportunidade passam apenas uma vez em nossas vidas. Pedro, neste caso, até que teve outras oportunidades de confessar Jesus, e se saiu bem. Por exemplo, nas suas prisões e perseguições pelos sacerdotes, que enfrentou, junto com outros discípulos, no início do seu ministério, quando respondeu às autoridades: “antes, importa obedecer a Deus do que aos homens” (At 5.29), e depois de terem sido açoitados, “se retiraram do Sinédrio regozijando-se por terem sido considerados dignos de sofrer afrontas por esse Nome” (At 5.41).

Conclusão

Jesus disse em Mateus 10.33: “mas aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai, que está nos céus”. Então Pedro será negado por Jesus diante do Pai? Acho que não. Pedro teve chance de se arrepender, e assim anular o seu pecado. Até mesmo as autoridades que conspiravam contra Jesus tiveram sua chance, dada pelo próprio Pedro em At 3.19, quando os admoesta: “Arrependei-vos, pois, e convertei-vos para serem cancelados os vossos pecados”.

Ao lermos o livro de Atos e as cartas de Pedro, temos a impressão de que ele aprendeu, de que sua entrega ao Espírito Santo para controlar sua vida, resolveu definitivamente o problema de suas limitações. Mas uma coisa ainda nos preocupa. Paulo, em Gl 2.11-21, testemunha um comportamento inadequado de Pedro, que, sob o ponto de vista de Paulo, estava virtualmente negando a graça de Cristo por pressão dos judaizantes. Então, baseando-nos no exemplo de Pedro, podemos concluir que nossa luta contra a carne e suas limitações não tem fim. Por isto, precisamos chorar amargamente diante do trono de Deus, as nossas limitações, e seguir o conselho do próprio Pedro, que certamente sabia o que estava dizendo em 1 Pedro 1.13,18-19: “Por isso, cingindo o vosso entendimento, sede sóbrios e esperai inteiramente na graça que vos está sendo trazida na revelação de Jesus Cristo. (...) sabendo que não foi mediante coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados do vosso fútil procedimento que vossos pais vos legaram, mas pelo precioso sangue, como de cordeiro sem defeito e sem mácula, o sangue de Cristo”.

Talvez Pedro, num ato de heroísmo, quisesse resgatar Jesus, mas teve que reconhecer que ele é que precisava ser resgatado.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

A Conspiração


(Leia Mc 14.53-65)

Conspiraram contra Jesus, o Rei, antes mesmo que o seu reino, segundo o conceito dos homens, fosse firmado. Mas o que parecia derrota foi vitória de Jesus, e o que parecia vitória foi derrota para Satanás. Comparando este texto com outras partes das Escrituras, podemos ter a certeza de que Jesus, embora parecesse derrotado, é, na verdade, vitorioso.

1 - Os dominadores serão dominados (53,54)

“53 E levaram Jesus ao sumo sacerdote, e reuniram-se todos os principais sacerdotes, os anciãos e os escribas. 54 Pedro seguira-o de longe até ao interior do pátio do sumo sacerdote e estava assentado entre os serventuários, aquentando-se ao fogo.”

Quando Pedro assentou-se junto aos serventuários, aquecendo-se ao fogo, sentia-se ameaçado, envergonhado, com medo de que fosse descoberto, pois todos ali estavam conspirando contra Jesus, e pareciam dominar toda a situação. Hoje, quando nos “aquecemos ao fogo”, assentados com incrédulos, somos (ou pelo menos deveríamos ser) confiantes, e até podemos dominar o assunto do ambiente, pois trazemos uma mensagem de vitória para aqueles que têm sido derrotados, em seu desvio dos caminhos do Senhor.

Podemos dar graças a Deus por esta vitória, com as palavras de 2Co 2.14,15: “Graças, porém, a Deus, que, em Cristo, sempre nos conduz em triunfo e, por meio de nós, manifesta em todo lugar a fragrância do seu conhecimento. Porque nós somos para com Deus o bom perfume de Cristo, tanto nos que são salvos como nos que se perdem.”

2 - Os escarnecedores serão escarnecidos (55-61)

“55 E os principais sacerdotes e todo o Sinédrio procuravam algum testemunho contra Jesus para o condenar à morte e não achavam. 56 Pois muitos testemunhavam falsamente contra Jesus, mas os depoimentos não eram coerentes. 57 E, levantando-se alguns, testificavam falsamente, dizendo: 58 Nós o ouvimos declarar: Eu destruirei este santuário edificado por mãos humanas e, em três dias, construirei outro, não por mãos humanas. 59 Nem assim o testemunho deles era coerente. 60 Levantando-se o sumo sacerdote, no meio, perguntou a Jesus: Nada respondes ao que estes depõem contra ti? 61 Ele, porém, guardou silêncio e nada respondeu. (...) “

As falsas testemunhas escarneceram, distorceram as palavras de Jesus, e inventaram coisas que ele não disse. Mas o que ele disse em Jo 2.19, sobre reedificar o templo destruído, cumpriu-se. Jesus venceu literalmente seu desafio ao “reedificar” seu próprio corpo, um verdadeiro santuário do Espírito Santo. O povo ficou ciente disto em Atos 2.23,24: “(...) sendo este entregue pelo determinado desígnio e presciência de Deus, vós o matastes, crucificando-o por mãos de iníquos; ao qual, porém, Deus ressuscitou, rompendo os grilhões da morte; porquanto não era possível fosse ele retido por ela”.

A Igreja, que também é um templo para a habitação de Deus, tem sido edificada, conforme o cumprimento de Mateus 16.18: “Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”. Reconhecendo isto, mais tarde, o próprio apóstolo que, naquela noite, estava se sentindo diminuído, com medo, pressionado pelos escarnecedores, escreveu em 1Pedro 2.5: “também vós mesmos, como pedras que vivem, sois edificados casa espiritual para serdes sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais agradáveis a Deus por intermédio de Jesus Cristo”.

3 - Os incrédulos serão confrontados com a verdade (61-64)

“(...) Tornou a interrogá-lo o sumo sacerdote e lhe disse: És tu o Cristo, o Filho do Deus Bendito? 62 Jesus respondeu: Eu sou, e vereis o Filho do Homem assentado à direita do Todo-Poderoso e vindo com as nuvens do céu. 63 Então, o sumo sacerdote rasgou as suas vestes e disse: Que mais necessidade temos de testemunhas? 64 Ouvistes a blasfêmia; (...)”

Jesus foi condenado por assumir quem ele realmente era. Se estivesse mentindo, os seus inimigos teriam razão; mas ele falava a verdade. Eles não criam e não estavam dispostos a crer em Jesus. Para eles, estava fora de cogitação aceitar Jesus como o Messias, conforme João 10.33: “(...) Não é por obra boa que te apedrejamos, e sim por causa da blasfêmia, pois, sendo tu homem, te fazes Deus a ti mesmo”; e Lucas 22.67: “(...) Jesus lhes respondeu: Se vo-lo disser, não o acreditareis”.

Até mesmo João Batista parece ter hesitado em sua fé, ao mandar perguntar: “És tu aquele que estava para vir ou havemos de esperar outro?” (Mateus 11.3). Mas ele não precisou esperar muito para ver com seus próprios olhos, quando Jesus assumiu, no céu, o seu trono, onde ainda está, conforme nos informa Colossenses 3.1: “Portanto, se fostes ressuscitados juntamente com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo vive, assentado à direita de Deus”.

4 - Os julgadores serão julgados (64,65)

“(...) que vos parece? E todos o julgaram réu de morte. 65 Puseram-se alguns a cuspir nele, a cobrir-lhe o rosto, a dar-lhe murros e a dizer-lhe: Profetiza! E os guardas o tomaram a bofetadas.”

Jesus, não podia ser condenado, pois ele, como juiz, condenará os que conspiraram contra ele. Depois de ressuscitado, advertiu com autoridade a todos, em Marcos 16.16: “Quem crer e for batizado será salvo; quem, porém, não crer será condenado”. Já havia dito, também, em Mateus 12.41,42: “Ninivitas se levantarão, no Juízo, com esta geração e a condenarão; porque se arrependeram com a pregação de Jonas. E eis aqui está quem é maior do que Jonas. A rainha do Sul se levantará, no Juízo, com esta geração e a condenará; porque veio dos confins da terra para ouvir a sabedoria de Salomão. E eis aqui está quem é maior do que Salomão”.

Aplicava-se perfeitamente aos seus opositores a advertência jurídica de Mateus 5.22: “Eu, porém, vos digo que todo aquele que sem motivo se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento; e quem proferir um insulto a seu irmão estará sujeito a julgamento do tribunal; e quem lhe chamar: Tolo, estará sujeito ao inferno de fogo”.

Todos têm que respeitar Jesus como juiz. Constantemente, nas Igrejas, por todos estes séculos, até que ele venha, um solene aviso é repetido na celebração da Ceia do Senhor, conforme 1Coríntios 11.27: “Por isso, aquele que comer o pão ou beber o cálice do Senhor, indignamente, será réu do corpo e do sangue do Senhor”.


A conspiração sobre a qual lemos neste texto foi profetizada em Salmos 2.1-4: “Por que se enfurecem os gentios e os povos imaginam coisas vãs? Os reis da terra se levantam, e os príncipes conspiram contra o SENHOR e contra o seu Ungido, dizendo: Rompamos os seus laços e sacudamos de nós as suas algemas. Ri-se aquele que habita nos céus; o Senhor zomba deles”. Embora parecesse a Pedro, e às demais testemunhas, que Jesus havia sido derrotado, ele é, na verdade, vitorioso, pois os que pareciam dominadores serão dominados; os escarnecedores serão escarnecidos, vendo que Jesus cumpre o que diz; os incrédulos serão confrontados com a verdade, no seu devido tempo; e os julgadores serão julgados.

Apêndice:

Alguns sofrimentos, pelos quais passam os filhos de Deus, são um pouco da experiência do que Jesus sofreu, conforme o exemplo dos versículos abaixo:

1 Coríntios 4.11 “Até à presente hora, sofremos fome, e sede, e nudez; e somos esbofeteados, e não temos morada certa”.
2 Coríntios 12.7 “E, para que não me ensoberbecesse com a grandeza das revelações, foi-me posto um espinho na carne, mensageiro de Satanás, para me esbofetear, a fim de que não me exalte”.
1 Pedro 2.20 “Pois que glória há, se, pecando e sendo esbofeteados por isso, o suportais com paciência? Se, entretanto, quando praticais o bem, sois igualmente afligidos e o suportais com paciência, isto é grato a Deus”.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2016

Você ama Jesus?


(Leia Mc 14.43-52)

A senha que Judas combinou com as autoridades, para identificar Jesus, era um beijo. A palavra original, que foi traduzida por beijar, significa amor. Beijar é demonstrar amor. Assim entendemos que Judas disse: “Aquele a quem eu (simular) tratar com amor, a esse prendei”. Outras pessoas nesta história também demonstraram seu amor por Jesus. Que tipo de amor era esse?

I - AMOR FALSO (43-46)

“43 E logo, falava ele ainda, quando chegou Judas, um dos doze, e com ele, vinda da parte dos principais sacerdotes, escribas e anciãos, uma turba com espadas e porretes. 44 Ora, o traidor tinha-lhes dado esta senha: Aquele a quem eu beijar, é esse; prendei-o e levai-o com segurança. 45 E, logo que chegou, aproximando-se, disse-lhe: Mestre! E o beijou. 46 Então, lhe deitaram as mãos e o prenderam.”

A Bíblia fala de homens cujo comportamento tem sido semelhante ao de Judas. Isaías (28.15) resume o seu pensamento: “(...) Fizemos aliança com a morte e com o além fizemos acordo; quando passar o dilúvio do açoite, não chegará a nós, porque, por nosso refúgio, temos a mentira e debaixo da falsidade nos temos escondido”. Salmos 12.2,4 acrescenta: “falam com falsidade uns aos outros, falam com lábios bajuladores e coração fingido (...); com a língua prevaleceremos, os lábios são nossos; quem é senhor sobre nós?”

Muitos acham, também, hoje em dia, que são senhores de si mesmos, que podem viver escondidos, debaixo da falsidade, que escaparão do “dilúvio do açoite”, porque têm sido, até agora, bem sucedidos nos seus caminhos. Mas isto não passa de uma ilusão, e quando acordarem do seu sonho terão que enfrentar uma horrível realidade, como sabemos que Judas enfrentou, e não suportou.

Um amor falso por Jesus poderá nos levar até certo ponto de nossas vidas, até por aprazíveis caminhos, mas que terminam abruptamente num abismo infernal.

II - AMOR EQUIVOCADO (47)

“47 Nisto, um dos circunstantes, sacando da espada, feriu o servo do sumo sacerdote e cortou-lhe a orelha.”

Lucas conta que os discípulos perguntaram antes: Feriremos à espada? Mas pelo jeito, Pedro nem esperou a resposta. Às vezes agimos como Pedro, e vamos fazendo as coisas sem esperar a instrução do Senhor. Decidimos por nós mesmos o que é preciso fazer, e fazemos. Mas devemos nos perguntar se é isto mesmo que o Senhor quer de nós. Pedro estava pronto para morrer por Jesus, mas Jesus queria mais do que isso; queria que ele primeiro vivesse, que suportasse a tentação de negá-lo diante dos servos do sacerdote; queria que ele, depois de convertido, apascentasse as suas ovelhas. Estamos dispostos, muitas vezes, a abandonar tudo e seguir Jesus, mas não estamos dispostos a abraçar as responsabilidades que pesam sobre nós.

A vontade do Senhor para Pedro era que ele estivesse preparado, não com o porte de uma espada qualquer, mas com o porte de um equipamento de guerra completo, conforme orienta Ef 6.10-18: “Quanto ao mais, sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo; porque a nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes. Portanto, tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau e, depois de terdes vencido tudo, permanecer inabaláveis. Estai, pois, firmes, cingindo-vos com a verdade e vestindo-vos da couraça da justiça. Calçai os pés com a preparação do evangelho da paz; embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do Maligno. Tomai também o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus; com toda oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando com toda perseverança e súplica por todos os santos”

Oséias (6.6) também ensina que não podemos presumir a vontade de Deus, e irmos adiante por puro impulso, mas conhecer bem a sua vontade, em primeiro lugar, pois ele diz: “(...) misericórdia quero, e não sacrifício, e o conhecimento de Deus, mais do que holocausto”.

III - AMOR FORÇADO (48,49)

“48 Disse-lhes Jesus: Saístes com espadas e porretes para prender-me, como a um salteador? 49 Todos os dias eu estava convosco no templo, ensinando, e não me prendestes; contudo, é para que se cumpram as Escrituras.”

Os que fizeram alvoroço para prender Jesus deveriam ficar envergonhados, pois estavam sempre com ele no templo, ouviram seus ensinamentos, e não se manifestaram contra. Às vezes o amor que temos por Jesus é apenas uma tolerância. Aceitamos a sua presença em nossa vida somente para não contrariar os nossos familiares. Se tivéssemos oportunidade, porém, nos libertaríamos desses laços, desse fardo pesado que somos obrigados a carregar. Nas igrejas há muitas pessoas assim. Acontece que o pai de família se converte, e a esposa e os filhos são obrigados a acompanhá-los. Acontece que uma família é tradicionalmente cristã, e por isso os seus membros não devem quebrar a tradição. Acontece que um jovem quer ganhar uma namorada, e por isso sabe que deve se portar como um verdadeiro cristão, como ela e os pais dela apreciam. Para estes que se dizem cristãos, sem contudo amarem sinceramente Jesus, ele pergunta: “Por que me chamais Senhor, Senhor, e não fazeis o que vos mando?” (Lucas 6.46).

A multidão que ouvia, aparentemente com prazer, os discursos de Jesus, no templo, quando tiveram que decidir, compararam Jesus com um salteador, e escolheram o salteador Barrabás para que fosse libertado (Jo 18.40).

IV - AMOR FRÁGIL (50-52)

“50 Então, deixando-o, todos fugiram. 51 Seguia-o um jovem, coberto unicamente com um lençol, e lançaram-lhe a mão. 52 Mas ele, largando o lençol, fugiu desnudo.”

Todos abandonaram Jesus. Ficaram atordoados, amedrontados, desorientados. Até mesmo aquele jovem destemido, resoluto, que provavelmente pulou do seu leito às pressas e foi avisar Jesus que os soldados estavam à sua procura, que testemunhou sua prisão e o estava seguindo cautelosamente, foi descoberto e fugiu humilhado. O amor dos discípulos ainda não estava amadurecido. Era muito frágil. Era o máximo que podiam fazer com seus recursos humanos. Precisavam receber o Espírito Santo, para que o seu amor fosse aperfeiçoado. Jesus já advertira Nicodemos, no começo do seu ministério: “importa-vos nascer de novo” (Jo 3.7).

Deus se queixa do amor dos filhos de Israel, em Oséias 6.4: “Que te farei, ó Efraim? Que te farei, ó Judá? Porque o vosso amor é como a nuvem da manhã e como o orvalho da madrugada, que cedo passa.”

Será que o nosso amor por Jesus é assim também? Como a nuvem da manhã e como o orvalho da madrugada? Que se enfraquece e por fim acaba, diante das tribulações da vida? Pior do que isto, será possível que nosso amor seja falso, forçado, ou equivocado? Precisamos do Espírito Santo para nos transformar, operando em nós o novo nascimento, e conduzindo o “barco” de nossa vida nesses mares turbulentos. Só o próprio Deus pode nos ensinar e nos capacitar a amar o nosso Senhor e Salvador até as últimas consequências.

Apêndice:

“O dia mais escuro, o poder das trevas”.


Jesus permite que o aflijam com a espada, com o falso amor, e com o abandono, sabendo que era necessário assim acontecer, para que se cumprissem as escrituras. Ele era o único, nesta história, que estava na luz, que naquele momento confiava nas palavras de Deus. Os demais, imaginavam coisas vãs, preparavam-se para nada. Eram desnecessárias as espadas e os porretes dos guardas. Era perverso o planejamento de Judas, que traiu Jesus fingindo perfeitamente amá-lo; era inconveniente a espada de Pedro. Jesus sabia discernir o tempo; sabia que ressuscitaria depois de tudo ser consumado; sabia que depois de tudo ele seria amado de verdade; que seus discípulos o seguiriam até à morte, e que viria com poder e grande glória, com sua espada, para eliminar os exércitos rebeldes. Apocalipse 19.11-16 profetiza: “Vi o céu aberto, e eis um cavalo branco. O seu cavaleiro se chama Fiel e Verdadeiro e julga e peleja com justiça. Os seus olhos são chama de fogo; na sua cabeça, há muitos diademas; tem um nome escrito que ninguém conhece, senão ele mesmo. Está vestido com um manto tinto de sangue, e o seu nome se chama o Verbo de Deus; e seguiam-no os exércitos que há no céu, montando cavalos brancos, com vestiduras de linho finíssimo, branco e puro. Sai da sua boca uma espada afiada, para com ela ferir as nações; e ele mesmo as regerá com cetro de ferro e, pessoalmente, pisa o lagar do vinho do furor da ira do Deus Todo-Poderoso. Tem no seu manto e na sua coxa um nome inscrito: REI DOS REIS E SENHOR DOS SENHORES.”